Dramaturgo Augusto Boal morre aos 78 anos

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A obra de Boal está traduzida em mais de 20 línguas e o The Guardian considerou-o tão importante como Brecht DR

Todos podemos fazer teatro. Todos podemos ser personagens das nossas próprias vidas. Era nisto que acreditava o dramaturgo brasileiro de ascendência portuguesa Augusto Boal, fundador do Teatro do Oprimido, que morreu sábado de madrugada, aos 78 anos, no Rio de Janeiro.

Embaixador da UNESCO para o teatro e nomeado em 2008 para o Prémio Nobel da Paz, Boal tinha uma leucemia e morreu de insuficiência respiratória no Hospital Samaritano.

Para os brasileiros e os amantes do teatro e da promoção da igualdade entre os homens, Boal "deixa uma marca que jamais será esquecida", afirmou o presidente brasileiro, Lula da Silva, para quem o dramaturgo era "o exemplo de um companheiro que dedicou a sua vida à transformação social por meio da arte".

Numa das últimas entrevistas que deu - à Carta Capital -, Boal defendia que, "hoje, todas as formas de expressão e comunicação estão nas mãos dos opressores". Na sua opinião, "o que a televisão oferece é um crime estético". Afirmava: "E ainda acham estranho que alguém saia matando quinze pessoas de uma só vez. O cérebro das pessoas está impregnado dessas imagens. As rádios também repetem o mesmo som o tempo todo. Sem falar no tecno, que desregula até marca-passo, e é pior que ouvir gente quebrando tijolo em construção. O que a gente quer, no Teatro do Oprimido, é lutar nestes três campos: palavra, imagem e som."

Augusto Boal nasceu no Rio de Janeiro em Março de 1931, filho de pai português. Formou-se em Química pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e na década de 1950, enquanto realizava estudos de doutoramento em Engenharia Química, na Universidade de Columbia, em Nova Iorque, estudou também dramaturgia na School of Dramatics Arts com John Gassner, professor de Tennessee Williams e de Arthur Miller.

No Teatro de Arena de São Paulo criou o Teatro do Oprimido, que lhe deu reconhecimento internacional por aliar arte dramática e acção social. "Todos os seres humanos são actores - porque actuam - e espectadores - porque observam. Somos todos espect-actores", afirmava. E este conceito ajuda as pessoas a inserirem-se na sociedade, acreditava.

Foi preso e durante a ditadura militar (de 1964 e 1985) esteve exilado em vários países e também em Portugal. Nos anos 70, trabalhou durante dois anos com A Barraca, onde assinou a peça Barraca Conta Tiradentes (1977) e escreveu com Chico Buarque Mulheres de Atenas, uma adaptação de Lisístrata, de Aristófanes.

Quando estava no exílio Chico Buarque dedicou-lhe a canção-carta Meu Caro Amigo ( 1976). "Meu caro amigo eu não pretendo provocar/ Nem atiçar suas saudades/Mas acontece que não posso me furtar/ A lhe contar as novidades/ Aqui na terra 'tão jogando futebol/ Tem muito samba, muito choro e rock'n' roll/ Uns dias chove, noutros dias bate sol/ Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta" ouviu-se ontem na homenagem que os amigos lhe fizeram.

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