O significado do Novas Oportunidades

O programa levou à escola 1,2 milhões de pessoas, dando um belo retrato da sociedade portuguesa

O obstáculo maior com que o programa Novas Oportunidades se confrontou foi a tentativa que muitos ensaiaram de o comparar a um ciclo normal da escolaridade obrigatória. Colocada a avaliação dos seus resultados nestes termos, seria difícil não sobrelevar no programa razões de cepticismo ou de censura - não se pode comparar a assiduidade, a facilidade de aprendizagem ou a integração no ambiente escolar de um adolescente de 12 ou 15 anos com um adulto já inserido na vida activa. Mas se formos capazes de evitar esse perigo de comparar realidades que não são comparáveis, dificilmente se poderá deixar de concluir que o Novas Oportunidades deu um belo retrato da sociedade portuguesa nestes tempos conturbados. Apesar de todas as dúvidas que se colocam sobre o poder da educação como meio de ascensão social, mais de um milhão de portugueses respondeu ao desafio, pegou nos livros e regressou à escola. Houve, claro, muitos, talvez até uma grande parte, que o fizeram com displicência, na tentativa de obter um grau académico sem esforço nem conteúdo; mas houve também dezenas de milhares de pessoas que encararam o desafio com seriedade, que se aplicaram e envolveram e que, no final, aprenderam e melhoraram as suas competências. Foram essas pessoas que as televisões mostraram emocionadas no momento em que receberam os seus diplomas. E são essas as pessoas que, de algum modo, simbolizam a rejeição do conformismo e da apatia. É óbvio que os números hoje revelados pelo Governo para exprimir o sucesso do seu programa devem ser despidos da tentação da propaganda; mas também é óbvio que o simples facto de o Novas Oportunidades mostrar que há 1,2 milhões de pessoas dispostas a perder tempo no regresso à escola é um facto que merece ser enaltecido.

Ainda é possível reformar o Estado?

Numa altura em que o papel do Estado está a aparecer como o principal ponto de clivagem entre os dois maiores partidos, João Figueiredo, o antigo secretário de Estado da Administração Pública do primeiro governo Sócrates, veio à praça pública deixar dois recados simples. O primeiro, dirigido ao PSD, era um aviso quanto aos custos sociais dos cortes no Estado. O segundo foi o de que não existem condições políticas para reformar a administração pública. Era dirigido a todos os partidos, mas mais ao PSD. João Figueiredo reagia aos ataques de Passos Coelho à reforma do Estado que tutelou. E queria dizer que não se pode estar sempre a começar tudo de novo. Tem razão nesse ponto. Mas nem os tempos estão para entendimentos nem a crise deixa uma grande margem de manobra. Embora o Governo pretenda o contrário, não andámos suficientemente depressa na reforma do Estado. A resposta ao problema do papel do Estado passa pela recusa do clientelismo e por aceitar regras que tornem eficaz a gestão da coisa pública. Mais do que visões diferentes sobre o Estado, falta aos dois grandes partidos uma coragem política comum.

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