O PEC, os impostos e as participações do Estado

Nas medidas de austeridade que se apontam no PEC surgem as de aumento de impostos aos mais ricos, tributando-os em IRS à taxa de 45% acima do rendimento tributável de 150.000?. Esta tributação irá atingir pessoas que declaram tais rendimentos, mas importa assinalar que nem todos os ricos os declaram. Muitos ricos, a maioria talvez, não os declara. E porquê? Pode-se ter fortuna, mas não auferir rendimentos ou estes não serem declaráveis, ou não serem declarados.

Há rendimentos de bens imobiliários e de acções que são atribuídos a sociedades em off shores, ou com sedes fora de Portugal. É certo que, nestes casos e perante a nossa lei fiscal, também se deveriam apresentar declarações, mas tal não é efectuado. E há ricos com posições sociais em empresas sedeadas em Portugal que podem não receber rendimentos. Retêm-nos nas sociedades de que são sócios e, assim, não haverá IRS. Aliás, na tributação dos dividendos, escolhem a alternativa de tributação à taxa liberatória de 20%, e por retenção na fonte.

As maiores fortunas muitas vezes também são de quem detém acções de sociedades gestoras de participações sociais (SGPS) e, assim, não surge tributação. Essas sociedades não pagam imposto em relação aos dividendos que auferem. E também não pagam, via de regra, sobre mais-valias de vendas de acções. Diz-se, até, que não devem pagar, porque se geraria tributação duplicada, pois quando atribuem dividendos há tributação nos sócios. Acontece que as SGPS, por via de regra e para evitar tributação, não atribuem dividendos. Ora, esses casos são frequentes e atingem valores elevadíssimos, mas, para estes, não surge tributação na actual proposta do PEC.

Lembra-se ainda que as tributações de juros de obrigações e de depósitos a prazo se excluirão da tributação por escalões do IRS, visto tais rendimentos beneficiarem de taxa liberatória de 20 por cento. E também se observa que a tributação das mais-valias das acções que é proposta no PEC não irá, em regra, ocorrer nos tempos próximos, visto que as acções das sociedades sofreram, nos últimos, baixas elevadas, pelo que a tributação em mais-valias que se anuncia talvez não venha gerar grandes ganhos. Aliás, é uma tributação de que já se fala há muito tempo e que tem acabado por não ocorrer.

Outra questão que se suscita é a de vendas de participações do Estado, que é a forma de o Estado obter fundos para pagar dívidas. É enumerada a TAP, mas o importante, nesta empresa, seria começar por evitar as greves que, sucessivamente, ocorrem. Até algo absurdas, mesmo obscenas, pois são altas já as remunerações e as regalias diversas dos seus trabalhadores, em particular dos pilotos. Tais greves são ruinosas para a TAP, ou seja para o país, na medida em que a empresa é pública. E vendê-la com altos prejuízos não gerará preço compatível, dado que quem compra evidenciará essa menos-valia e ocultará o que fará, depois, para tornar a empresa lucrativa.

Quanto a participações em empresas lucrativas, apontá-las para venda gera, logo, baixas nos preços. Se tais vendas se concretizarem, o Estado perde boas receitas futuras. O produto da venda não atingirá valores compensadores. Anota-se também que, com as vendas de posições sociais, o Estado, e o país, perderá posições estratégicas em empresas monopolistas. E se os monopólios estiverem sob domínio de privados, mais difícil será alcançar baixas nos preços de bens e serviços essenciais (electricidade, combustíveis, água, transportes...). Professor catedrático jubilado do ISEG, economista e advogado

(Este artigo foi escrito antes da reunião de ontem do Conselho de Ministros)

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