Romeu Runa e o colectivo

Foto
Romeu Runa

Romeu Runa, 30 anos, dança pela primeira vez numa peça de Alain Platel, pronto para tocar a utopia

"Olá, o meu nome é Romeu Runa, venho de Portugal e sou bailarino. Quero trabalhar contigo". As palavras, saídas de rompante depois de ver vsprs em Berlim, terão sido estas, mais memória menos facto, mas ficaram guardadas quase cinco meses até voltar a ver o espectáculo, já em Dusseldorf. Depois escreveu-lhe um e-mail. Do outro lado Alain Platel respondeu que não acreditava em audições, ter várias pessoas interessadas em trabalhar com ele mas acreditar mais em empatias, e que a melhor coisa que ele, Romeu, tinha a fazer era encontrar-se com ele.

Romeu Runa, 30 anos, bailarino e performer, ex-Ballet Gulbenkian e Prémio Revelação Ribeiro da Fonte 2003, habituado a trabalhar com Clara Andermatt, Miguel Moreira, Olga Roriz, Paulo Ribeiro, Rui Horta e Teatro Praga, meteu-se num comboio foi até Weimar, na Alemanha. "Quero trabalhar contigo", disse-lhe. Platel e Romeu sentaram-se, falaram de plantas, família e animais, e alguma coisa de dança. A "timidez" de Platel escondeu-se atrás de "umas coisas energéticas". Depois Romeu reviu vsprs, aprendeu uma frase da peça e, mais tarde, dançou-a para o coreógrafo num estúdio do Thèâtre de la Ville, já em Paris. "Houve uma comunicação total", diz-nos, entusiasmado, como se ainda estivesse em processo de criação. "Sinto isso de espectáculo para espectáculo. Ele dá-nos espaço para crescer dentro da peça, para continuarmos a criar", conta-nos, dias antes das apresentações em Lisboa. "Há espaço para o debate e não temos que nos identificar com tudo", revela.

No princípio dos ensaios,  meses depois do e-mail e há mais de ano e meio, Platel perguntou-lhes "se o grupo estava pronto para se sacrificar pelo indivíduo ou se era o contrário". Romeu percebeu que a linguagem do coreógrafo belga se ia construindo a partir dos impulsos criativos dos intérpretes, mas também das diferentes referências que podiam ajudar a fundamentar o movimento. "É uma peça muito politicamente correcta, cada um tem um solo e um dueto", mas "ele não está aberto a qualquer coisa, tem tudo que fazer sentido dentro da estrutura que ele já pensou, mas tu és responsável pelo que fazes". "Ele nunca falou em personagens mas sempre em personas", e a competição, aqui, "está mais no sugar o melhor do outro. E eles são todos tão bons". Platel não tem por hábito repetir integralmente os elencos, o que faz com que os processos criativos passem, também, por momentos de adaptação dos próprios intérpretes, "que para ele não são apenas isso, são também co-criadores". "É essencial viver a experiência colectiva", diz o intérprete. Uma experiência que deve passar para o público, "um grupo de indivíduos".

Romeu tem um solo, mais de uma hora depois do espectáculo começar que tem servido, não só para o público - "há sempre pessoas a sair nessa altura" -, mas para os próprios intérpretes, verificaram se "a comunicação está a acontecer". "Existe o corpo, o estado emocional e os silêncios", descreve-nos. E onde se percebe o que a peça tem para dar é nesses momentos "onde sentes que tocas a utopia". Uma utopia que tem sustentado cada uma das mais de cento e oitenta apresentações.
Das duas vezes em que não esteve presente para a apresentação do espectáculo, conta-nos, Platel mandou-lhes mensagens dizendo que não sabia o que era não estar com eles. Romeu Runa também não. A próxima peça do coreógrafo, com estreia para o início de 2010, também conta com o bailarino no elenco.

Sugerir correcção
Comentar