Primeiros brinquedos

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Lobo Loup - Livro

O corpo é o primeiro brinquedo das crianças. Seguem-se muitos outros. Da roca aos super-heróis ou às princesas, são inúmeras as possibilidades. Os pais podem estimular os filhos através dos brinquedos, mas não devem exagerar. Há uma parte que cabe aos miúdos descobrir.

Só depois de muito brincarem com as mãos e os pés, à descoberta das habilidades do corpo, é que os bebés começam a interessar-se por brinquedos. Mais ainda quando já têm mobilidade e encontram jogos para se divertirem em família. No entanto, "um brinquedo é qualquer objecto que a criança possa usar para brincar", diz Vera Ramalho, psicóloga clínica. Em segurança, claro.

"As crianças aprendem com os brinquedos noções de tamanho, forma, som, textura e como funcionam as coisas. Neste sentido, é de extrema importância que os pais disponibilizem brinquedos para os seus filhos, a partir de tenra idade, e que ao mesmo tempo proporcionem tarefas que vão para além dos cuidados à criança, incluindo a brincadeira e promovendo a interacção." Ou seja, os pais têm de arranjar tempo para "ir ao tapete" com os filhos. E brincar. Mas nada de exageros nos estímulos ao desenvolvimento, porque há experiências que eles têm de viver por si próprios.

Ver, ouvir e apertar

A especialista, directora da clínica Psiquilíbrios, em Braga, diz ser importante que numa fase inicial se deixe o "bebé livremente em brincadeiras com o seu próprio corpo". Lembra também os estudos que "demonstram que, desde o nascimento, os bebés são sensíveis ao seu meio ambiente e que as suas percepções sensoriais respondem aos estímulos de olfacto, paladar, som, tacto e visão". Para concluir que logo nessa fase tão precoce "os brinquedos começam a exercer o seu papel".

Até ao primeiro ano de vida, os brinquedos mais comuns são os que "exploram a percepção visual, estimulam a coordenação motora (apertar, agarrar, sucção) e a audição (musicais, guizos e brinquedos de berço)".

Por volta do ano e meio/dois anos, Vera Ramalho sugere que se promova a brincadeira "com brinquedos leves, de várias texturas". A psicóloga, que comunicou com a Pública via email e telefone, dá alguns exemplos para esta fase: "Bonecos de tecido feitos de materiais não tóxicos favorecem o tacto, mas também servem para chupar ou morder. Boas opções são ainda brinquedos flutuantes para o banho."

De origem brasileira mas em Portugal há 20 anos, Vera Ramalho trabalha sobretudo com crianças, adolescentes e casais. E não tem dúvidas de que, "através da brincadeira, a criança pode experimentar novas formas de acção, exercitá-las, ser criativa, imaginar situações e reproduzir momentos e interacções importantes da sua vida, dando-lhes um novo significado".

Quando um bebé já se consegue sentar, as possibilidades de novas experiências aumentam, "está pronto para os brinquedos empilháveis, como as argolas, blocos que podem ser encaixados ou objectos de tamanhos e formas diferentes que se colocam e tiram de dentro de uma caixa. Estes estimulam a coordenação óculo-manual".

Empurrar, puxar

e montar

Chega o grande momento de começarem a apreciar os livros com ilustrações de objectos reconhecíveis, familiares, "o que promove o desenvolvimento social e emocional". Quando aprendem a gatinhar e a andar, "os brinquedos que mais se adequam e que chamam a sua atenção são os que se empurram ou puxam, como os carrinhos de bonecas, e os brinquedos de montar e desmontar".

Nesta altura, também aumenta a "mobilidade" dos pais e a desarrumação da casa. É preciso manter a calma.

Há uma brincadeira importante nesta fase a que a especialista chama "esconde-esconde" (o equivalente ao aparece/desaparece, em que dizemos "cucu"). Fazer desaparecer por instantes objectos ou rostos que depois reaparecem "vai ajudar a criança a elaborar o processo de separação dos pais". A ideia é que ela perceba, embora mais tarde, que "o objecto/pessoa pode desaparecer momentaneamente, mas retorna".

Dos dois aos quatro anos, começa o desejo de imitação do quotidiano familiar e das actividades dos adultos. Panelas e outros utensílios de cozinha, bonecos, casinhas são alguns dos exemplos de objectos adequados a estas idades. "Também são boas opções os brinquedos para o ar livre, como bolas, insufláveis ou caixas de areia com pás e cubos. Ajudam a adquirir as noções de distância, espaço e equilíbrio", completa a autora de Lá em Casa Mandam Eles? e O Birras Queria Ser da Família da Clara!, editados pela Psiquilíbrio Edições.

Descobrir, imaginar

e jogar

Explorar o mundo à sua volta é próprio dos miúdos que têm entre os três e os seis anos. Mas não se limitam a deslumbrar-se com as descobertas, vão sempre mais além na recriação do já conhecido.

"São hábeis nos jogos de faz-de-conta e em criar situações de fantasia. A criança desenvolve a imaginação e dirige-a aos brinquedos: os bonecos tornam-se amigos ou super-heróis e os blocos de montar ou os legos transformam-se em cidades." Por isso é que Vera Ramalho aconselha para esta etapa "brinquedos que promovam o mundo imaginário", mesmo que o ponto de partida seja o real. Assim, sugere "lojas em miniatura, com dinheiro de brincar, caixa registadora, telefone, telemóvel, cidades, casas de bonecas com móveis, carros, escolas", entre outros.

Também o brinquedo de estimação, "o favorito", é escolhido por esta altura, conferindo aos miúdos "a sensação de segurança e companhia. Uma boneca ou um peluche, por exemplo, pode ajudar a criança a superar momentos difíceis ou medos".

À medida que o tempo avança, as competências alargam-se e os miúdos já podem usar (e desfrutar de) jogos que exercitam "a capacidade de visualização e o treino da memória". São "os jogos de tabuleiro e os jogos de palavras, que recorrem ao uso da imaginação ou ao cálculo mental".

Os puzzles começam igualmente a interessar aos pequenos, e são conhecidas as suas potencialidades. "Os jogos com poucas regras podem ser uma oportunidade para explorar o raciocínio, mas também o desenvolvimento emocional, pois a criança tem de lidar com a frustração quando perde, aspecto fundamental para o equilíbrio futuro", lembra a psicóloga.

O desenvolvimento da parte motora fica a cargo dos "triciclos, bolas e blocos de montar".

A partir do sexto ano de vida, os brinquedos começam a fazer parte de brincadeiras mais elaboradas, tanto no domínio do faz-de-conta como na complexidade dos puzzles e dos jogos de raciocínio, como quebra-cabeças.

"Em geral, a partir dos 10 anos e na adolescência, os brinquedos deixam de ter tanto relevo para as crianças, podendo estas seleccionar um objecto em particular e em alguns casos devido ao seu valor sentimental. Os jogos de grupo têm um papel fundamental nesta fase pelo desejo de convívio com outras crianças." Mas aqui já não podemos falar de "primeiros brinquedos", mas talvez dos últimos...

Brincar

é essencial

Vera Ramalho acredita que, "no futuro, a brincadeira e tudo o que esta proporcionou irá reflectir-se na vida, desde as relações com os pais, irmãos, primos, incluindo a aprendizagem das regras de interacção criança-adulto (que se baseia numa relação vertical), até à relação entre iguais, que se desenvolve com os irmãos e pares. Os conhecimentos adquiridos nas brincadeiras de criança, incluindo os afectos envolvidos, ligam o adulto à sociedade onde está, facilitando a sua integração e adaptação".

Para concluir, a psicóloga atribui à "brincadeira" um papel essencial na vida das pessoas, "porque se constitui ao mesmo tempo como produto e produtora de sentidos e significados na formação da personalidade da criança". Que há-de ser adulto. A sério. A

?rpimenta@publico.pt

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