Alguém pediu uma revolução? Korda
Alberto Korda tornou-se fotógrafo para conhecer belas mulheres mas é mundialmente famoso por causa do retrato de um homem, Che Guevara - sim, esse retrato em que estão a pensar. Uma grande exposição em Lisboa revela que não conhecíamos Korda tão bem assim. Kathleen Gomes
"Hoje os maridos e pais zelosos das mulheres belas de Havana vão dormir tranquilos. Alberto Korda morreu." Não é exagero: mesmo aos 72 anos, Korda fazia corar mulheres adultas. Morreu em Paris, de um enfarte, em Maio de 2001, e, notaram os amigos, nas circunstâncias em que sempre vivera: com um copo do melhor rum e uma jovem mulher ao seu lado.
Outubro de 2009. Um casal, amigo de longa data de Korda, discute a natureza do sedutor num aparthotel em Madrid.
José Figueroa - Korda era um playboy, um electrão livre. Tinha um automóvel desportivo - um MGA primeiro, depois um Porsche -, andava sempre vestido de caquis e sapatos de tipo americano, um lenço vermelho ao pescoço...
Cristina Vives - ... chapéus...
José Figueroa - ... no contexto da Revolução cubana, em que todos os militares andavam vestidos de verde-azeitona. Era mulherengo. Quer dizer, amava as mulheres.
Cristina Vives - Atenção: e era mulherengo. As duas coisas.
José Figueroa - Não era do tipo de ter amantes. Se estava numa relação, estava. Não tinha duas amantes, podia tê-lo feito. Isso seria um mulherengo para mim.
Cristina Vives - Bom, ele andava atrás das mulheres o tempo todo.
Esperavam o quê? Estoicismo e poesia? Alberto Korda é o autor da fotografia mais célebre de Che Guevara: um rosto duro a preto e branco, olhar desafiador, uma mistura de rebeldia e messianismo que se tornaria no emblema de todas as revoluções. Não é só a fotografia mais conhecida de Che, é um dos retratos mais reproduzidos à escala planetária, logo a seguir à Mona Lisa. A ironia é que Korda, amante de mulheres, é hoje mundialmente famoso por causa da imagem de um homem. Mas essa fotografia dificilmente teria existido se Korda não amasse as mulheres.
A exposição Korda Conhecido Desconhecido abre esta terça-feira na Cordoaria Nacional, em Lisboa, depois de ter gerado recordes de visitantes em Havana e Madrid. São cerca de 200 fotografias produzidas entre as décadas de 1950 e 1960, para acabar de vez com a ideia de que Korda é o autor de uma só imagem, a de Che, baptizada de Guerrilheiro Heróico. "O maior mito que persiste sobre o meu pai é que ele só é conhecido pela fotografia de Che e é visto como autor dessa única obra, quando fez fotografias tão boas ou melhores", diz, por email, Diana Díaz, a filha mais velha de Korda e herdeira da sua obra. "É verdade que é um grande retrato, mas também teve uma conjuntura sociopolítica que a projectou a nível internacional."
A ideia de revelar a obra para além da fotografia de Che começou quando Korda ainda era vivo, explica a comissária da exposição, a cubana Cristina Vives. A partir da década de 1970, Korda tornou-se um fotógrafo ultra-solicitado, viajando e expondo intensamente em mostras internacionais. Mas as imagens eram sempre sensivelmente as mesmas, "não passavam de 150, quando muito". Em Janeiro de 2001, o britânico Mark Sanders foi a Havana entrevistar Korda para a revista Another Magazine. Ele e Cristina concordaram: Korda precisava de um livro. Mas as intenções depressa esbarraram num sério obstáculo: Korda morreria quatro meses depois. Seguiu-se um longo processo de definição legal dos direitos da obra - cinco anos. Cristina resgatou a ideia e levou-a a Diana Díaz, filha de Korda, a quem não poupa elogios. "Diana foi um apoio fabuloso. Quando assume o papel de herdeira do espólio, a sua única preocupação foi: o que devo fazer para que a memória e a obra do m