Eu quero ser como a doninha (zarolha)

A terceira fita da série "A Idade do Gelo" invoca com graça e inteligência o espírito anárquico dos velhos cartoons da Warner

Resumamos: uma preguiça que adopta três bebés dinossáurios esfomeados; uma mamã dinossáuria que não acha graça nenhuma à adopção; dois gambás palermas; uma mamute muito grávida e o seu cônjuge neurótico com a paternidade; um tigre dentes de sabre com palpitações; uma esquila pré-histórica que sabe fazer uso do seu poder de sedução; e, sobretudo sobretudo, uma doninha zarolha desvairada armada em Rambo da selva mesozóica, se é que isto tudo se passa no Mesozóico. O que não temos certeza, porque tudo isto pressupõe que na idade do gelo havia um oásis de dinossáurios escondido por baixo do gelo. E que os mamutes, tigres dentes de sabre, preguiças, gambás e doninhas tivessem um sentido de humor herdado das sitcoms americanas.


Mas não faz mal, porque a terceira (e, provavelmente, a melhor) animação da série da "Idade do Gelo" chuta para canto muito longínquo as animações tecnicamente impecáveis mas narrativamente preguiçosas da Dreamworks, reivindicando com graça e inteligência o espírito anárquico dos velhos cartoons da Warner. A culpa é em grande parte da tal doninha zarolha desvairada, a que o inglês Simon Pegg dá inspiradíssima voz ao nível do Génio de Robin Williams em "Aladino" ou do Rei Lemur de Sacha Baron Cohen no primeiro "Madagáscar". A culpa volta a ser também, em parte igualmente grande, da interminável perseguição da bolota fugidia pelo esquilo Scrat, aqui transformada numa das mais deliciosas guerras dos sexos a que assistimos recentemente (muita atenção ao hilariante tango da bolota). Mas é também de um guião engenhoso e esquizofrénico que consegue urdir em paralelo três percursos (Scrat e a bolota; Sid, a preguiça, e os dinossáurios; e a missão de salvamento de Sid pelos outros todos) com uma harmonia inesperada, construindo efectivamente uma narrativa que lá por ser consistente não abdica de alinhar piadas de sitcom com graça.

Ou, trocando por miúdos: a animação é espantosa (e já sabíamos que a Blue Sky de Chris Wedge não ficava atrás dos concorrentes desde "Robôs") mas "Idade do Gelo 3" tem mais história em dez minutos que a maior parte dos Dreamworks recentes na sua duração inteira. A tristeza de "Monstros e Aliens" e a preguiça de "Madagáscar 2", ao pé disto, são esforços amadores.

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