Tom Cruise, missão (im)possível

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"Aqui está um tipo que trabalhou sob uma tremenda pressão e que, ainda assim, conseguiu ser absolutamente claro e lúcido quanto às suas escolhas e tentar continuar e fazer força para seguir em frente". Podia ser uma frase de Tom Cruise sobre o seu Ethan Hunt de "Missão: Impossível", ou sobre o seu assassino grisalho de "Colateral", ou sobre Jerry Maguire. Mas Cruise está a falar do coronel Claus von Stauffenberg, o militar que encabeçou uma conspiração para assassinar Hitler no final da II Guerra.

É a mais recente personagem de Cruise, que ontem chegou às salas americanas com pala no olho e uniforme militar alemão. As reacções ao filme realizado por Bryan Singer foram mistas, mas nunca entusiasmadas. Um filme "mais ou menos", com baixas expectativas em relação às bilheteira, e "um bom filme" que deve ter um sucesso modesto, pelos olhos da "Variety" e da "Hollywood Reporter". Mas, acrescenta a última, "se a carreira de Cruise é vista como estando momentaneamente parada, 'Valquíria' não é o choque eléctrico que ele procura para a pôr novamente a andar".

Samurai, veterano do Vietname, barman, piloto da NASCAR, jogador de bilhar. No cinema Cruise escolhe ser gente com "drive", com o motor pelo menos em quarta velocidade. Mas porque é que a sua carreira pode estar em jogo? "Valquíria", que conta a história do grupo de homens que a 20 de Julho de 1944 encetou um plano para matar o Führer, é a segunda etapa da viagem arriscada em que embarcou para reformar a United Artists (UA). A investida levou ao seu segundo divórcio mais mediático - a sócia de sempre, Paula Wagner, abandonou-o e à UA após o fracasso de "Peões em Jogo", o primeiro projecto do estúdio renovado.

É actor há 27 anos e produtor há 12. A produção ficou-lhe bem enquanto a actuação lhe corria melhor. Mas navega em águas agitadas por vagas de má publicidade e mesmo a actividade de produção está diminuída desde a saída de Wagner. A sua imagem pública já foi a do actor incansável que filma as suas cenas de acção, já foi a do jovem "sex-symbol" e também já existiu como a metade mais poderosa de um casal de sonho de Hollywood.

Quando ele e Nicole Kidman eram grandes, eram mesmo grandes, como foram Brad Pitt e Jennifer Aniston, como o são Brad Pitt e Angelina Jolie. Pitt veio a seguir ao Cruise de "Cocktail" (1988) e de "Negócio Arriscado" (1983), filme ao qual podemos recuar para perceber o que Cruise tinha: "all american boy", sorriso vencedor e centelha no olho. Mas hoje Pitt só é suplantado em poder, de acordo com a lista das 100 celebridades mais poderosas da "Forbes", por Angelina (3ª) e Johnny Depp (6º). Só tem esses dois actores à frente, surge em 10º lugar e Cruise apenas em 31º, depois de, há dois anos, ter liderado a lista. O que aconteceu?

O tempo e os modos

Nas televisões passa um anúncio com a modelo Heidi Klum e outra versão protagonizada por atletas como Kobe Bryant ou Michael Phelps, todos a emular um momento Cruise, a sua dança de meias e camisa branca em "Negócio Arriscado". Publicitam um videojogo. Mas poucos membros do público-alvo da geração PlayStation reconhecem este momento seminal. Ligados à Internet, conhecem Cruise como Ethan Hunt, mas mais ainda como o tipo aos saltos no sofá de Oprah.

Não é só o tempo, são os modos. Cruise está ainda a tentar sacudir uma certa má imagem e torná-la outra. Nascida entre a entrevista irritada com Matt Lauer na TV americana (2004) e o ataque de cientologista anti-psicoterapia a Brooke Shields, a nova imagem do actor de 46 anos é um misto de fanatismo religioso, loucura amorosa, resultados menos bons nas bilheteiras e o inevitável gozo que deu origem ao site tomcruiseisnutts.com (entretanto descontinuado e com Cruise agora ao leme da sua própria nova página na web).
"Valquíria" é então o projecto de 53 milhões de euros de que tudo pode depender. As mudanças de data de estreia, a crítica pouco convencida e os problemas na rodagem na Alemanha - com figurantes, com a Cientologia... - só vieram cobrir de maus augúrios a já de si difícil estreia do filme.

O ano não foi todo mau para ele. No Verão, com "Tropic Thunder" e o seu gozo peludo, suado e excessivo do que é hoje um patrão de Hollywood, ganhou direito a uma nomeação para os Globos. "Valquíria" é a hipótese de provar não que é actor multiregistos, mas que ainda é protagonista. Até há um punhado de anos era capaz de carregar um filme e de levar dezenas de milhões ao cinema. Ainda o é?
Interessa-se por histórias, diz ele, e não gosta da ideia de ser refém dos números do fim-de-semana de estreia. É que são eles que medem essa "star quality" que arrasta multidões - ou arrasa quarteirões, como no termo "blockbuster", de que o seu nome já foi sinónimo. Não havia essas preocupações há 25 anos e talvez mesmo nos tempos do primeiro "Missão: Impossível" (1996) não pensasse assim. Mas a indústria mudou.

Segunda-feira saberemos o que o futuro ditado pelo "box-office" reserva para Tom Cruise.

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