Carga horária e salários de médicos cubanos "chocam" colegas portugueses

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Clínicos vindos da ilha de Fidel trabalham 64 horas por semana por um salário de mil euros mensais Paulo Ricca

A vinda de médicos cubanos para alguns centros de saúde do Sul do país está a provocar confusão no Alentejo. A equipa de clínicos portugueses que trabalha em Odemira diz ter sido surpreendida quando lhe foi revelada a carga horária dos cinco colegas vindos de Cuba ao abrigo de um acordo celebrado com o Estado português - 64 horas por semana.

Na reunião que se realizou em 30 de Setembro no Centro de Saúde de Odemira - e em que participaram médicos cubanos -, foi revelado que estes estão obrigados, por imposição contratual, a trabalhar 64 horas semanais (40 horas nas consultas e 24 horas na urgência), uma carga horária a que corresponde um salário mensal de mil euros. O Ministério da Saúde (MS) garante que os médicos cubanos ganham o mesmo e têm a mesma carga horária que os seus colegas portugueses. Também os clínicos portugueses podem trabalhar 24 horas extra por semana nas urgências, para além das 40 horas semanais, sublinha o MS.

Mas Pedro Souto, um dos médicos que estiveram presentes na reunião, diz que esta situação está a causar mal-estar "nos colegas portugueses". E adianta que vai expor a questão ao sindicato, porque está convencido de que uma carga horária destas "contraria" o Código de Trabalho - onde está estabelecido um regime de "40 horas de trabalho semanal e no máximo um bloco de 12 horas nas urgências". É isso que estabelece o Acordo Colectivo da Carreira Médica, celebrado no passado dia 23 de Setembro, afirma. Este acordo colectivo, retorque o MS, ainda não está em vigor.

Médicos são 44

Já o presidente do Conselho Distrital da Ordem dos Médicos, Pedro de Vasconcelos, lamenta que a Administração Regional de Saúde do Alentejo ainda não tivesse respondido às questões que colocou sobre o enquadramento e a competência profissional dos 44 cubanos contratados para o Sul do país. Como não dispõe de dados oficiais, não subscreve as informações veiculadas. Mas, "pelo que ouvimos dizer entre colegas médicos, [a situação dos clínicos cubanos] pouco menos será que escravatura".

Do salário mensal global de mil euros, cerca de 380 euros ficam na posse dos médicos cubanos, e só 38 euros é que são enviados para as suas famílias. O embaixador de Cuba em Portugal, Jorge Benitez, quando se deslocou a Odemira para a apresentação dos clínicos, garantiu que o seu país "não vai receber qualquer contrapartida por ceder estes profissionais".

Fazendo as contas com base na carga horária dos médicos cubanos face à contratação colectiva em vigor, estes deveriam receber um "salário mensal de seis mil euros", sustenta Pedro Souto. "Os médicos portugueses foram chutados do trabalho extraordinário", lamenta, exigindo à tutela contratos de trabalho "sérios" e que "não violem a lei".

Para além de garantir que "os médicos cubanos têm as mesmas condições contratuais que os portugueses", o MS lembra que, nos locais onde os cubanos estão agora a trabalhar, foram antes abertos concursos para a contratação de clínicos nacionais e "não apareceu ninguém interessado". Diz ainda que não ficou nada acordado com o Governo cubano quanto a uma eventual retenção de parte do salário dos clínicos cubanos. Uma fonte garantiu ao PÚBLICO que o salário dos cubanos (com as horas extra) ronda os 2500 a 3000 euros por mês.

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