Torne-se perito

Improvisar seis horas por dia com La Fura dels Baus

Work in Progress 0.9 é uma residência artística coordenada pela companhia catalã La Fura dels Baus. Durante duas semanas, 21 jovens exploraram uma nova linguagem. O resultado
é apresentado hoje e amanhã na Biblioteca de Santa Maria da Feira. Fotos de Adriano Miranda

a O palhaço maléfico vai raptar a bailarina numa caixa de música. O seu olhar é perverso e há ainda muito mal por fazer. Uma menina doce arranca pétalas de uma flor e seduz três colegas para um ritual de purificação, depois de se desembaraçarem das capas negras que lhe cobrem o corpo."Tentem sentir a luz", diz Jürgen Müller, um dos directores artísticos da companhia catalã La Fura dels Baus, na véspera do ensaio geral. Olhos azuis compenetrados, chapéu que não sai da cabeça. "A criação dura até ao último momento", avisa.
Müller orienta 21 jovens das três escolas secundárias do concelho de Santa Maria da Feira, sem qualquer experiência profissional em teatro, numa residência artística de duas semanas. Seis horas por dia. A peça baseia-se no Memorial do Convento, de José Saramago. "Estamos a trabalhar conceitos de Saramago de uma forma abstracta", explica Müller. "Improvisamos sobre esses conceitos."
Duas semanas exigentes, com liberdade para criar. "Precisava mesmo desta experiência", diz Sara Freitas, 17 anos, com um fato de palhaço vestido. "É uma experiência única, adquirimos novos conhecimentos." A exigência aumenta a cada hora e, se não se aguenta, o melhor é sair. Diogo Dias, 18 anos, não larga a folha A4 para registar todas as ideias do grupo. "Estamos a tentar criar uma coisa dinâmica. Fazemos o máximo de propostas para a peça, apresentamo-las e até agora passou quase tudo", garante. Maria João, de 16 anos, admite que começa a sentir medo: "Estou a gostar, mas estou com receio do dia da apresentação." As colegas dizem-lhe que vai correr tudo bem. "Vamos transmitir o amor universal, em que todos podem ser um só corpo", explica Patrícia Freitas, 16 anos. Cátia Rebelo, três anos mais velha, admite: "A primeira vez que vi o trabalho dos La Fura fiquei chocada. Mas esta experiência está a ser muito boa, conseguimos pôr a criatividade cá para fora."
Os exercícios da primeira semana mexeram com o corpo e com a alma. Pintaram-se com barro e criaram "uma célula" para respirarem todos ao mesmo tempo. Abraçaram árvores de um bosque e caminharam pela mata de olhos fechados e vestidos de branco. Encarnaram o papel de um cão e do seu dono, pegaram numa barra de ferro para bater em bidões.
Müller trata os jovens estudantes como profissionais e investe na "despersonalização". Sem redes. "Eles não estão num palco protegido", lembra. Há interacção com o público, vídeo, música e luz, numa combinação recorrente nos espectáculos dos La Fura, companhia que o público português conhece bem de criações como Ombra e XXX. "O que depois se vê é uma amostra do que foi trabalhado e que nasceu da cabeça destes jovens." O processo é tão valorizado como o resultado final.
Müller revela que é um desafio trabalhar com uma faixa etária abaixo dos 20 anos. "Há muitas hormonas, novos mundos pela frente e isso influencia a criação."
O amor, a violência, o outro, a mudança. Quatro cenas, 45 minutos, três espaços. O resultado é apresentado hoje e amanhã na Biblioteca da Feira, a partir das 19h30.
A residência faz parte do programa do Centro de Criação para o Teatro e Artes de Rua de Santa Maria da Feira. La Fura é uma das companhias residentes do centro e já tem marcada a apresentação de Imperium (28 a 30 de Maio) no Imaginarius, o festival de teatro de rua da Feira. Em Outubro, Müller volta a pegar no Work in Progress 0.9. Sara Dias Oliveira
Patrícia Freitas, 16 anos. Cátia Rebelo, de 19 anos, confessa: "A primeira vez que vi o trabalho dos La Fura fiquei chocada. Mas esta experiência está a ser muito boa, conseguimos colocar a criatividade cá fora".
Os exercícios da primeira semana mexeram com o corpo e com a alma. Pintaram o corpo com barro desfeito e criaram uma célula para respirarem todos ao mesmo tempo. Abraçaram árvores de um bosque e caminharam pela mata de olhos fechados e vestidos de branco. Encarnaram o papel de um cão e do seu dono. Pegaram numa barra de ferro para bater com toda a força em bidões. Müller trata os jovens como profissionais e investe na "despersonalização". Sem redes. "Eles não estão num palco protegido". Há interacção com o público, vídeo, música, luz, ao jeito de La Fura. "O que depois se vê é uma amostra do que foi trabalhado e que nasceu da cabeça destes jovens". O antes é tão valorizado como o resultado final. Müller revela que é um desafio trabalhar com uma faixa etária abaixo dos 20 anos. "Há muitas hormonas, novos mundos pela frente e isso, sem dúvida, influi na criação".
O amor, a violência, o outro, a mudança. Quatro cenas, 45 minutos, três espaços. O resultado é apresentado hoje e amanhã na Biblioteca da Feira, a partir das 19h30. A residência insere-se na filosofia do Centro de Criação para o Teatro e Artes de Rua de Santa Maria da Feira, que tem vindo a investir em incubações artísticas. La Fura é uma das companhias residentes desse centro e já marcou na agenda a apresentação de Imperium de 28 a 30 de Maio no Imaginarius - Festival Internacional de Teatro de Rua da Feira. Em Outubro, Müller volta a pegar no Work in Progress 0.9. Sara Dias Oliveira

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