Torne-se perito

Triagem de resíduos de cemitérios separa sete toneladas de flores por dia

Empresa que trata do lixo de oito municípios da zona do Porto transforma flores em adubo. Em Lisboa, não há separação específica e o destino é o aterro ou a incineração

a É difícil acreditar nisso - sobretudo hoje, que é dia de homenagear os mortos. Mas as flores também são lixo. E não é pouco. Num dia normal, seis a sete camiões carregando resíduos verdes dos cemitérios entram nas instalações de Ermesinde da Lipor, a empresa que gere os lixos da região do Porto. Ali se encontra o que talvez seja o único - senão o maior - sistema de triagem de flores de cemitérios existente no país. Elas chegam misturadas com plásticos, velas, celofane, arames, pedras e até lixo normal. E saem prontas para ser transformadas em adubo, na central de compostagem.
No ano passado, cerca de 1800 toneladas de flores tiveram esse destino - nada menos do que sete toneladas por dia útil, em média. Isto equivale a dizer que os 47 cemitérios servidos por este sistema deitam fora quase cinco quilos de flores por minuto.
"São quantidades de que as pessoas não tem noção", afirma Susana Lopes, responsável na Lipor pelos projectos de valorização de resíduos orgânicos.
O projecto de triagem dos resíduos de cemitérios foi lançado em 2004, justamente porque as flores estavam a revelar-se um problema. A central de incineração da Lipor não as aceitava, porque vinham com muita humidade. Depositá-las em aterro seria a última alternativa. A compostagem seria a melhor solução, mas exigia uma linha de triagem, que foi montada ao canto de um enorme pavilhão em Ermesinde.
"Isto não pode acumular"
É ali que o funcionário Fernando Rocha mantém debaixo de olho os montes de resíduos dos cemitérios que são despejados no pátio pelos camiões. "Isto não pode ficar acumulado, a gente tem sempre de mexer com ele", afirma.
A sua função é movimentar, com uma máquina, as pilhas de flores, para retardar a sua degradação, enquanto o lixo não é triado. "Quando vem com muita humidade, começa logo o caos", diz Fernando Rocha.
Esta altura do ano é a mais problemática. Chegam a ser tratadas 11 toneladas de flores por dia.
Nos montes depositados no pátio não há só flores. Uma equipa de oito pessoas separa manualmente tudo o que não interessa à compostagem. Alguns materiais, como plástico e o metal dos suportes das velas, e a sua própria cera, podem ser reciclados. Mas somam apenas 1,5 por cento do total de resíduos que entram.
Uma fracção ainda menor vai para aterro - sobretudo pedras e até bocados de lápides. Cerca de 30 por cento são rejeitados, como embalagens de papel e celofane, cujo destino é a incineração. Dois terços são os resíduos verdes tratáveis por compostagem.
Uma vez ou outra, a Lipor vê-se obrigada a devolver cargas ditas "não conformes", por exemplo, restos de exumações, misturados aos resíduos verdes. Também chegam flores de plástico e os funcionários já conhecem a geografia da sua utilização. São mais comuns nos cemitérios urbanos, mais para o interior. "Dos cemitérios junto ao mar, vêm cargas enormes de flores frescas", diz Susana Lopes.
A quantidade de resíduos verdes nos cemitérios também está relacionada com a sua antiguidade. "Os mais novos têm menos produção de flores", avalia Susana Lopes. Neles, muitas vezes há apenas um pequeno jarro à frente das campas.
Dos oito concelhos servidos pela Lipor, apenas Vila do Conde ainda não aderiu à recolha selectiva dos resíduos verdes de cemitérios. No ano passado, a quantidade entregue à Lipor pelos sete outros concelhos - Porto, Espinho, Gondomar, Maia, Matosinhos, Póvoa de Varzim e Valongo - representou nove por cento de todos os resíduos biodegradáveis tratados pela Lipor e pouco mais de 0,5 por cento das 500.000 toneladas de lixo total produzido região. É uma gota no oceano, mas não desprezível, segundo Susana Lopes: "Sete toneladas de flores por dia é muita coisa".

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