Governo tenta forçar PSD a abençoar medidas difíceis
"O PSD não pode ignorar que as matérias fundamentais em relação às quais o Governo se orientou no Programa de Estabilidade e Crescimento foram desde logo objecto de diálogo no OE e que concorreu para a viabilização através da abstenção", advertiu ontem Jorge Lacão, numa declaração aos jornalistas no Parlamento.
Horas mais tarde, a mesma potencial incoerência do PSD viria a ser apontada pelo candidato à liderança do partido Pedro Passos Coelho: "Tenho uma certa dificuldade em perceber que quem entende que é uma irresponsabilidade chumbar um orçamento que não serve o país venha depois dizer que se deve chumbar um PEC e um Governo que também não serve o país".
Depois de o Governo apreciar hoje o PEC, em Conselho de Ministros Extraordinário, é a vez de os partidos e de os parceiros sociais serem recebidos pelo primeiro-ministro na segunda-feira, em São Bento. Nessas reuniões, segundo Jorge Lacão, o documento será divulgado, como exigia o Bloco de Esquerda.
O PEC não está sujeito a votação no Parlamento, mas é discutido em plenário. Só depois é entregue em Bruxelas. O debate no Parlamento está marcado para dia 25, um dia antes das eleições directas para a liderança do PSD. E é nesta disputa que o ministro dos Assuntos Parlamentares encontrou motivos de crítica. Jorge Lacão condenou os três candidatos por terem posições pouco reflectidas e, em particular, Aguiar-Branco, ao admitir uma moção de censura se o PEC for contra "o interesse nacional".
Em reacção, Aguiar-Branco acusou Jorge Lacão de ser "uma versão reciclada" de Augusto Santos Silva (antecessor na pasta dos Assuntos Parlamentares), ao comentar mais a vida interna do PSD e preocupar-se menos com a governação. "O importante é que o PS governasse, que já tivessem apresentado o PEC", frisou o líder parlamentar do PSD, lembrando que Portugal "é o último país" a entregar o documento em Bruxelas (a par do Chipre). E impõe três condições para apreciar o PEC de forma positiva.
"Temos de ver se é possível inverter a trajectória do aumento do endividamento externo, do défice e aumentar a transparência das contas públicas", disse o líder da bancada do PSD. Questionado sobre se o PSD poderá avançar com uma moção de censura ao Governo por causa do PEC, depois de este documento ser aceite em Bruxelas, Aguiar-Branco remeteu para segunda-feira. "Em relação ao que tem a ver com o PEC, só posso responder depois de o ver", disse.
Estado "paralisado"A Pedro Passos Coelho, Jorge Lacão deixou outra crítica que visava a possibilidade admitida pelo candidato de uma missão do FMI em Portugal. "Nada disto concorre para o clima de estabilidade e de seriedade", disse o ministro. Passos Coelho apresentou ontem um conjunto de compromissos que gostaria de ver no PEC, entre os quais uma redução da dívida pública para 75 por cento e limitar as entradas na função pública a uma por cada cinco saídas.
No final de três dias de votação na especialidade do OE para 2010, o ministro dos Assuntos Parlamentares deixou uma nota de satisfação - pela disponibilidade dos partidos para o diálogo - mas também uma advertência sobre as consequências de uma coligação negativa do PSD, PCP e BE.
Trata-se do chumbo da oposição à dispensa de visto prévio do Tribunal de Contas para contratos até 350 mil euros. "O executivo, a administração pública e as autarquias ficarão paralisados", avisou Lacão. Perante o chumbo, o PS avocou a matéria para votação em plenário. "A manter-se a situação nestes termos, significaria que qualquer contrato susceptível de ser reduzido a escrito - bastaria ter um valor de dez euros, ou menos - teria de ir a visto prévio por parte do Tribunal de Contas", disse o governante, acrescentando que espera a correcção deste "lapso político". Uma possibilidade que não deve ser de todo impossível, já que o deputado do PSD Duarte Pacheco admitiu que os contratos para empreitadas de valor até 350 mil euros possam estar isentos de visto do Tribunal de Contas, desde que haja transparência. "Até pode ser esse mesmo limite, o que nós não aceitamos é o desdobramento. E vamos propor que isso não aconteça".