China à procura de brancos

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"Brancos de montra" é como a CNN identifica este tipo de contratações, basicamente pessoas pagas para não trabalharem dr

É racismo ao contrário. Na China, muitas empresas "alugam" caucasianos para fingir que têm boas relações e oportunidades de negócio com firmas no estrangeiro

São pessoas pagas para não fazer nada. E é uma nova tendência das empresas chinesas para passarem uma imagem de sofisticação e abertura ao exterior. Não são necessárias qualificações nem experiência prévia. O único requisito é a cor de pele: branca.

A imprensa americana multiplicou recentemente os exemplos de pessoas que foram contratadas, ou simplesmente "alugadas", para aparecer em reuniões, ou fazerem-se passar por empresários estrangeiros. A ideia é transmitir uma imagem de que a empresa em causa tem contactos com o Ocidente, logo, oferece perspectivas de internacionalização aos seus parceiros de negócios.

A CNN fez uma listagem dos termos usados para descrever trabalhos como este: "brancos de montra", "branco de gravata", ou "o número do branco". E explicou que tem realmente tudo a ver com a questão da face, central na forma como os chineses se relacionam. Uma cara branca é sinónimo de "prestígio, dinheiro e relações importantes - reais ou não - com os negócios no estrangeiro".

"Dizemos na China que a face é mais importante do que a própria vida", comentou à estação norte-americana Zhang Haihua, autora de Think Like Chinese (Pense como os Chineses). "Como os países ocidentais são tão desenvolvidos, as pessoas pensam que são mais ricos, por isso, as pessoas acham que se uma empresa consegue contratar estrangeiros deve ter muito dinheiro e ligações importantes no exterior. Quando querem realmente impressionar alguém, podem tirar da manga um estrangeiro." Desde que seja caucasiano.

O Wall Street Journal conta a história de Caroline Swartz, contratada para gestora de projectos de uma empresa em Pequim, em 2006. Trabalhou lá durante um ano, e durante a maior parte do tempo a sua função era não fazer absolutamente nada. Participava nas reuniões, mas sem abrir a boca. Ninguém lhe dizia o que iria ser discutido, ou quem eram os clientes. Depois das reuniões deveria regressar à sua secretária. "Era apresentada, ficava sempre visível e acessível. Mas não tinha qualquer responsabilidade", conta Swartz, actualmente a estudar em Nova Iorque. Diz que se sentia como uma "criança" ou um "animal de jardim zoológico" dentro da empresa.

A maioria dos que aceitam trabalhos deste género são professores de Inglês em part-time, ou modelos e actores sem emprego, avança a CNN.

Não falar chinês

É este o caso do actor norte-americano Jonathan Zatkin, que vive em Pequim. No ano passado, contou, fez-se passar por vice-presidente de uma empresa de jóias que, alegadamente, tinha uma parceria de dez anos com uma cadeia de joalharias chinesas.

Zatkin recebeu 2000 yuan (mais de 230 euros) para apanhar um avião com dois modelos russos femininos para uma pequena cidade da província de Henan, onde lhe coube fazer um discurso. "Eu estava lá em cima do palco com o presidente da câmara, e fiz um discurso sobre quão maravilhoso era trabalhar com aquela empresa há dez anos e como estávamos orgulhosos de todo o trabalho que eles tinham feito para nós na China", contou. "Havia uma grande banda, toda a cidade estava ali."

Brad Smith é outro exemplo. O actor fingiu ser um arquitecto de Nova Iorque e distribuiu plantas de um novo museu a vários responsáveis locais. Se alguém lhe perguntasse alguma coisa, fingiria uma resposta através do seu "intérprete".

A CNN enumera as três regas de ouro: "Ser branco; não falar chinês, ou melhor, não falar, a não ser que se seja questionado sobre alguma coisa; fingir que se saiu de um avião no dia anterior."

Mitch Moxley relatou na revista norte-americana The Atlantic a sua experiência. Foi aceite como especialista em controlo de qualidade na delegação de uma empresa americana na China de que nunca tinha ouvido falar. Não era necessária qualquer experiência e o salário era bastante aceitável: mil dólares por semana (796 euros), durante um mês, para ser alojado num hotel chique de Dongying, na província de Shandong. "Só precisava de ter bom aspecto e um fato." O amigo de um amigo explicou-lhe ainda em Pequim que chamava a este tipo de trabalho "branco de gravata", e avançou com os detalhes: "Basicamente, vestimos um fato, damos alguns apertos de mão e fazemos algum dinheiro. Estaremos no controlo de qualidade, mas ninguém está a fazer nenhum controlo de qualidade. Aceitas?"

Coube a um dos "controladores de qualidade" que seguiram com ele, mais velho, fazer de patrão: discursar, distribuir cartões de visita, cortar a fita vermelha, posar na fotografia ao lado do presidente da câmara. Alguns membros do grupo foram convidados para ficar na empresa mais oito meses. A ele foi-lhe prometido que haveria uma oportunidade semelhante mensalmente, com uma recomendação: "Traz o computador. Podes ficar a ver filmes o dia todo."

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