Rui Reininho

Para a sua estreia a solo em disco, Rui Reininho escolheu como produtor Armando Teixeira (homem dos Balla, igualmente conhecido pelo projecto Bulllet), o que à partida implicaria um certo cuidado com o som e algum pendor lounge - a hipótese confirma-se, já que é esse som tratado, de veludo, que funciona como denominador comum a um disco heterogéneo, de pop (na maior parte dos casos) inventiva mas que não rejeita ser imediata.

A heterogeneidade do disco deve-se ao elevado número de compositores (dez) que dão uma ajuda, incluindo o próprio Teixeira (que assina quatro temas). A abrir temos um curioso e arabizado instrumental ("El Al", com nítida marca de Teixeira). Segue-se "Morremos a rir" (escrito por Slimmy): feita de toalhas de órgãos devedores dos Ultravox, tem um refrão tão pop que se fica na dúvida se gostar disto implica ter mau gosto - não é uma grande canção, mas quando apanha um tipo desprevenido é cantarolável. Com "O estranho caso do amante preguiçoso" regressa-se ao tom "cool" da pena de Teixeira e aos sons escolhidos a dedo (incluindo metais e órgãos vintage), com um refrão melodicamente irrepreensível. A versão de "Bem bom" das Doce abre com um cravo que lhe dá um toque de pop francesa dos anos 50 que cai bem (Sylvie Vartan adoraria isto). "Lados B" (de JP Coimbra, dos Mesa) parece uma versão pop dos Suicide, mas falta-lhe garra, e "Faz parte do meu show" (versão de Cazuza) joga no mesmo campeonato da outra versão, só que não é tão conseguida. O melhor do disco está em três canções: "Dr Optimista" (novamente de Teixeira) é uma revisão da pop new wave (sintetizadores, guitarrinhas picadas) para os dias de hoje, está cheia de balanço e tinha lugar no cânone dos GNR; "Turbina e Moça" (de New Max, dos Expensive Soul) idem; e "Laika Virgem" (de Alexandre Soares) é uma grande canção de pop pouco óbvia, uma espécie de protobalada desafinada com piano martelado. No capítulo das boas canções estranhas há ainda "Yoko Mono" (de Paulo Furtado), espécie de western digital, e "Al Faquir" (novamente Teixeira), regresso aos tons árabes e lounge, com palmas, campainhas, sitar e trompete. Sobram "Triste S" (de Margarida Pinto), com piano demasiado delicado, e "Morgana Penélope", de Rodrigo Leão, cheia de cordas e arranjos - Reininho está à vontade, mas sem espantar. Fica um bom disco, com tiros ao lado e outros no alvo, uma manta cujo defeito é ter demasiados retalhos. Mas Reininho só ganharia em disparar em menos direcções, porque bom gosto e carisma a dar voz tem que sobre.

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