Fisco trava plano de recuperação da Papelaria Fernandes

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Fecho da Papelaria Fernandes deixará 150 pessoas no desemprego RICARDO BRITO

Projecto de viabilização da empresa centenária, aprovado em Dezembro, foi suspenso por causa de dívidas de 3,3 milhões de euros à administração fiscal

A salvação da insolvente Papelaria Fernandes está, agora, mais difícil. Apesar de o plano de recuperação ter sido aprovado pela maioria dos credores, um recurso interposto pela administração fiscal, à qual a empresa deve 3,3 milhões de euros, vai inviabilizar o seu arranque. Em reacção, José Morgado Henriques, presidente e accionista, decidiu abandonar o cargo. O cenário de liquidação é cada vez mais provável.

O fisco já tinha manifestado o seu desacordo em relação ao plano de recuperação na assembleia de credores realizada em Dezembro. Foi, aliás, o único credor a votar contra o projecto, que acabou por ser homologado, em Fevereiro, pelo Tribunal de Comércio de Lisboa. Foi esta homologação que suscitou o recurso da administração fiscal. Procedimento frequente quando não concorda com a proposta de pagamento da dívida.

De acordo com as alegações do Ministério Público, o Estado entende que o plano de "pagamento das dívidas fiscais a prestações (...) não respeita os requisitos imperativos da lei fiscal". O recurso acrescenta que a legislação não prevê "moratórias ou perdões, salvo regulação expressa", e que "não está nas mãos dos particulares decidir quando e onde se vai efectuar o pagamento dos impostos".

A administração da Papelaria Fernandes sabia que a interposição de recurso por parte do fisco poderia acontecer, mas o PÚBLICO sabe que a empresa, que ainda dá emprego a 150 pessoas, estaria na expectativa de que o Estado "interviesse não de forma a travar a recuperação, mas sim a apoiá-la", afirmou fonte próxima do processo. Teme-se, agora, que a liquidação se torne uma realidade, uma vez que "não há condições para esperar por uma decisão do tribunal para avançar com o projecto", afirmou José Morgado Henriques.

O ainda presidente da Papelaria Fernandes, que deixará do cargo no final de Maio, avançou que um dos investidores que tinha mostrado disponibilidade para entrar no projecto "já desistiu", que os trabalhadores "precisam de saber o que lhes vai acontecer" e que a ideia de expandir o negócio em Angola poderá, agora, estar mais fragilizada porque "os parceiros estavam à espera que o projecto fosse para a frente já".

Também há a questão do financiamento da gestão corrente da empresa, suportada, até agora, pelo maior credor, o BCP. José Morgado Henriques afirmou que o banco "tem feito um esforço para que a empresa se mantenha viva", mas admite que "pode não estar disposto a continuar a financiá-la".

Contactado pelo PÚBLICO, o Ministério das Finanças não quis prestar declarações sobre o recurso interposto à homologação do plano de viabilização. "Por força do sigilo fiscal, a administração fiscal não se pronuncia sobre contribuintes em concreto", afirmou.

A ideia do gestor era encerrar a Papelaria Fernandes, fundada há 118 anos, e ceder a exploração da sua actividade e direitos de imagem a uma nova empresa, que, apesar de uma redução da estrutura, manteria o nome e pagaria aos credores no prazo de 20 anos. Estes desenvolvimentos podem pôr em causa esse projecto. "Não desisto daquilo em que acredito, mas admito que a liquidação se tornou uma possibilidade", afirmou.

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