Alexander Haig O Presidente 37 e meio

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É Alexander Haig quem negoceia com o vice-presidente Gerald Ford o "perdão" de Nixon Gianni Giansanti/corbis

Manipulador e oportunista, com escasso faro político, Alexander Haig tem a glória de ter sabido pilotar a resolução da mais grave crise política americana, encerrando o caso Watergate

Alexander Haig, 85 anos, antigo comandante da NATO e secretário de Estado de Ronald Reagan, morreu no domingo. Foi, segundo Obama, "um excelente guerreiro-diplomata". Foi também um político ambicioso que falhou quase todos os desígnios. O ponto alto da sua biografia são os 16 derradeiros meses da Administração Nixon, atolada no escândalo Watergate.

Perante um Presidente alheado, encharcado em comprimidos, a bater-se furiosamente, e em vão, pela sobrevivência, Haig assumiu o comando da Casa Branca. "Por pura força de vontade, dedicação e autodisciplina, foi ele quem manteve o governo unido", testemunhou Henry Kissinger.

O procurador especial Leon Jaworski, que investigava Nixon, alcunhou-o de Presidente 37 e meio. O "presidente em exercício".

Na corte de Nixon

Haig terminou os estudos na academia militar em 1947, com classificação mediana. Colocado no Japão, namorou a filha do seu general, casou com ela e, por via do sogro, entrou no staff de Douglas McArthur, comandante supremo no Pacífico. Quando eclode a Guerra da Coreia (1950), é o jovem tenente quem transporta o saco-cama de McArthur.

Em 1962, conclui um curso de Relações Internacionais na Universidade de Georgetown, onde fez conhecimentos que mudam a sua vida. Cyrus Vance, então secretário do Exército, foi seu professor e convida-o para adjunto. Entra na equipa do secretário da Defesa, Robert McNamara. Combate dois anos no Vietname.

Em 1968, após a eleição de Nixon, os antigos mentores indicam-no a Kissinger, o novo conselheiro de Segurança Nacional, que o faz entrar na Casa Branca. É promovido a general. Três anos depois, sem ter exercido qualquer comando, é elevado por Nixon a general de quatro estrelas, passando por cima de 240 generais.

Torna-se o número dois de Kissinger. Em Janeiro de 1972, faz uma missão secreta na China, antecedendo a histórica viagem de Nixon, seguida de missões no Sueste asiático, preparando as negociações sobre o Vietname, em que tomará parte. É nomeado vice-chefe do Estado-Maior do Exército.

Mas logo volta à Casa Branca, que se está a desintegrar. Em Maio de 1973, demite-se o chefe de gabinete (chief of staff), Bob Haldeman. Haig substitui-o. Chegara a sua hora.

Assume o comando, dá as ordens, coordena os ministros, monopoliza o acesso a um Nixon cada vez mais ausente. Cabe-lhe resolver a crise institucional. Negoceia com o vice-presidente Gerald Ford o "perdão" de Nixon, para que ele abandone o cargo antes da destituição. Lera transcrições das cassetes que Nixon tenta esconder: "Quando acabei de as ler, percebi que Nixon nunca sobreviveria."

O historiador Robert Dallek (Nixon and Kissinger, 2007) faz uma observação sobre a personalidade de Haig desde os primeiros tempos na Casa Branca: "Ambicioso como ninguém na Administração, o duro trabalho de Haig e a eficaz manipulação de Nixon, de Haldeman e do próprio Kissinger trouxeram-lhe uma rápida promoção."

O ambiente sempre foi sórdido. Nixon dizia ter a ficha psiquiátrica do seu "judeu", Kissinger. Este tratava Nixon de "louco" ou "maníaco". Kissinger desconfiava estar a ser escutado. E com razão, diz Dallek: Haig enviou ao FBI 17 requisições de escutas telefónicas a responsáveis da Administração, entre eles adjuntos de Kissinger, que depois transmitia a Nixon.

Quando Nixon resigna, Ford afasta Haig para o exílio dourado de comandante da NATO na Europa. Em 1979, sobrevive, ileso, a um atentado do "Bando Baader-Meinhoff", na Bélgica.

Despedido por Reagan

Por sugestão de Nixon, Reagan nomeia-o secretário de Estado, em Janeiro de 1981. Resistirá 18 meses. Haig considera Reagan ignorante e lunático. Diverge da retórica do Presidente-actor. É um realista que quer prosseguir a política de Nixon perante Moscovo e Pequim. Denunciará a Casa Branca como um "barco-fantasma", manipulado pelos "homens do Presidente".

Escreveu que Reagan será lembrado por ter tido a "fortuna de ser Presidente quando o Império do Mal começou a estoirar."

No dia do atentado contra Reagan (Março 1981), declarou ao país pela televisão: "A partir de agora, assumo o controlo da Casa Branca até à chegada do vice-presidente." Constitucionalmente era ao speaker da Câmara dos Representantes que cabia esse papel. Foi uma gaffe que Reagan não esqueceu.

Acumulam-se as tensões sobre a política externa. Em Junho de 1982, Reagan entrega-lhe uma carta em que declara aceitar o seu pedido de demissão. "O Presidente aceitou uma carta de demissão que nunca lhe foi apresentada", corrigirá Haig no livro Caveat: Realism, Reagan, and Foreign Policy (1984).

Em 1987, lança-se como candidato republicano à presidência, desafiando George H. Bush. É humilhado nas primárias. Tem uma popularidade de três por cento. Desiste.

Terá sido um maquiavélico homem de bastidores, nunca foi um "animal político".

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