Bettencourt, a desilusão do ano
José Eduardo Bettencourt foi eleito presidente do Sporting há pouco mais de seis meses e com 90 por cento dos votos, num acto eleitoral em que se registou uma das maiores participações de sempre. Neste período, conseguiu atingir o objectivo dos 100 mil sócios, aprovar o projecto de reestruturação financeira que estava na gaveta há muito tempo e celebrar um protocolo com a Câmara de Lisboa que, além de vantagens financeiras, deve assegurar ao clube o pavilhão desportivo que há muito era desejado em Alvalade. Mas nem tudo isso impede que Bettencourt seja hoje visto como uma das principais desilusões da época no universo desportivo português, talvez mesmo junto de boa parte daqueles que ainda há bem pouco tempo o elegeram.
Mais do que pelas acções (embora algumas delas também tenham sido muito discutíveis), o presidente do Sporting tem pecado pelo verbo. Durante este tempo, já o ouvimos falar em actos de terrorismo, terrorismo financiado e minoria ruidosa, tudo dirigindo-se a alguns dos seus consócios. Mesmo descontando o "forever" e a forma como Paulo Bento acabou por abandonar o barco pelo seu próprio pé, causou estranheza a facilidade como a estrutura leonina recentemente reconduzida ruiu como um castelo de cartas na sequência do abandono do treinador, com Miguel Ribeiro Teles e Pedro Barbosa a darem lugar a Miguel Salema Garção e Sá Pinto, para além de Carlos Carvalhal. Isto já para não falar na forma como o Sporting falhou (?) a contratação do técnico (André Villas Boas) do então último classificado da liga portuguesa.
Mas, Bettencourt fez mais. Começou por dizer que não havia dinheiro para reforçar a equipa, chegando a pedir desculpa aos sócios por isso, mas há dias não só disse que o Sporting tinha decidido ir ao mercado em Janeiro como estava disposto "a pagar o que tiver de ser" para garantir as contratações desejadas. Tamanhos contra-sensos não jogam nada bem com o perfil de uma alto quadro do mundo financeiro. Por isso, era bom que Bettencourt explicasse direitinho onde e quando arranjou o dinheiro necessário. E porque não o conseguiu no início da época, em vez de somente agora, quando o campeonato já é uma miragem.
Benfica vs FC Porto, quem tem melhor psicólogo?
Desde logo porque Jesualdo Ferreira passou a não saber muito bem com o que contar do lado do adversário, ao contrário do que se verificaria se o Benfica se apresentasse na máxima força. Este efeito surpresa, mesmo que involuntário, pode condicionar a própria estratégia do técnico portista. Ao invés, esta contingência pode tornar-se numa arma suplementar para o Benfica, se utilizada de forma inteligente.
A consciência de que irá apresentar-se sem algumas das suas mais-valias pode fazer com que os jogadores do Benfica, designadamente os chamados de emergência, cerrem fileiras e se apresentem mais concentrados e determinados do que é habitual - e não é difícil encontrar exemplos disso. Da mesma forma, as opções limitadas no Benfica podem criar uma sensação de superioridade nos portistas, provocando-lhes excessiva desconcentração, que por vezes resulta numa factura pesada.
Claro que um bom trabalho psicológico tanto pode inflacionar a capacidade dos benfiquistas de reacção à adversidade, como resolver o excesso de confiança portista. Por isso, no domingo à noite também se irá assistir a um confronto mental, restando saber se o melhor psicólogo mora na Luz ou nas Antas.
Mas há dados factuais: o FC Porto é habitualmente mais forte mentalmente em duelos deste cariz (em causa poderá estar a liderança da liga, uma vez que o Braga joga hoje à noite em Paços de Ferreira); o Benfica tem mostrado uma força e uma competência que há muito não se lhe viam. As recentes dificuldades estão mais relacionadas com o maior conhecimento dos adversários do que com uma eventual crise.
Claro que não vai ser fácil disfarçar os efeitos da atormentada viagem ao Algarve, onde Jesus (talvez pela primeira vez na época) cometeu erros diversos na escolha das opções iniciais e nas mudanças posteriores. Foi criticado por ter colocado na posição "dez" Di María, que de facto é mais um "driblador" e um repentista do que um pensador do jogo, ao contrário de Felipe Menezes, cada vez mais visto como o substituto ideal de Aimar. Mas também é verdade que, noutros jogos, Di María até já funcionou razoavelmente naquelas funções. Menos razoável pareceu a saída de Fábio Coentrão, até porque nessa altura já tinha visto o cartão amarelo que o impede de defrontar o FC Porto. E começa também a ser preocupante a facilidade com que o Benfica, nos últimos tempos, vem sendo batido nos lances de bola parada defensivos. Mais grave, no entanto, talvez tenha sido a indisciplina comportamental que, em Olhão, revelou o Benfica, incapaz de lidar com as cascas de banana que os algarvios, involuntariamente ou não, lhe foram deixando pelo caminho. É nestas alturas que se vê também o estofo de uma equipa nas suas várias dimensões, e a do Benfica transpirou então imaturidade.
Mas olhemos para as ausências do Benfica. Na direita, pode não ter Ramires (e mesmo que tenha, surgirá condicionado e sem treino) nem o substituto natural, Rúben Amorim. Na esquerda, não tem Di María nem o seu "duplo", Coentrão. Ou seja, em ambos os casos deverá ter de optar por terceiras escolhas, o que faz diferença mesmo num plantel suculento como o do Benfica. Tão ou mais grave só seria se não pudesse contar com Javier Garcia, que só em Janeiro deverá ter uma alternativa credível. Mas, por outro lado, a lesão de Ramirez pode abrir brechas na habitual construção de jogo benfiquista, que começa a habituar-se à capacidade extraordinária do brasileiro para recuperar defensivamente e assim repor os equilíbrios (só isso tem permitido que, do outro lado, Di María funcione com maior liberdade).
Esse problema não se deverá colocar, em princípio, frente ao FC Porto. Porque as alternativas anunciadas para o miolo (César Peixoto na esquerda e Carlos Martins na direita, sendo que este não joga desde Outubro) não investem muito na profundidade e não perdem tanto a posição como Di María. Mas isso implica também que o Benfica tenha menos capacidade desequilibrante, que assim poderá ficar quase resumida a Aimar e Saviola, talvez a melhor sociedade da liga. Sem Di María e, em alternativa, Coentrão, o Benfica terá mais dificuldades em conseguir momentos de rotura. Olhando para o plantel e para as limitações actuais, o único jogador que poderia funcionar mais como extremo do que como médio interior seria Urreta, mas o uruguaio só tem 19 anos e ainda não jogou um único minuto na liga, não parecendo crível que Jesus arrisque a sua utilização. Ou seja, o técnico benfiquista até pode gastar os neurónios à procura de boas soluções, mas nunca será a mesma coisa...
No FC Porto, por seu lado, a dúvida será em torno da estratégia mais do que dos nomes. Porque, como noutras situações similares, o habitual 4x3x3 pode dar lugar a uma versão mais dinâmica e próxima do 4x4x2, o que até pode implicar que o FC Porto se apresente sem um avançado fixo. Nesse contexto, não seria de admirar a aposta em Guarin, porque a gripe e a falta de rotinas desaconselham o lançamento de Valeri. Depois, Jesualdo terá de escolher dois entre o trio formado por Hulk, Rodríguez e Varela, decisão nada fácil, mesmo que o português esteja cada vez mais em alta.
Garantido é que o FC Porto irá tentar rentabilizar, no ataque, a agressividade e a verticalidade de Fucile, o que torna ainda mais razoável a quase certeza de que Jesus vai voltar a encostar David Luiz à esquerda.
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