Fogo na serra do Soajo expulsou o povo de Vilar de Soente da sua aldeia

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Habitantes de Vilar de Soente ficaram horas no centro de interpretação nelson garrido

Ordem de evacuação chegou às 13h, quando funcionários da Câmara de Arcos de Valdevez pediram à população para se juntar no largo da antiga escola. Só terão regressado de noite

Vilar de Soente nunca tinha vivido um dia assim. A proximidade das chamas do incêndio do Mezio, no Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG), obrigou à evacuação da aldeia de 40 casas. As habitações foram poupadas pelo fogo, mas o fumo atrasou o regresso à povoação. Os fogos florestais continuam a não dar tréguas no parque.

"O fogo já andou por lá noutros anos, mas como hoje [ontem] nunca tinha visto", conta Maria Barreira, de 70 anos, quase todos vividos na aldeia que pertence à freguesia de Soajo. A ordem de evacuação chegou cerca das 13h, quando funcionários da Câmara de Arcos de Valdevez pediram à população que se juntasse no largo da antiga escola. "Ainda fui correr o lugar à procura dos velhotes que estavam metidos em casa", conta Maria Branco, de 57 anos, que saiu "sem comer e sem dinheiro" de casa em direcção ao centro interpretativo do PNPG, na Porta do Mezio.

O incêndio que começou na terça-feira na serra do Soajo evoluiu em direcção à povoação. "Esteve mesmo em cima das casas", garante Maria Barreira. Por precaução, os habitantes foram retirados em ambulâncias da Cruz Vermelha de Viana do Castelo e carrinhas de IPSS do concelho, que também disponibilizaram funcionários para prestar apoios à população de Vilar de Soente. Mas entre os populares não houve feridos e nenhuma das casas foi atingida.

No centro interpretativo esperou-se. Muito. Três dezenas de pessoas, a maioria idosas, aguardaram na sala de conferências do edifício transformada numa espécie de centro comunitário onde se matou o tempo com conversa, pão, leite e marmelada. Esperou-se até depois da hora do jantar, apesar das constantes promessas dos responsáveis da Protecção Civil municipal de que a população ia passar a noite em casa. Mas o muito fumo que se acumulava na povoação impediu o regresso pelo menos até ao início da noite.

Juntaram-se quase 100 pessoas de Vilar de Soente, quase o dobro da população habitual da aldeia. Tudo porque esta é uma terra de emigrantes e muitos estão de visita a casa, nas férias de Verão. É o caso de António Pires, 56 anos, emigrado nos EUA. "Eu ainda estava em casa, porque ontem andei até tarde na festa. Mas depois de um dia destes ninguém tem vontade de lá voltar", afirma. A festa da vila do Soajo começou ontem e dura até domingo, embora na serra escasseiem os motivos para celebrar.

Apenas na serra do Soajo arderam, nos últimos dias, mais de mil hectares, segundo Marinho Araújo, vereador da Câmara de Arcos de Valdevez. No concelho são já sete mil os hectares de área ardida neste mês.

Pelo perigo que representava para as populações, o incêndio do Mezio foi aquele que concentrou maiores atenções da parte dos responsáveis da Protecção Civil no terreno, especialmente dos meios aéreos. Mas no perímetro do PNPG continuavam activos, ao início da noite de ontem, cinco incêndios. Na zona de Vilarinho da Furna, o fogo que deflagrou no sábado continua a consumir mata na serra Amarela. As chamas provenientes desta zona do Parque Nacional têm mais duas frentes activas já no concelho de Ponte da Barca, cujo combate foi autonomizado, concentrando-se agora na zona do posto transmissor do Muro, próximo de Lindoso, acossando as aldeias da Ermida e, sobretudo, de Germil, onde também se viviam momentos de pânico à hora de fecho desta edição.

O incêndio da Calcedónia, que chegou a colocar em perigo a vila do Gerês, também se mantém activo. Os bombeiros tinham antecipado a sua extinção durante a noite, mas um reacendimento voltou a causar alarme. Este fogo mantém duas frentes activas, uma em Junceda e a outra na vertente oposta ao santuário de S. Bento da Porta Aberta.

Aflição também em Seia

Apesar da descida da temperatura, o fogo voltou ontem a rondar casas noutros pontos do país e a dar muito que fazer aos bombeiros. No distrito da Guarda, as chamas chegaram durante a tarde à central hidroeléctrica do Sabugueiro, no concelho de Seia, tendo destruído o telhado de um dos edifícios.

Ainda em Seia, logo pela manhã, o fogo em Sandomil andou a poucos metros das casas. Vendo os seus bens ameaçados, os moradores desta localidade queixaram-se da falta de meios aéreos para combater os focos de incêndio que ocorriam em locais de difícil acesso. Segundo a agência Lusa, a população acusou ainda a Câmara de Seia de "não fazer aceiros e limpar caminhos", para prevenir os fogos e facilitar a acção dos 143 bombeiros e das 39 viaturas que ontem ali estiveram em acção. Para os auxiliar no combate ao incêndio foi mobilizado apenas um meio aéreo.

As chamas consumiram também área protegida do Parque Natural da Serra da Estrela. Na localidade de Aldeia da Serra, o fogo foi combatido por 144 bombeiros, 38 viaturas e dois meios aéreos.

No distrito de Braga, além do fogo em Vilarinho de Furnas, que deflagrou no sábado, e na Calcedónia, activo desde terça-feira, que continuavam a consumir área protegida do Parque Nacional Peneda-Gerês, deflagraram, ao final da tarde, outros dois incêndios em Vieira do Minho. O combate a estes quatro fogos mobilizou cerca de 200 bombeiros, que contaram com o auxílio de 25 viaturas e dois meios aéreos, segundo dados disponíveis no site da Autoridade Nacional de Protecção Civil.

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