Director do Museu de Arqueologia admite evolução para “situação de ruptura”

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Luís Raposo, director do Museu Nacional de Arquelogia, no Mosteiro dos Jerónimos Pedro Cunha (arquivo)

Luís Raposo, director do Museu Nacional de Arqueologia (MNA), disse ao PÚBLICO que as divergências com o Ministério da Cultura (MC) quanto à transferência do museu do Mosteiro dos Jerónimos para o edifício da Cordoaria Nacional, na zona ribeirinha de Lisboa, “entraram numa nova fase que pode conduzir a uma situação de ruptura”.

Depois de há algumas semanas terem surgido sinais positivos, “a situação precipitou-se”, segundo Luís Raposo, porque o MC lhe pediu que devolvesse a Torre Oca, um espaço que considera essencial para o museu, à Marinha, que a cedeu no passado ao MNA. A torre serviria como garantia à Marinha, que vai por seu lado ceder a Cordoaria.

Mas para Luís Raposo essa entrega da torre até ao início de Maio, como lhe foi pedido, “é totalmente inaceitável” numa altura em que ainda não lhe foram apresentados estudos que provem que a Cordoaria é um local seguro para instalar as colecções do MNA. O director do museu cita estudos a que teve acesso e que indicam elevados riscos sísmicos e de inundações.

Também as duas associações do sector, a Associação dos Arqueólogos Portugueses (AAP) e a Associação Profissional de Arqueólogos (APA) reuniram-se no sábado (pela primeira vez) e manifestaram em comunicado a sua “profunda inquietação” perante os planos para a transferência do MNA para a Cordoaria – “um erro grave ou até um crime de lesa património”.

“No século XIX e início do século XX era frequente adaptarem-se espaços de antigos mosteiros e conventos. No século XXI isso é uma prática que já não é aceitável”, disse ao PÚBLICO José Morais Arnaut, da AAP. “Os museus hoje têm determinadas exigências que só podem ser plenamente satisfeitas se forem instalados em edifícios feitos de raiz. Têm que ter um espaço grande para as reservas, laboratórios, serviços educativos”.

Morais Arnaut reconhece que a situação em que o MNA está actualmente é má porque o espaço é insuficiente, mas considera-a preferível à transferência para a Cordoaria. Até porque, argumenta, esta é um monumento nacional e seria “descaracterizado”. “O MC está a colocar em risco de destruição um património que deveria defender”.

O dirigente da AAP é duro nas críticas que faz à política do actual Governo (sobretudo ao secretário de Estado, Elísio Summavielle, antigo director do IGESPAR) e dos que o antecederam relativamente à arqueologia – uma “tentativa de relegar o património arqueológico para posições marginais”, diz. “Já conseguiram destruir o IPA [Instituto Português de Arqueologia] e dispersar os laboratórios e serviços de arqueologia por vários edifícios”. E aponta os custos de algumas medidas: “O aluguer do espaço no MARL [Mercado Abastecedor da Região de Lisboa, onde estão algumas peças retiradas do local onde está a ser construído o novo Museu dos Coches] custa 20 mil euros por mês durante 24 meses, o que dá meio milhão de euros”.

Também a transferência do MNA é, na sua opinião, “uma operação que “vai implicar despesas enormes, completamente inaceitáveis”.

A ideia de transferir o MNA surgiu pela primeira vez devido à necessidade de retirar os serviços ligados à arqueologia das antigas oficinas de material do Exército, na Avenida da Índia, para aí construir o novo Museu dos Coches. Inicialmente esses serviços iriam para a Cordoaria, mas, sem ter sido possível um acordo em tempo útil, e para não atrasar mais a construção do novo museu, o MC decidiu colocar os serviços noutros locais, mantendo contudo a intenção de transferir o MNA para libertar a ala dos Jerónimos onde este se encontra, colocando-o num espaço (a Cordoaria) que, no entender do Ministério, tem a vantagem de ser muito maior.

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