Maré rosa esperada nas regionais francesas
Nestas eleições complicadas em duas fases, em que pode haver várias triangulares (três candidatos sem maioria suficiente para serem eleitos passam à segunda volta), as sondagens dizem que a totalidade da esquerda recolhe 46 por cento das intenções de voto. A UMP do Presidente Nicolas Sarkozy, maioritária no Parlamento, deve ficar-se pelos 30 por cento.
Na primeira volta de hoje, a UMP até pode acabar à frente, mas as últimas sondagens de sexta-feira davam os socialistas a ganhar, com 30 por cento. No entanto, mesmo que ganhasse a primeira volta, a direita republicana ficará sem "reserva de votos": os seus candidatos que passem à segunda volta não contarão com o apoio de outros partidos, enquanto os socialistas, em princípio, poderão contar com o apoio dos verdes da Europa Ecologia (que contam com uma previsão de 13 por cento) no próximo domingo.
Em jogo estão as 26 regiões francesas, inclusivamente as ultramarinas. Se o mapa da França metropolitana ficar completamente cor-de-rosa, isso até nem representará uma grande mudança em relação às últimas regionais, em 2004, quando os socialistas conseguiram 20 das 22 regiões do "hexágono" - para a UMP ficaram apenas a Alsácia e a Córsega.
Mas muitas coisas se passaram na cena política francesa desde então, incluindo o triunfo de Sarkozy nas presidenciais de 2007, que parecia esmagador face ao desnorte total do PS. No entanto, este pode vir a ser um caso em que muita coisa muda para ficar, se não na mesma, pelo menos parecido.
O fim das reformas?Ainda que 72 por cento dos franceses considerem que o Governo deve levar em conta a mensagem das urnas e modificar a política nacional, Sarkozy, que atingiu o ponto mais baixo das preferências dos franceses, já quis pôr de parte a possibilidade de os resultados pesarem sobre a sua governação. "Eleições regionais, consequências regionais. Eleições nacionais, consequências nacionais", declarou, deixando entender que não previa nenhuma remodelação governamental em resposta ao anunciado mau desempenho da UMP.
Mas apesar dessas palavras, Sarkozy dá mostras de reconhecer que tem de levantar a bandeira branca, ainda que a prazo: numa entrevista ao Le Figaro, publicada sexta-feira, Sarkozy anuncia o fim das reformas... em 2011. "Universidade, trabalho ao domingo, 35 horas, horas extraordinárias... Faremos uma avaliação de todas as reformas para as melhorar. E depois, no segundo semestre de 2011, o Governo marcará uma pausa para que o Parlamento possa, se desejar, parar de legislar."
Sarkozy empenhou nas eleições oito ministros ou secretários de Estado, enviados para disputar as eleições em regiões que teriam possibilidades de votar à direita (em França, é possível ser eleito para múltiplos cargos públicos, ser ministro e presidente de uma região, por exemplo). Mas apenas dois membros do Governo dizia o Le Monde, nutrem ainda alguma esperança de ganhar.
A gestão da crise económica, o aumento do desemprego (que neste momento é de dez por cento, embora nos homens com menos de 25 anos atinja os 25 por cento), a polémica discussão da identidade nacional e várias erupções do que parece ser um racismo latente, mais ao jeito da Frente Nacional de Le Pen do que da direita republicana, não têm deixado Sarkozy e a UMP nas boas graças dos eleitores.
À esquerda algo de novo?Se o PS é dado como vencedor anunciado destas regionais, isso não quer dizer que tenha encontrado o seu rumo, nem que as amargas rivalidades estejam resolvidas - apenas foram engolidas, apaziguadas, em troca de um objectivo comum. Para a líder Martine Aubry, uma vitória em todas as regiões (um "grand slam", como dizem os socialistas, adoptando um termo desportivo), é importante para ganhar força como possível candidata socialista nas presidenciais de 2012 - uma posição ferozmente desejada por vários outros companheiros de partido. A escolha do candidato do PS será feita numas primárias internas, que prometem fazer sangue.
Quanto à sua rival Ségolène Royal, que é já presidente de uma região - a de Poitou-Charentes, uma das mais massacradas pela tempestade Xynthia -, encara estas eleições como a sua reentrada na cena nacional, para mais uma vez se perfilar para as presidenciais.
Um factor novo nas eleições é a Europa Ecologia, que reúne os verdes, durante anos desavindos em querelas internas. Disputam não o voto útil mas o "voto prazer" de quem quer uma alternativa à esquerda e à direita tradicionais, à forma tradicional de colocar as questões. O eurodeputado Daniel Cohn-Bendit apela a "um duplo voto útil, para mudar as regiões e mudar a paisagem política em França". Mas reconhece que o objectivo é fazer acordos com o PS.
Nas eleições europeias, em Junho de 2009, esse discurso foi-lhes favorável (tiveram 16,28 por cento), e nesta campanha parece estar a dar bons resultados em algumas regiões - até se perfila a possibilidade de uma vitória na Alsácia (têm 18 por cento, enquanto o PS tem 19) e na região de Ile-de-France (que inclui Paris) estão também com 18 por cento. Ainda que, em Janeiro, 55 por cento dos franceses achassem que os ecologistas não conseguiriam nunca dirigir uma região.
O verdadeiro desafio, no entanto, será levar os eleitores a sair de casa, para votar numas eleições em que os próprios cidadãos não conhecem muito bem os candidatos nem as funções destes órgãos de poder. As sondagens apontam para uma ida às urnas à volta dos 50 por cento, mas entre os jovens com idades entre os 18 e 24 anos apenas 28 por cento devem ir votar.