Fernando Pinto reduziu prejuízos mas ainda não garantiu futuro da TAP

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Hoje, a TAP tem mais passageiros, mais aviões, mais receitas NELSON GARRIDO

Disseram-lhe que não era bem-vindo. Pensou em desistir. Com a privatização por cumprir, ainda tem de se bater por ser uma excepção à austeridade

O Governo procurava o gestor ideal para a TAP. Não havia, em Portugal, ninguém que encaixasse no perfil e, por isso, foram à procura lá fora. Encontraram três candidatos. Fernando Pinto era um deles. O homem que liderou a brasileira Varig e cresceu com os aviões destacou-se. Conhecia a indústria, as pessoas mais importantes do meio e, sobretudo, a língua portuguesa. Foi escolhido para conduzir a fusão com a Swissair, que, falida, acabou por recuar. Dez anos depois, a meta privatização continua por alcançar, num momento em que discute, com o Governo, a redução do próprio salário.

O gestor chegou à transportadora aérea estatal no ano 2000 e completa, na próxima terça-feira, dez anos à frente da empresa. Quando chegou, encontrou uma casa desarrumada e imiscuída com o accionista. "Toda a gente se metia na gestão da TAP. Qualquer ministro ou deputado se achava no direito de fazer pressões", conta Jorge Coelho, actual presidente da Mota Engil e responsável pela escolha de Fernando Pinto, enquanto ministro de Estado e do Equipamento Social.

Naquela altura, a companhia de aviação acumulava um prejuízo de 122 milhões de euros e precisava, com urgência, de um plano de recuperação.

Apesar de o negócio com a Swissair não ter avançado, o Governo "manteve a decisão de indigitação de Fernando Pinto para o cargo", explica José Queiroz, antigo vice-presidente do conselho de administração da TAP e agora responsável pela empresa que está a desenvolver o aeroporto de Beja.

O gestor admite que ponderou em desistir logo nos primeiros dias, quando percebeu, numa reunião com os trabalhadores, que não era bem-vindo. Mas ficou e fez chegar a Bruxelas um plano para dar a volta à transportadora. Ainda se lembra da reacção de Loyolla de Palacio, comissária europeia dos Transportes na altura. "Comentou que o plano estava muito bom. Sobretudo, se pudesse concretizar-se", relembra.

TAP continua débil

O plano avançou e a TAP alcançou resultados positivos em 2003, mas depressa sentiu nova turbulência com a escalada do preço do petróleo. E, cinco anos mais tarde, já com a brasileira VEM e a companhia de aviação regional Portugália na carteira, o grupo tombou para um prejuízo-recorde de 285 milhões de euros. O tema da injecção de capital voltou à ordem do dia, mas sem possibilidade de bater novamente à porta do accionista, já que a União Europeia proíbe, desde 1994, auxílios estatais às companhias de aviação.

Os olhos de Fernando Pinto vêem uma empresa que "cresceu muito, mais do que duplicando a sua dimensão, que se renovou e reposicionou estrategicamente". Em parte, têm razão. Hoje, a TAP tem mais trabalhadores, receitas, passageiros, rotas e aviões.

Porém, foi esmagando os capitais próprios, agora nos 204,6 milhões negativos. E, além de uma privatização por resolver, tem pontas soltas na manutenção e no handling, que dão pelo nome de ex-VEM, onde continua a saga pela redução de custos, e Groundforce, que terá obrigatoriamente de vender, mesmo que com prejuízo.

Só estes dois negócios foram responsáveis por perdas de 40,2 milhões de euros, no primeiro semestre de 2010, o que fez o resultado líquido do grupo derrapar para prejuízos de 79 milhões, também por causa dos estragos causados pela erupção de um vulcão na Islândia. Um número que pode pôr em causa a promessa de regressar aos lucros.

Concorrência aperta

O homem que tenta amenizar o impacto da concorrência feroz dolow-cost, em particular, da Ryanair e da Easyjet (que acabou de anunciar a inauguração de uma base aérea em Lisboa), diz que privatizar a TAP é uma missão. Uma missão antiga, já que a abertura do capital do grupo faz parte dos planos governamentais há, pelo menos, 16 anos.

Mas o que agora o tem sentado à mesa com o Governo são as medidas de austeridade que vão afectar as empresas públicas. Apesar dos argumentos de que a transportadora tem autonomia financeira, ainda não se sabe se será excluída dos cortes, que passam por reduções dos custos operacionais, mas também do número de chefias e dos salários. Se assim for, a empresa arrisca-se a enfrentar protestos dos trabalhadores.

Nos primeiros quatro anos com Fernando Pinto, "não houve um minuto de greve" na TAP, conta André Teives, presidente do Sindicato dos Técnicos de Handling de Aeroportos e porta-voz de um grupo de unidades sindicais que se juntou para fazer frente aos planos do Governo. A partir de 2004, a paz social quebrou-se. Começaram as greves e mais algumas ameaças, sobretudo por causa de aumentos salariais.

Quando chegou à companhia de aviação, o gestor brasileiro conseguiu convencer os trabalhadores a abdicar de um aumento de 12 por cento, que tinha sido prometido pela anterior administração. Mas acabou por perder as rédeas à negociação com os sindicatos e teve de ceder, sobretudo às exigências dos pilotos. As medidas de austeridade podem, agora, levar a um novo período de contestação. Os sindicatos que se uniram contra os cortes já pediram explicações ao Governo e o seu porta-voz garante que vão esperar "até ao limite da flexibilidade". Esse limite termina "na próxima sexta-feira".

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