A Índia será o último país convidado, depois é a vez das cidades

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Este ano, com a Índia como convidads, põe-se fim a uma etapa histórica: a dos países convidados. Em 2010, em vez de um país, uma cidade: Los Angeles

Houve um tempo em que a Arco fazia das suas secções especiais de comissariado bandeira de individualidade. Foi enquanto a Espanha não teve um verdadeiro mercado, enquanto uma feira de arte contemporânea só parecia possível num ambiente de festa que seduzisse o grande público nacional e qualquer coisa diferente para oferecer aos visitantes internacionais, para lá daquilo que tinham noutras feiras, noutros países. O grande público nacional continua a acorrer à feira e, ontem, centenas de estudantes a entupir os stands expositivos anunciavam já as grandes enchentes de sábado e domingo. Mas a Arco está a mudar. Sentiu-se na última edição e, este ano, a mudança parece definitiva.

O anúncio está feito. Em 2009, com a Índia, põe-se fim a uma etapa histórica: a dos países convidados. Numa longa lista em que Portugal marcou vez há já onze anos, houve panoramas sobre a arte de países como a Inglaterra, a Áustria, o México e a Coreia; em 2008, chegada a vez do Brasil, Lourdes Fernández, sucessora de Rosina Gómez-Baeza, directora histórica da feira, testou um modelo diferente: em vez de dois pavilhões - em que o programa geral de galerias se cruzava com os projectos especiais de comissariado, como o do país convidado -, dois pavilhões e meio, com todas as galerias de norte a sul do Brasil num segundo andar, onde era preciso procurar para as encontrar e onde a montagem, em estilo de grande colectiva, quase não permitia perceber que artista estava com que galeria. O modelo não agradou, sobretudo às galerias brasileiras, afinal convidadas de honra. Este ano, com a Índia no mesmo papel, encontrou-se novo modelo: três pavilhões, em vez de dois, com o país convidado, mais acessível ao público, mas claramente separado do programa geral, onde se procura o perfil de uma feira mais dedicada a profissionais, mais puramente focada nos negócios.

Os pavilhões 8 e 10 do Parque Ferial Juan Carlos para o programa geral, onde, ao longo dos últimos dois dias, dedicados a convidados (coleccionadores e imprensa), os galeristas esperavam para ver em que se traduz uma primeira edição de Arco em época de crise e reajuste geral de mercado, identificando de passagem compradores como o conhecido arquitecto Normand Foster e directores de museus que se comprometeram a fazer compras na Arco, de forma a não deixar cair a sustentabilidade do sector. Primeiros balanços prévios, entre hoje e amanhã, à espera de últimas reservas. Mas, e contrariamente às piores expectativas, pelo menos no que toca à Índia, mais ao fundo, no Pavilhão 6, há indicadores positivos.

"Viemos com expectativas baixas, dado o actual contexto, mas temo-nos sentido muito bem acolhidos e as vendas também já foram boas", dizia ontem Sharm Ishta, no stand da galeria Bodhi Art, de Bombaim. Esta galeria optou por apresentar apenas trabalhos de um dos seus nomes em grande ascensão: a artista Shilpa Gupta, com trabalhos de instalação multimédia, um grande néon e várias telas, retratos de jovens indianas aparentemente desconfortáveis nas suas roupas ocidentais. De Shilpa Gupta venderam já cinco peças com valores à volta dos 25 mil euros. E a mensagem repete-se em galerias com outros nomes conhecidos, que dizem ter pessoas à procura desses artistas em concreto - é, por exemplo, o caso de Jitish Kallat. Mas mesmo numa galeria com nomes menos conhecidos no Ocidente, como a Mirchandani & Steinruecke, a atitude é positiva. "Tem havido muito interesse e curiosidade, não vendemos muito, mas pelo menos as coisas não estão paradas", diz a galerista Ranjana Steinruecke. Steinruecke vendeu apenas dois trabalhos, duas grandes telas, uma de Manish Nai, a sete mil euros, e outra de Kamishka Rajá, a 25 mil. "Pelo interesse que despertámos acho que noutro momento de mercado teríamos vendido muito mais. Mas foi um início, estamos contentes por ter vindo", diz a galerista.

Mas, apesar do aparente optimismo, a presença da Índia não é fulgurante. Há quem aponte o actual momento de crise como motivo e quem fale nos elevados custos de deslocação - seja qual for a razão, certo é que, apesar de estar a viver um momento raro de projecção internacional, com autores mais afirmados a atingir valores multimilionários em leilão e toda uma geração de novos artistas um pouco por todo o lado em bienais, exposições colectivas e individuais, a Índia tem em Madrid uma presença mais pobre do que seria de esperar.

Nem o ambiente de festa e aposta em grande que caracterizou, por exemplo, a presença mexicana - com um panorama comparativamente vibrante e multifacetado, peças especificamente feitas para a feira e até a presença emblemática da pintura As Duas Fridas, que raramente sai do México -, nem uma opção estratégica como a da Inglaterra, que à sua época desiludiu tudo e todos ao decidir deixar em casa a sua por então explosiva Young British Art de nomes como Sarah Lucas e Damien Hirst, já na altura com um mercado fulgurante, propondo, em vez deles, nomes praticamente desconhecidos.

Da Índia, menos escultura e instalação, mais pintura, desenho e fotografia, regra geral trabalhos de formatos médios. Mas, mesmo assim, de stand em stand, trabalhos de alguns dos nomes fortes de uma cena artística que alguns olhares familiarizados dizem ser hoje tão vibrante quanto a cena britânica da década de 1990.

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