Pedidos de indemnização por erro médico ascendem a mais de 29 milhões de euros

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Estimativa feita por médico refere que o número de doentes internados nos hospitais portugueses que morria devido a erros clínicos rondava os três mil por ano Paulo Ricca/PÚBLICO (arquivo)

Os pedidos de indemnização aos hospitais públicos em acções judiciais por assistência clínica alegadamente deficiente ultrapassaram os 29 milhões de euros, entre 2005 e 2007, contabiliza a Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS), numa avaliação preliminar sobre esta matéria. Um montante "não negligenciável", considera a inspecção, que pela primeira vez fez um inquérito sobre este tema, inquirindo os hospitais que nos últimos anos têm sido mais visados nas reclamações dos utentes.

Esta verba diz respeito a um total de 155 processos, a maior parte dos quais são de natureza administrativa, incluindo pedidos cíveis de indemnização.

Saber quantos destes casos resultaram em condenação é impossível, porque a maior parte ainda estará em fase de julgamento e este tipo de sentenças não está desagregada nas estatísticas judiciais. Mas basta ler as notícias dos jornais para se perceber que não é fácil estabelecer nexos de causalidade e responsabilizar profissionais e hospitais por falhas clínicas. As condenações "são em número reduzido", atesta Cristina Costa, chefe da Divisão de Segurança do Doente, da Direcção-Geral da Saúde (DGS).

As especialidades mais visadas nas acções judiciais contra os hospitais públicos aqui identificadas são a Obstetrícia, a Ortopedia, a Cirurgia Geral, a Ginecologia, a Oftalmologia e a Medicina Interna. E os estabelecimentos mais demandados situam-se sobretudo na faixa litoral urbana, com destaque para hospitais de Coimbra, Setúbal e Lisboa.

Mortes podiam ser evitadas

Percebe-se também que só uma minoria dos hospitais (7,58 por cento) detém seguros de responsabilidade profissional.

O inquérito da IGAS pretendeu ainda monitorizar o erro médico em 68 hospitais do Serviço Nacional de Saúde. E as conclusões não são animadoras: mais de metade dos estabelecimentos admitiu não ter protocolos escritos de prevenção de erros médicos e só um terço disse possuir sistemas informatizados de alerta e prevenção de riscos.

A problemática do erro médico (fenómeno frequente e inevitável e que é diferente da negligência, em que há uma violação das regras e deficiente prestação de cuidados) está estudada e é devidamente monitorizada em vários países, mas em Portugal não existem dados, apenas estimativas. Há cinco anos, o médico José Fragata, no livro Erro em Medicina, escrito em co-autoria com Luís Martins, estimava que o número de doentes internados nos hospitais portugueses que morria devido a erros clínicos deveria rondar os três mil por ano, extrapolando a partir das estatísticas internacionais. Mais de metade destes erros poderia ser evitada, acentuava então.

Em Portugal, a este nível, ainda há um grande caminho a percorrer: num diagnóstico nacional da situação feito em 2008 pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), a que responderam 70 hospitais, apenas 20 afirmavam ter programas de gestão de risco clínico e segurança do doente. A DGS acaba, aliás, de criar a Divisão de Segurança do Doente, que vai operacionalizar um programa que promoverá a notificação de erros clínicos nas unidades de saúde, previsivelmente até ao final deste ano, adianta Cristina Costa, chefe do departamento. Cristina Costa destaca a importância de programas de prevenção do erro médico, notando que o Conselho da Europa recomendou a todos os países que organizassem este tipo de sistemas, mas de maneira a não penalizar os profissionais de saúde. "O enfoque deve ser posto no sistema e não no profissional", frisa.

A IGAS destaca as limitações desta avaliação e defende que o trabalho deve ser aprofundado com a maior brevidade possível.

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