E se o problema do euro estiver na Alemanha e não na Grécia?

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"Não abdicaremos da nossa força", diz Angela Merkel Tobias Schwarz/Reuters (arquivo)

Será que a zona euro tem na sua maior economia também o seu maior problema? Numa altura em que os problemas de países mais periféricos, como a Grécia ou Portugal, dominam as notícias, a pergunta pode parecer estranha, mas a verdade é que começou, nas últimas semanas, a dominar o debate económico e político europeu. Ao ponto de gerar o mais recente conflito franco-alemão.

Christine Lagarde, a ministra francesa das Finanças, afirmou que a Alemanha, para ajudar os países menos competitivos da zona euro e com graves problemas orçamentais, tinha de poupar menos e gastar mais: ou seja, abdicar dos seus enormes excedentes comerciais.

Logo a seguir, no comunicado final do Eurogrupo na passada segunda-feira, os ministros das Finanças da zona euro, incluindo o alemão, concordavam que, para resolver os problemas actuais, "também é necessária a acção dos Estados-membros que acumularam grandes excedentes", com "reformas estruturais que ajudem a fortalecer a procura interna".

No entanto, de Berlim surgem declarações completamente diferentes. Ontem, Angela Merkel foi clara: "Naquilo que somos fortes, não abdicaremos da nossa força, apenas porque as nossas exportações são mais compradas do que as dos outros países." Ainda mais directo tem sido o ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble, que tem argumentado que os desequilíbrios dos países periféricos não se resolvem com mais procura interna da Alemanha, mas sim com a criação de um FMI europeu para acudir a emergências e com a penalização exemplar - incluindo a expulsão - dos Estados-membros que não consigam controlar as suas contas públicas.

Ainda assim, são vários os economistas que colocam a Alemanha também no banco dos réus da actual crise. Um estudo realizado por nove economistas europeus e publicado esta semana pela rede de investigação Research on Money and Finance (RMF) coloca as características do modelo de crescimento alemão no centro dos problemas da zona euro. O trabalho sustenta que, através da imposição de uma política muito agressiva de contenção salarial, a Alemanha conseguiu, mesmo com taxas de crescimento baixas, assegurar uma grande competitividade externa.

Desta forma, levando os países mais periféricos, como Portugal e Grécia (com maiores dificuldades em impor o mesmo tipo de política salarial), a crescer através do recurso ao crédito, dado precisamente pelos bancos alemães. "Em termos de crescimento, emprego, produtividade, investimento e consumo, o desempenho da Alemanha tem sido medíocre. E, portanto, no coração da zona euro está uma economia que consegue crescer com base em excedentes externos, que resultam da forma como está organizada a zona euro."

Também Martin Wolf, na sua coluna de ontem no Financial Times, defende que a Alemanha - tal como acontece com a China face aos EUA - tem de mudar de política económica, sob o risco de desencadear uma crise que acabará também por a prejudicar. "Se os países com excedentes não mudarem de rumo, expandindo a sua procura agregada, o mundo será apanhado numa batalha proteccionista: toda a gente vai tentar desesperadamente passar o seu excesso de oferta para os seus parceiros comerciais. Esta foi uma parte importante da catástrofe dos anos 30", avisa.

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