Quem envenenou o chefe do Hezbollah?

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Sayyed Hassan Nasrallah esteve em “condição crítica” Charif Karim/Reuters

O xeque Sayyed Hassan Nasrallah, o líder do movimento xiita libanês Hezbollah, foi envenenado, na semana passada, com um “químico altamente tóxico”. Esteve vários dias em “condição crítica” e só sobreviveu porque uma equipa de 15 médicos iranianos acorreu a Beirute para o salvar. O caso foi revelado pelo site iraquiano Almalaf, citando “fontes diplomáticas ocidentais”, e os três principais diários israelitas noticiaram-no, até porque as suspeitas recaíram, uma vez mais, sobre “o longo braço da Mossad”.

O estado do homem que transformou o Partido de Deus numa poderosa máquina militar era tão grave que os médicos, chegados à capital libanesa às 23h00 locais de domingo num “avião militar especial”, ponderaram enviá-lo para Teerão. Conseguiram estabilizá-lo mas ainda se encontra “muito fragilizado”.

A origem do químico poderá indicar quem estará por detrás desta alegada tentativa de assassínio, embora as fontes do até agora desconhecido Almalaf não tenham dúvidas de que se tratou de uma operação da principal agência de espionagem de Israel. O site israelita Arutz Sheva adianta, por seu turno, que está a ser efectuada uma investigação para identificar quem visitou Nasrallah antes de ele ter adoecido, não sendo de excluir que “dissidentes do Hezbollah” tenham tentado matar o líder. Embora desmentida pelo movimento pró-iraniano como “uma fabricação”, a notícia foi publicada também pelo jornal “Khoursid”, em Teerão..

Um dirigente do Hezbollah não identificado admitiu ao Almalaf não ver o xeque “há uma semana”, mas assegurou que ele “está de boa saúde”. Certo é que estas informações surgem dias depois de outras, igualmente desmentidas pelo grupo, dando conta que Safi al-Din, presidente do conselho executivo e primo de Nasrallah, já foi escolhido para sucessor “se os sionistas o assassinarem”, como fizeram com o predecessor do xeque do turbante negro, Abbas Al-Moussawi, em 1992.

Nasrallah, segundo o jornal “As-Safir”, de Beirute, já havia escapado a um atentado, logo após o fim da Segunda Guerra do Líbano com Israel, no Verão de 2006. Os conspiradores pertenceriam a uma “célula palestiniana-libanesa”, que foi desmantelada pelos serviços secretos do País do Cedro.

Guerrilha psicológica

Meir Javendanfar, um reputado especialista em assuntos iranianos, escreve no seu blogue Middle East Analyst (http://middleeastanalyst.com/) que a notícia do envenenamento de Nasrallah pela Mossad “pode bem ser verdadeira”, tanto mais que, em Israel, o primeiro a revelá-la foi Yoav Stern, um jornalista do “H’araetz” que é “fluente em árabe e um excelente profissional no que diz respeito à credibilidade das suas fontes”.


Em todo o caso, salienta, esta história deve também ser lida no contexto de uma “guerra de guerrilha psicológica” entre a República Islâmica e o Estado judaico. Um exemplo: um dia destes a imprensa iraniana noticiou que o chefe da Mossad, Meir Dagan, tinha sido assassinado em Amã, capital da Jordânia. Citava um blogue em Montreal (Canadá) chamado Filka Israel, que pertence à comunidade Blogspot. Posteriormente, considerou a notícia falsa. Quanto a Nasrallah, “poderá ser o mesmo jogo”, observou Javendanfar. “É possível que os iranianos sintam que estavam a ser tramados pelos israelitas na história do assassínio de Dagan. E agora vingam-se com a história do envenenamento” do estratega que forçou Ehud Barak uma retirada unilateral do Sul do Líbano em 2000, após 28 anos de ocupação

O veneno tem sido uma arma muito usada para eliminar inimigos no Médio Oriente. Um dos casos mais conhecidos – e confirmados - foi o de Khaled Meshaal, chefe do movimento islâmico palestiniano Hamas. Em 25 de Setembro de 1997, munidos de passaportes canadianos, dez agentes da Mossad chegaram a Amã, onde Meshaal era “chefe de bureau” e entraram na sua casa. Enquanto ele dormia injectaram-lhe uma substância mortífera no pescoço.

As autoridades jordanas foram alertadas a tempo, e o rei Hussein forçou o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu a fornecer o antídoto sob ameaça de cortar as relações bilaterais. Foi uma humilhação: para Israel: Meshaal sobreviveu e mudou-se para Damasco, de onde ordenou vários ataques terroristas. O monarca hashemita obrigou também Netanyahu a libertar o líder espiritual do Hamas, Xeque Ahmed Yassin, preso na Faixa de Gaza – embora este não tivesse vivido muito tempo: foi abatido por um míssil da aviação israelita no dia 22 de Março de 2004.

Yasser Arafat, o defunto líder da OLP, também escapou a várias tentativas para o envenenarem. Por isso tinha um provador de comida, tal como o executado ditador iraquiano Saddam Hussein.

Quanto a Nasrallah ele sabe que não pode ter sossego. Em Agosto deixou a seguinte mensagem: “Digo aos sionistas: não temos medo de vós. Digam ou façam o que fizerem. Sabemos que estão a planear assassinar líderes da resistência. Mas isso não nos fará recuar.” O “número dois” do Hezbollah, Imad Mugniyah, morreu num atentado bombista em Damasco no passado dia 12 de Fevereiro. A perda da “raposa”, como era conhecido Mugniyah, por viver na clandestinidade durante 25 anos dirigindo as operações secretas da organização, foi um duro revés mas não afectou o peso político do grupo que tem guerrilheiros e deputados em Beirute – não só aumentou o seu arsenal desde a guerra de 2006 como ganhou poder de veto no governo.

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