Obama fala hoje sobre o fim da guerra do Iraque mas não vai declarar vitória

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Ninguém espera uma declaração triunfalista como a "missão cumprida" de Bush JIM YOUNG/REUTERS

Casa Branca assinala a transição das operações para uma nova fase. Presidente vai reafirmar a meta de retirar no final de 2011. Analistas dizem que a América está a apressar a sua saída

O Presidente norte-americano Barack Obama fará esta noite o seu primeiro discurso à nação sobre o Iraque, destinado a assinalar o fim das operações de combate naquele país e a transição para uma nova fase que será um teste à capacidade de os iraquianos se defenderem a si próprios.

Ninguém espera uma declaração triunfalista à semelhança da "missão cumprida" anunciada por George W. Bush em 2003, seis semanas depois do início da invasão do Iraque. Obama deverá reafirmar o compromisso de retirar totalmente as tropas americanas até Dezembro do próximo ano, cumprindo um acordo estabelecido com o Iraque durante a Administração Bush e, segundo um porta-voz da Casa Branca, o Presidente americano irá falar sobre a necessidade de redireccionar "a maioria dos esforços e do foco" para a guerra no Afeganistão. Antes do seu discurso na Sala Oval, que terá lugar às oito da noite em Washington (uma da manhã em Lisboa), Obama visita a base militar de Fort Bliss, no Texas, para agradecer pessoalmente aos soldados que entretanto regressaram do Iraque.

O discurso de Obama surge quase duas semanas depois de os Estados Unidos terem reduzido a sua força militar no Iraque para um número inferior a 50 mil soldados, cuja missão, a partir de amanhã, será "aconselhar e assistir" as forças de segurança iraquianas. O significado deste momento tem sido amplamente discutido por analistas e pela imprensa americana, motivando interpretações ambivalentes - enquanto uns encararam a retirada parcial das tropas como o fim da guerra, outros defenderam que a diferença técnica é mínima, porque a presença militar no Iraque irá continuar e os soldados americanos poderão assumir missões de combate se a evolução no terreno levar a isso.

A onda de ataques que percorreu várias cidades iraquianas na quarta-feira, atingindo as forças de segurança, veio expor a fragilidade da capacidade de autodefesa do Iraque - a escala e coordenação surpreenderam os EUA. "Não víamos este tipo de ataques desde Maio", disse o Departamento de Defesa, notando que demonstravam "que a Al-Qaeda ainda tem capacidade para conduzir operações" .

A Casa Branca veio reafirmar a intenção de cumprir o plano de retirar totalmente as tropas até Dezembro de 2011, mas alguns analistas gostariam que, no seu discurso, Obama deixasse a porta aberta para renegociar os termos do acordo e estender ou reforçar a presença militar no Iraque.

O maior obstáculo neste momento é a instabilidade política. Depois de umas eleições inconclusivas em Março, o país continua sem governo: com quem renegociar o acordo? E, como assinalava o jornalista Steve Coll na semana passada, num painel de discussão no think tank Brookings Institute, sem governo, "a quem é que as forças de segurança serão fiéis?"

O comandante das forças americanas, o general Ray Odierno, expressou ao jornal TheNew York Times a sua preocupação com o impasse político naquele país, adiantando que, se não for ultrapassado, pode levar à realização de novas eleições. "Se conseguirmos que o Governo seja formado, penso que tudo correrá bem. Se não conseguirmos, não sei."

Críticas dos conservadores

Extremamente críticos da decisão de retirar parcialmente neste Verão, um trio de especialistas do think tank conservador American Enterprise Institute repetiu ontem numa conferência de imprensa que a América "está a correr para as saídas" quando devia procurar reforçar uma presença a longo prazo na região, numa altura em que existem preocupações sobre o "expansionismo iraniano" e a sua influência sobre o Iraque, e em que novas superpotências como a China não perderão a oportunidade de entrar na competição global por uma região rica em petróleo.

Michael Rubin, um ex-consultor do Pentágono para o Iraque e Irão no primeiro mandato presidencial de Bush, defendeu que Obama está focado em cumprir a promessa eleitoral de retirar sem pensar no futuro. Sobre as tropas que permanecem, diz que "a sua principal preocupação estará em retirar, mesmo que se diga que se vão concentrar no treino de iraquianos".

Fred Kagan, tido como um dos arquitectos do aumento da presença militar em 2007, nota que nunca concordou com a decisão de retirar em 2011: "Achei errado quando Bush o fez e continuo a achar errado que Washington esteja a repetir isso como um mantra. O Presidente deve dar sinais de que está disponível para ouvir os iraquianos se eles pedirem aos EUA para prolongarem a presença".

O vice-presidente Joe Biden chegou ontem a Bagdad para se encontrar com líderes iraquianos, e assinalar a transição da missão americana.

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