Supremo Tribunal russo ordena novo julgamento do assassínio de Anna Politkovskaia

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Processo vai ser repetido no mesmo tribunal Reuters/Alexander Basalayev

A absolvição fora dada em Fevereiro passado por unanimidade de um júri de 12 pessoas, em tribunal militar, ao fim de quase quatro meses de um muito controverso julgamento, sobre o qual foram feitas incontáveis restrições à divulgação pública. Não levou a qualquer conclusão sobre os motivos do crime nem sobre a identidade do alegado mandante do assassinato da jornalista, muito crítica do Kremlin e do regime do antigo Presidente e agora primeiro-ministro russo, Vladimir Putin.

O Supremo veio agora ordenar que o mesmo caso criminal volte a ser julgado, pelo mesmo tribunal militar. E com esta decisão dá aval ao recurso interposto pelo MInistério Público russo que requereu a anulação do veredicto, argumentando que ocorreram várias irregularidades durante o julgamento: os jurados foram mal informados e isso conduziu a um “veredicto impróprio”, foi alegado.

Anna Politkovskaia foi morta a 7 de Outubro de 2006 (dia do aniversário de Putin), à porta de casa, em Moscovo, com quatro tiros certeiros: três no peito e um na cabeça à queima-roupa, este último tido como assinatura dos assassinos contratados. Ao fim de dois anos e meio de investigações, as autoridades russas não conseguiram levar à barra do tribunal se não três homens: os dois irmãos tchetchenos Djabrail e Ibragim Makhmudov, com supostas ligações à máfia tchetchena, e o ex-polícia Serguei Khadjikurbanov, operacional até 2002 da Unidade moscovita de Combate ao Crime Organizado.

Os Makhmudov respondiam por acusações de terem mantido Politkovskaia sob vigilância até ao momento do assassinato e de terem conduzido ao local onde a jornalista foi morta o suposto autor dos disparos, irmão de ambos, Rustam Makhmudov – um suposto informador dos Serviços Federais de Segurança (FSB, agência sucessora do KGB), que permanece até hoje por capturar e sem quaisquer pistas sólidas sobre o seu paradeiro.

Face à declaração de não haver provas cabais para os dar como culpados, feita pelos jurados, o juiz emitiu então o veredicto de inocência. E o mesmo fez em relação a Khadjikurbanov, que a procuradoria-geral acusara de ser o organizador do assassinato. Igualmente ilibado neste julgamento foi o agente dos FSB Pavel Riaguzov, inicialmente suspeito de ter servido como intermediário na contratação dos assassinos, mas que acabou por ser formalmente arrolado ao processo apenas sob a acusação de “extorsão e abuso de poder” – e num outro caso, de espancamento de um preso, que remonta a 2002, em que era co-arguido com Khadjikurbanov.

Foi a agregação de Riaguzov ao processo, de resto, que permitiu às autoridades russas levar o caso a tribunal militar; e tentarem – por diversos meios –, mas sem sucesso, manter o processo totalmente à porta fechada, alegando a necessidade de “proteger segredos de Estado”.

“Caso indecifrável”

Desde a morte de Politkovskaia que as autoridades russas sempre foram justificando com a multiplicidade de pistas a investigar a incapacidade em trazerem à justiça o autor do assassinato – e mais ainda o seu mandante. Era, diziam, um “caso indecifrável”.


A jornalista desenvolvia profundos trabalhos de investigação denunciando as atrocidades cometidas pelo exército russo na segunda guerra da Tchetchénia – gerando ameaças explícitas por parte de militares russos – e a prática sistemática de tortura pelo governo pró-russo estabelecido naquela república do Cáucaso – “ganhando” em troca confessa antipatia por parte do chefe de Estado tchetcheno, Ramzan Kadirov, ex-combatente separatista, autoproclamado nos últimos anos “fã número um” de Putin.

Não menos presentes no trabalho de Politkovskaia estavam as críticas à sistematização de controlo da liberdade de imprensa na Rússia por parte do Kremlin, assim como denúncias jornalísticas de corrupção na Administração de Putin.

Os veredictos de inocência dados aos três suspeitos julgados foram desde sempre muito criticados pelos familiares e antigos colegas de trabalho de Politkovskaia no jornal "Novaia Gazeta". O director do diário – uma das já raríssimas publicações russas críticas ao Kremlin –, Serguei Sokolov, sustenta que a absolvição resultou não da ausência de provas contra os suspeitos, mas sim do facto que todo o processo de investigação das autoridades russas ter sido “deliberadamente mal conduzido”.

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