O sol da Califórnia nasceu na noite de Lisboa

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O projecto Little Joy nasceu em Lisboa: Fabrizio Moretti, baterista dos Strokes e um terço dos Little Joy, conheceu Rodrigo Amarante dos Los Hermanos, em 2006, no Lisboa Soundz; para além deles, há ela, Binki Shapiro

Fabrizio Moretti dos The Strokes e Rodrigo Amarante dos Los Hermanos encontraram-se em Lisboa, gravaram ao sol da Califórnia e vieram agradecer o projecto Little Joy à cidade que os juntou, na companhia de Binki Shapiro. "Não é bonito?" diz-nos Fabrizio. É sim senhor.

"Pois é, o sol da Califórnia nasceu numa noite de Lisboa" diz-nos às tantas, entre risos, Fabrizio Moretti, baterista dos The Strokes e um terço dos Little Joy, menção ao facto do embrião do projecto ter sido a noite em que conheceu Rodrigo Amarante dos Los Hermanos.

Foi em Lisboa, em 2006, no Festival Lisboa Soundz, onde os Strokes e os Los Hermanos tocaram. No final do concerto dos primeiros, o brasileiro foi aos bastidores para lhes transmitir que gostava do grupo e foi aí que o encontro se deu. "Foi uma noite incrível", recorda Fabrizio, a partir de Nova Iorque, onde os Little Joy tocaram na companhia de Devendra Banhart.

"Recordo-me que a minha bagagem tinha ficado num aeroporto qualquer, não tinha roupa nem nada, tiveram que me emprestar uma camisola para tocar e estava chateado com toda a situação. No final do concerto, nos bastidores, pensava retirar-me rapidamente para o hotel, quando dei por mim a falar com um brasileiro. Apresentou-se, disse que era músico e fazia parte dos Los Hermanos. Olhei para ele: ‘a sério? Adoro a vossa música, o meu irmão - que vive no Rio de Janeiro como a minha restante família - está sempre a falar de vocês e envia-me os discos'. A partir daí começamos a falar e nunca mais parámos. Bebemos cerveja e pairámos horas junto a rio, até de manhã. Acabou por ser uma noite inesquecível."

Um momento feliz

Fabrizio tem nacionalidade americana, mas nasceu no Brasil. Foi para Nova Iorque aos quatro anos. Fala bem português. "Quer dizer, mais ou menos." Só quando fala com regularidade em português com alguém é que consegue adaptar-se à língua.

Foi isso que aconteceu um ano depois de ter conhecido Rodrigo. Reencontraram-se em Los Angeles, onde Fabrizio vive há anos e onde o brasileiro participava nas gravações de "Smokey Rolls Down Thunder Canyon" de Devendra Banhart.

Na altura, Fabrizio estava de folga dos Strokes, a actriz Drew Barrymore já fazia parte da história, e era a cantora Binki Shapiro a sua nova namorada. "Saíamos os três juntos, bebíamos umas cervejas e a Binki insistia para criarmos umas canções. Tinha uma série de esboços já feitos e começamos a trabalhar neles sem grandes preocupações. Quando demos por nós percebemos que tínhamos um álbum concluído e resolvemos editá-lo."

Dito assim parece quase insolência. Mas ouvindo o álbum faz imenso sentido. É como se os The Strokes tivessem acampado numa praia do Rio, encontrado um cantor de bossa nova e feito um disco, descontraidamente, nessa mesma noite, com o fantasma de Nico pairando sob o céu estrelado.

É um disco desprendido, fazendo-nos participar na sua dinâmica ociosa. "Claro que o ambiente da Califórnia nos contaminou", diz, "é um disco que capta um momento feliz, sem dúvida." Há bossa nova, rock ensolarado, harmonias vocais, refrões pop anos 60, guitarras acústicas e derivações jamaicanas. É um disco que celebra as pequenas coisas da existência, cantado em inglês e português. A brincar, é capaz de ser o melhor projecto onde um dos membros dos Strokes já se viu envolvido.

Fabrizio ri-se com a sugestão, dizendo que o álbum recente do vocalista Julian Casablancas "é bom e muito ambicioso", mas logo de seguida retrata-se. "Claro que este é um projecto sério, já estamos a compor canções para um segundo álbum, mas os Strokes continuam a ser a minha banda - vamos regressar no próximo ano e temos estado a trabalhar também em material novo - e é preciso não esquecer que Rodrigo e Binki também têm outros projectos. Mas é verdade que nos damos bem, divertimo-nos e isso não se deve desperdiçar."

No disco, tocaram tudo o que havia para tocar. Fabrizio ocupou-se das guitarras, do piano, do baixo, da bateria, Binko de algumas vozes, guitarra e percussões e Rodrigo das vozes, guitarra, piano, baixo ou órgão. "É por isso que ao vivo é diferente, seria impossível tocarmos todos os instrumentos que as canções pedem", explica, "mas a essência de cada uma das canções mantém-se."

O concerto de Lisboa e três datas espanholas assinalaram o término da digressão dos Little Joy. Depois seguem-se mais aventuras com The Strokes, mas os próximos dias não os quer desperdiçar. Para Fabrizio, o festival constituirá uma oportunidade de conhecer Lisboa, e não esconde o entusiasmo. "Dessa primeira vez acabei por não conhecer a cidade. Rodrigo adora Portugal e tem aí muitos amigos. Agora estou ansioso por conhecer Lisboa, afinal foi aí que tudo começou, não é bonito?".

Beach House
Teatro Tivoli. Amanhã, às 22h15

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