Centros de inspecção automóvel avisam que liberalização irá aumentar insegurança

A Associação Nacional de Centros de Inspecção Automóvel (ANCIA) adverte que está em causa a "prevenção da sinistralidade rodoviária". Um aviso que surgiu assim que o Conselho de Ministros aprovou, no passado dia 11, um novo decreto-lei que "liberaliza" a criação dos centros de inspecção automóvel. A ANCIA acusa ainda o Governo de não ter adoptado um anteprojecto que tinha sido delineado em conjunto com a associação.

Entre outros aspectos, este anteprojecto previa a realização de concurso público e a sujeição dos novos operadores a um conjunto de regras e requisitos. Agora - conforme adianta a ANCIA -, o novo decreto-lei não prevê "critérios" e "concurso público" e, tendo em conta os prejuízos que prevê para as empresas do sector (que emprega três mil pessoas), prepara-se para pedir uma compensação ao Estado no valor de 400 milhões de euros.

Já o presidente do Automóvel Club de Portugal, Carlos Barbosa, classifica os actuais centros como de "seriedade muito duvidosa" e não está preocupado com problemas de concorrência. "A minha grande preocupação é que os centros sejam cada vez mais rigorosos e que haja uma inspecção periódica aleatória a esses centros." Carlos Barbosa acrescenta que não se pode ficar apenas pela fiscalização dos centros (que facilmente podem melhorar os seus procedimentos na presença de um inspector). "É preciso também ver as condições dos carros recentemente aprovados", exige.

Já Manuel João Ramos, presidente da Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados (ACA-M), denuncia: "Não é desconhecido que há corrupção nas inspecções, que há um facilitismo muito grande. Não são os condutores que levam os carros à inspecção, são os mecânicos que já conhecem os inspectores!". Para o líder da ACA-M, é "fundamental" criar mecanismos de fiscalização mais eficazes e que se possa mesmo "retirar ou suspender as licenças dos centros". Uma vez que desconhece o novo decreto-lei, Manuel João Ramos não se pronuncia sobre o mesmo, mas lembra que "aumentar a oferta sem controlo é muito perigoso".

Para João Dias, investigador especializado em acidentes e docente no departamento de Engenharia Mecânica do Instituto Superior Técnico de Lisboa, o mau funcionamento dos actuais centros é uma certeza. "Que eles não funcionam bem, não!".

Em 2006, João Dias coordenou um estudo para a Deco em que foram introduzidas seis deficiências em 30 automóveis que foram inspeccionados em 30 centros por todo o país. Conclusão: nenhum dos centros detectou as seis anomalias - o melhor conseguiu detectar cinco - e houve até casos em que não foi detectada nenhuma. João Dias defende ainda inspecções às motos, já que basta uma queda ou retirar equipamentos como "piscas" ou espelhos para alterar as condições das mesmas.

Contactado pelo PÚBLICO, o Ministério dos Transportes explicou que o novo regime resulta de imposições comunitárias e visa criar centros nos concelhos que hoje não os têm (apenas 161 em 308 dispõem de centros).

O ministério garante que os novos operadores "terão de cumprir os mesmos requisitos técnicos, segurança e qualidade que hoje são impostos às entidades existentes". Promete-se "um regime sancionatório mais pesado e dissuasor" para quem não cumprir regras e deveres profissionais. "Aliás, vinha-se verificando um grande incumprimento destas regras", reconhece o ministério, que promete "reforço da fiscalização" por parte do Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres (IMTT). Este instituto deverá entregar até ao final deste mês um anteprojecto para regular a inspecção de motociclos.

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