Laboratório português fez "listas" de genes suspeitos para detectar doenças

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O inovador método de diagnóstico genético é português e será exportado para os EUA e Espanha DR

É como se tivéssemos uma "lista de suspeitos" que nos ajuda a encontrar o gene culpado quando estamos perante quadros clínicos semelhantes. O Centro de Genética Clínica (CGC) está a usar uma tecnologia chamada chips de ADN que permite analisar vários genes com uma só amostra para pesquisar diferentes mutações. Testes mais rápidos, mais baratos, mais abrangentes e que podem ser usados para diagnóstico pré-natal.

Estes grupos de possíveis mutações capazes de explicar patologias com sinais ou sintomas semelhantes chamam-se painéis. Para já, há "painéis" desenhados para displasias ósseas, doenças metabólicas, trombofilias (doença e dose terapêutica), craniosinostoses. Este ano serão ainda lançados testes para a surdez e perda auditiva, obesidade, epilepsia, retinopatias e autismo. O CGC tem uma patente pendente nos EUA e na União Europeia para este novo método que vai exportar para Espanha e EUA.

A tecnologia dos microarrays ou chips de ADN que analisa o comportamento dos genes não é nova. Os arrays de expressão, por exemplo, usados nas investigações relacionadas com o cancro ajudando a detectar quais os genes activos, superactivos e silenciados através da medição de RNA (ácido ribonucleico). O CGC usa os arrays de mutação, apoiados no ADN. A inovação do primeiro laboratório privado de Genética Médica em Portugal está na organização destes testes de diagnóstico, diz a directora clínica, Purificação Tavares. Em vez dos testes convencionais que perante a suspeita de uma doença genética fazem a sequenciação de um gene inteiro em busca de uma mutação (um gene pode ter várias dezenas ou mesmo centenas de mutações), o laboratório propõe uma lista de possíveis patologias, causadas por diferentes mutações.

É uma ampla "lista de suspeitos" ainda que o clínico (no papel de detective), apoiado noutros meios de diagnóstico, possa chegar a um "presumível culpado". "Actualmente, perante quadros clínicos muito semelhantes, torna-se necessário pedir testes numa base de tentativa e erro. Com os arrays, conseguimos identificar qual é a patologia dentro de um painel", argumenta Purificação Tavares. Paula Rendeiro, a directora técnica do laboratório, faz a comparação: "Nos testes convencionais construímos um livro inteiro letra por letra, todo um gene. Este método permite procurar o que interessa. Vamos ao capítulo que queremos".

Assim, nota Purificação Tavares, "em vez de requisitar 5 ou 6 testes diferentes, o clínico poderá pedir apenas um teste", refere, acrescentando que "o principal impacto vai reflectir-se na redução dos custos e dos preços. No futuro haverá um painel para cada especialidade". O custo médio de um teste genético convencional é de 700 euros, mas pode ir até aos quatro mil quando se trata de sequenciar um gene com muitos fragmentos (há genes que têm sete outros - raros - mais de 100 fragmentos). Com o recurso aos chips de ADN o valor não deverá ultrapassar os 400 euros, assegura Purificação Tavares. Por outro lado, há ainda a questão do tempo. Um dos painéis agora propostos pelo CGC demoraria vários meses. Neste caso, o tempo de espera será entre uma e duas semanas. E quanto mais cedo se tiver um diagnóstico, mais cedo podemos iniciar a terapêutica ou a prevenção. Mas há limitações. A taxa de detecção destes testes está entre os 65 por cento e os 95 por cento (a taxa mais alta para algumas doenças metabólicas). Há, portanto, uma série de mutações num gene que podem não ser detectadas. Por outro lado, no caso da obesidade, epilepsia e autismo os testes deverão pesquisar sobretudo polimorfismos (susceptibilidades) e isso é ainda discutível na comunidade científica. Apoiados numa tecnologia chamada APEX (Arrayed Primer EXtension), uma empresa de biotecnologia (da Estónia) oferece uma resposta idêntica, tendo já painéis para a surdez hereditária.

a Todos os painéis propostos pelo Centro de Genética Clínica para doenças genéticas podem ser usados em diagnóstico pré-natal. E, também aqui, o CGC quis oferecer mais. Se, por um lado, será possível com indicação médica recorrer a um dos painéis, por outro, existe já um "pacote" chamado "pré-natal plus" que reúne algumas das outras patologias mais frequentes.

Quando há um risco de ter um bebé com anomalias cromossómicas como, por exemplo, a trissomia 21, pede-se um diagnóstico pré-natal. O teste convencional ao ADN fetal (a partir de vilosidades coriónicas ou líquido amniótico) abrange a detecção de aneuploidiais e o cariótipo, duas ferramentas que detectam as principais anomalias. Mas por que não saber mais com a mesma amostra? O CGC juntou um diagnóstico molecular de doenças metabólicas, um painel de síndromas associadas a atraso mental, a fibrose quística e a síndroma do X-frágil, quatro "alvos" que podem ser pedidos pelo obstetra e que representam um acréscimo total de 480 euros. O critério para a selecção teve, sobretudo, em conta o potencial para a aplicação de medidas preventivas, tratamento precoce ou cuidados de saúde melhorados. "Fazermos técnicas invasivas com algum risco e só sabermos o cariótipo e pouco mais é muito pouco. Muitos casais perguntam-nos: ai é só isso? Se pudermos, sobretudo quando há anomalias ecográficas, amplificar este leque, óptimo. Quando mais vier melhor e se for rotinado torna-se mais barato", comenta Eufémia Ribeiro, obstetra e presidente da Associação de Diagnóstico Pré-Natal. A especialista destaca ainda a importância do painel das trombofilias para "uma melhoria na medicina de reprodução e na qualidade de vida". "É fundamental ter algo para melhorar isto.É prevenção".

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