Torne-se perito

Líder da oposição congolesa detido pelo TPI tinha protecção oficial portuguesa

6 Crimes de que Jean-Pierre Bemba é acusado. Quatro são crimes de guerra e dois são crimes contra a humanidade
a Jean-Pierre Bemba, líder da oposição na República Democrática do Congo detido este sábado, em Bruxelas, após um mandado de captura do Tribunal Penal Internacional (TPI), gozou de protecção oficial portuguesa desde Abril de 2007, altura em que recebe autorização para residir no Algarve.
Em esclarecimento prestado ontem, a Polícia de Segurança Pública (PSP) comunicou que "o Corpo de Segurança Pessoal (...) prestou segurança ao cidadão congolês Jean-Pierre Bemba, com residência em Portugal, com base nos pressupostos legais em vigor e depois da avaliação de ameaça e risco por parte das entidades competentes".
Esta informação contraria os dados publicados um dia antes e entretanto confirmados ao PÚBLICO por fonte oficial do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), segundo os quais Bemba gozaria apenas de segurança pessoal, paga do seu bolso. Ao contrário, a sua segurança foi autorizada oficialmente e sempre garantida através dos canais oficiais portugueses.
Ao PÚBLICO, Magina da Silva, chefe da Unidade Especial de Polícia, esclareceu o processo. As entidades competentes que avaliaram a necessidade de garantir a segurança de Bemba foram o Serviço de Informações de Segurança e os Serviços de Informações Estratégicas e de Defesa Militar. Estes dois organismos consideraram que o líder do Movimento de Libertação do Congo - que vivia na sua residência na Quinta do Lago, no Algarve, desde Abril de 2007, depois de ter saído do seu país na sequência da acusação de alta traição por parte do regime do Presidente congolês, Joseph Kabila - corria "ameaça e risco". O PÚBLICO tentou obter os documentos que sustentaram esta avaliação, mas o gabinete do Ministério da Administração Interna (MAI) explicou que têm "natureza confidencial".
Na sequência da avaliação, o MAI decidiu atribuir segurança oficial a Bemba, que passou a ser garantida pelo Corpo de Segurança Pessoal da PSP, entidade competente para o efeito. Quanto ao carácter da segurança prestada, Magina da Silva não deixa dúvidas: "A PSP só faz serviços oficiais, não presta serviços oficiosos e a segurança privada é vedada aos elementos da polícia. [A segurança de Bemba] Era um serviço oficial."
O MAI não respondeu às questões colocadas pelo PÚBLICO sobre os critérios que estão na base da decisão de atribuir segurança oficial a um qualquer cidadão nem sobre quanto custou ao Estado português, que duração teve e que meios envolveu a segurança de Jean-Pierre Bemba.
O caso também não é claro no que diz respeito ao visto de Bemba. Eis as informações reunidas pelo PÚBLICO durante o dia de ontem. Primeiro, o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, João Gomes Cravinho, disse, em evento público, que Bemba gozava de "autorização de residência temporária".
Mais tarde, à pergunta sobre se Portugal emitiu o visto Schengen de longa duração, de que Bemba usufruía, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, disse, em Bruxelas: "Tenho ideia que sim." Fonte oficial do MNE diria depois que Bemba entrou em Portugal com visto emitido pelas autoridades francesas para efectuar tratamentos médicos. Segundo a mesma fonte, esse visto terá expirado e, em Setembro de 2007, Bemba pediu novo visto à embaixada de Portugal em Washington (EUA).
Ao final da tarde, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras esclareceu, em resposta escrita ao PÚBLICO: "O cidadão em questão não requereu nem obteve estatuto de asilo político; o cidadão em questão possuía um visto Schengen; ao cidadão em questão não foi atribuído pelo Estado português nenhum título de residência."
O Governo português aceitou, em 2007, o pedido de residência de Jean-Pierre Bemba. Luís Amado explicou ontem que o pedido foi feito pelo representante especial das Nações Unidas em Kinshasa "para resolver a situação de crise" na República Democrática do Congo após as eleições presidenciais de 2006, nas quais Bemba foi derrotado por Kabila. Ao que o PÚBLICO apurou, o pedido da ONU foi secundado pelas diplomacias belga e sul-africana e ainda pelo comissário europeu para o Desenvolvimento, Louis Michel. Ontem, a eurodeputada Ana Gomes enviou uma pergunta escrita à Comissão Europeia, na qual questiona a "intercessão" do presidente do executivo comunitário, Durão Barroso, no exílio de Bemba em Portugal. A socialista pede à Comissão para "confirmar ou desmentir" se Durão Barroso "interveio neste caso". Aos jornalistas, Barroso negou qualquer envolvimento no caso Bemba.
Bemba, que foi vice-presidente da República Democrática do Congo durante o período de transição (2003-2006), é acusado de quatro crimes de guerra e dois crimes contra a humanidade cometidos na República Centro-Africana a 25 de Outubro de 2002 e 15 de Março de 2003. É o primeiro detido no quadro da investigação iniciada em Maio de 2007 pelo procurador Luis Moreno-Ocampo, que descreveu a detenção de Bemba como "uma operação complexa e bem preparada". Com Isabel Arriaga e Cunha e Jorge Heitor

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