Assim é "impossível ficar esclarecido" e votar

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Campanha do MMS: à procura de mais visibilidade na comunicação social Helder Olino

O dirigente do Movimento Mérito e Sociedade (MMS) Raul Esteves acredita que os meios de comunicação social acorreriam em força se alguém do seu partido "se pendurasse no 4.º andar de um edifício". Como esse tipo de espectáculo não corre nas veias de quem integra o MMS, optaram por entregar ao Supremo Tribunal Administrativo de Lisboa uma providência cautelar de suspensão das legislativas.

A igualdade de oportunidades e de tratamento das diversas candidaturas é imperativo legal e constitucional. "Todos os dias", porém, Raul Esteves vê "violar estes princípios do Estado de direito".

O MMS fez ontem campanha "no Porto, em Aveiro e em Lisboa". Ao final do dia, o dirigente imaginava-se, à noite, no sofá, a não encontrar qualquer referência sobre tais iniciativas nos noticiários dos diversos canais e a ficar a saber se José Sócrates "trazia ou não atacadores". "Não sendo possível [os partidos sem assento parlamentar] transmitirem a sua mensagem, é impossível o cidadão ficar devidamente esclarecido para exercer em consciência o seu direito de voto", diz.

Maria Augusta Monte Gomes, presidente do Partido Nova Democracia, também considera "escandalosa a forma como os pequenos partidos são relegados para segundo plano". "Só têm palco quando andam aí a dar facadas ou a cortar cabeças - e nem sempre. Que Deus os ajude e que essa providência cautelar tenha sucesso!"

Para o cabeça de lista do PCTP/MRPP, Garcia Pereira, esta é uma questão que não se resolve por métodos jurídicos, mas políticos e éticos: os cidadãos têm de perceber a "perversão da democracia", que faz com que "apenas cinco, e sobretudo duas", candidaturas apresentem as duas ideias. Tudo lhe parece inquinado: "A tentativa - a pretexto dos "critérios editoriais" ou outros quaisquer - de dar a conhecer apenas as propostas dos cinco que já estão no poder, e que são os responsáveis pela situação catastrófica em que nos encontramos, constitui uma fraude inaceitável e uma manobra com vista à eternização no poder dessas mesmas forças políticas".

Rui Marques, líder do Movimento Esperança Portugal (MEP), não põe em causa a "liberdade dos jornalistas decidirem o que é notícia". Julga, no entanto, que o critério usado não é jornalístico, é administrativo. "Quem tem assento parlamentar tem sempre cobertura, mesmo que não faça nada de interessante."

No início da campanha, o MEP até fez uma carta aberta aos jornalistas: "Aceitaríamos que existisse um boletim de voto em que os partidos com assento parlamentar surgissem em primeiro lugar, em letras maiúsculas e destacadas e os restantes partidos fossem remetidos para o verso do boletim de voto, em letra minúscula, quase invisível?"

"Critérios jornalísticos"

"O tratamento da cobertura de uma campanha, tal como qualquer outra matéria, tem de obedecer a critérios jornalísticos, e os princípios que norteiam a actividade jornalística são determinados pelos jornalistas", explica o director de informação da SIC, Alcides Vieira. A representatividade social dos partidos que se apresentam a escrutínio "não é igual, por isso, para saber qual deles deve ter mais ou menos espaço, tem de prevalecer o critério jornalístico, o qual deve ainda assentar na aferição do interesse público".

"Acho que os pequenos partidos podem ter alguma razão, mas também têm de ser realistas", reage a subdirectora de informação da Rádio Renascença (RR), Raquel Abecasis. A jornalista, especializada em política, lembra que não é apenas a dimensão do partido que determina o espaço noticioso. E dá o exemplo de Garcia Pereira, que, apesar de dirigir um pequeno partido, "é conhecido de todos".

Aludindo aos meios das próprias empresas de comunicação social, Raquel Abecasis recorda que nestas eleições há 15 candidaturas. "Não se pode andar atrás de todas. Mesmo que tivéssemos gente para desempenhar essa tarefa, nunca teríamos o espaço suficiente para divulgar tudo", salienta. É sempre preciso fazer escolhas.

"O critério é igual para grandes e pequenos: é a importância da notícia que determina o espaço concedido", afirma o subdirector do Correio da Manhã (CM), Eduardo Dâmaso. Naquele diário, "sempre que a actualidade o justifique, o espaço dos pequenos partidos pode ser fragmentado, não diminuído".

Mas como se faz?

Os partidos escusam-se a explicar como é que a ambicionada igualdade podia ser cumprida por completo. Colunas medidas a metro? Peças medidas ao minuto? Eduardo Dâmaso acredita que "não há necessidade de estabelecer quotas na imprensa para os partidos". Acha que "existem garantias de divulgação através dos órgãos de serviço público e até de privados".

Há quem nem preencha os espaços de tempo de antena atribuídos em televisões e em rádios. Raul Esteves culpa a lei do financiamento dos partidos, que deixa sem dinheiros públicos os que não alcançam representatividade na Assembleia da República.

Que esperar desta iniciativa do MMS? "Muito dificilmente esta providência cautelar vai levar a algum resultado e muito menos em tempo útil", prevê Garcia Pereira. "Embora seja evidente a violação reiterada do referido princípio da igualdade de tratamento e de oportunidades das diversas candidaturas", tem "as maiores dúvidas de que um qualquer tribunal tenha coragem para a decretar". Desde logo porque "todos os requisitos prévios servirão para que, muito provavelmente, não se chegue sequer a uma decisão de fundo da providência antes das eleições."

Nas últimas eleições presidenciais, por exemplo, havia seis candidaturas unipessoais. Garcia Pereira tentou uma acção para garantir a sua presença em debates televisivos. Só que "os tribunais escusaram-se a deliberar".

Raul Esteves não está tão descrente: "Nunca alguém interpôs uma providência cautelar destas. Seja o que for que vier a ser decidido, esperamos que crie jurisprudência".

Apesar das múltiplas tentativas, não foi ontem possível contactar a Entidade Reguladora da Comunicação Social e a Comissão Nacional de Eleições.

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