Rui Reininho : "A estupidez dos ‘tripeiros’ foi virarem-se contra Lisboa em vez de se virarem para Barcelona"

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Rui Reininho Marco Maurício (arquivo)

Há pouco mais de uma semana, em Lisboa, foi a reunião em palco, impensável há uns anos atrás, dos dois GNR – o Grupo Novo Rock e a banda sinfónica da Guarda Nacional Republicana. Na próxima quarta-feira, é o concerto em nome próprio (e da nova Companhia das Índias) na Casa da Música. Rui Reininho está a abrir um ciclo de novas apostas na sua carreira. Mas continuará a ser a voz do GNR e de uma certa “pronúncia do Norte”: crítica, irónica e sempre um pouco blasé. Não é pose, diz ele, que agora, “depois de umas terapias”, já não é as três personagens que costumava ser. Conseguiu passar para uma “bipolaridadezita mais simpática”. “Agora sou só dois: o Sr. Rui Braga, ex-chefe de família, e Rui Reininho, mais conhecido aí entre o povo. O outro, um tal Rudy Romeu, adormeci-o”.

Na altura da fundação, em 1981, a escolha do nome GNR [Grupo Novo Rock] fez algum barulho. Agora apareceram envolvidos com a [própria banda sinfónica da] GNR. Fizeram as pazes?

Nunca tive, assim, um conflito com a corporação. Mas, agora, conhecendo os seres humanos que estão dentro daquelas fardas… É uma gente fantástica. São músicos como nós. Têm bastante talento e qualidade musical. Antigamente, associava-se sempre as bandas militares às charangas. Agora, têm uma qualidade de instrumentos muito boa. Estão ali milhares de euros em bons instrumentos. São muito disciplinados, e têm grande sentido de humor. Talvez também pese o facto de a sua média de idades andar aí pelos 30 anos...


Muitos cresceram a ouvir os GNR.

Sim. Foram seis dias de uma relação muito simpática.


Não teve medo de ser preso?

Não. Eu não sou um ilegal. O único cadastro que tive foi ali na antiga PIDE, ao pé de minha casa. Vim a descobrir, por um amigo que estava na comissão de extinção da PIDE, que tinha lá cadastro.


Por mau comportamento social, ou político?

Fazíamos umas reuniões lá em casa [dos meus pais], gente ligada à UEC, aos maoístas. Era prático, porque era perto do liceu.


O concerto com a GNR vai ser levado a outro lugar, ou foi gravado para editar?

Foi gravado pela RTP, que parece que o irá apresentar. Foi uma coisa bem nacional, uma daquelas decisões administrativas, três dias antes do concerto.


Mas a edição em disco não está prevista?

Eu gostaria. Achei um pouco estranho, até, a falta de interesse da EMI, que é dona do nosso reportório. Mas isso faz parte da crise discográfica. Está tudo a assobiar para o ar, e raramente se toma uma decisão firme. Aquilo é um pouco como o Titanic: eles viram um bocado de gelo e não viram o iceberg que estava por trás, os down-loads, o MP3...


Como é que o GNR está a sobreviver à situação?

Com os espectáculos. Como sempre fizemos.


Mas estão agora a fazer menos concertos do que antes.

O ano passado foi excepcionalmente bom, mesmo sem disco [editado]. Talvez porque fizemos os Coliseus, que dá uma certa visibilidade. E provavelmente até atrelados a um êxito de rádio, que foi a versão do Inferno, do Roberto Carlos. Este ano está particularmente fraco para os artistas nacionais, porque há muita invasão do chamado artista estrangeiro. E há dois ou três vortex, quase sanguessugas, que dão cabo dos apoios todos. Não quero estar agora a ser desagradável, a dizer que é o festival A, B ou C, que leva os apoios todos. O chamado promotor local desapareceu. Aquele sujeito que estava ali na Mealhada, e que não pode competir com os bancos, com as gasolineiras, com as cervejeiras.


A nova lei da rádio não vai ajudar a resolver a crise?

Estas coisas não deviam ser forçadas – também não tenho quotas lá em casa. Devia ser uma coisa espontânea, como respirar. Mas há uma certa autofagia. Para artistas, sem falta modéstia, mais ou menos consagrados desta geração, como nós, os Xutos, o Rui Veloso e por aí fora, se calhar, nem afectará muito. Mas, para quem está a começar, é autofágico, esta coisa de se ter acabado com o CD. Nenhuma editora vai apostar em projectos giros. Por muito talento que tenha, ninguém vai editar. Então, tocamos todos músicas entre nós, em computador, como muita gente faz.


Vão às Queimas, este ano?

Provavelmente não. Já estamos em Maio, e só tenho espectáculos a partir de Junho.


Também não é grande adepto de tocar em Queimas e em festivais.

Fui, durante muitos anos. Creio que Coimbra é o nosso recorde. É a cidade onde mais tocamos na vida, mais de vinte vezes.


Mas os festivais de Verão…

Sim. Claro que prefiro ir espreitar o de Paredes de Coura, de que gosto da programação. Não sou homem para me deslocar lá abaixo ao Alentejo só para ver A, B ou C.


E tocar em festivais?

Não é o meu formato preferido, em termos de espectáculos, estar ali no meio daquela programação. Até porque aconteceu-me, há dois anos, no Rock in Rio, um dos momentos mais desagradáveis da minha vida. Deram-nos das 7 às 9 da manhã para fazer o ensaio de som. É um pouco de desconsideração, àquela hora da manhã… E nos outros festivais, também. Acham que é uma honra, terem-nos lá, e vice-versa.


Vai fazer um concerto no ciclo Música e Revolução, na Casa da Música. Por que é que lhe chamou Mayday?

Partiu de um filmezito daqueles mal traduzidos que eu estava a ver. “Mayday” é o S.O.S. na aviação. Nesse filme de guerra, um avião caía e o piloto estava a falar com terra: “Mayday, Mayday”... E o tradutor, na sua ignorância, traduziu “1º de Maio. 1º de Maio”. Achei fantástico. Ainda se fosse “13 de Maio”…


O concerto vai ser sobre a sua história pessoal do rock n’ roll?

Sim. A maneira como eu a vejo. Vamos começar com o Elvis Presley. Há mesmo uma frase que tirei do Leonard Bernstein, o grande maestro, que dizia que aquele homem mudou tudo: mudou o ritmo, mudou a maneira de vestir das pessoas. Foi, de facto, uma ruptura. E o John Lennon dizia que, antes do Elvis, não havia nada. É engraçado ele dizer isso. E, por ser a véspera do 1º de Maio e da festa das maias, tive uma ideia fantástica para decorar a Casa da Música, lembrando-me da minha infância, quando se punha uma maia nos buraquinhos das casas, porque andava o diabo à solta.


Mas, nos anos 75/76, você estava mais virado para o jazz.

Sim. Foi quando me abriram a cabeça. Creio que foi com o Miles Davis, num festival Monterey pop, creio. Fiquei admirado. Era uma música um pouco mais estranha do que aquilo a que estava habituado a ouvir, desde muito cedo, no liceu Alexandre Herculano.


No concerto haverá um mestre-de-cerimónias, Armando Teixeira, e outros convidados...

Montámos aquilo a que chamei a Companhia das Índias. Pode ser que venha a resultar num disco. Gosto muito de trabalhar com o Armando [Teixeira]. Entendemo-nos muito bem, do ponto de vista musical. E com o João Rato, que é um pouco o director musical, e também responsável pela maior parte dos arranjos. E também com o Nuno Espírito Santo (que tem tocado com o Sérgio Godinho), e o Zé Vilão, que foi uma grande surpresa. Nesta formação, eu estava a apostar até em não ter baterista, mas, depois, talvez resultasse um bocadinho frio. O nosso cuidado é não fazer um espectáculo de covers, de versões que toda a gente pode ouvir nalguns bares.


Não quer fazer um espectáculo de karaoke.

Exactamente – é um “desporto” que abomino. Não percebo qual é a graça de ver as pessoas a tentar imitar os cantores. Há que ter respeito por estes clássicos. No jazz, faz-se isso aos músicos: pega-se nos chamados standards... Não tenho a pretensão de ir por esse caminho. Mas os Beatles são incontornáveis. Nunca fui grande adepto deles, como muita gente da minha geração. Eu era mais dos Stones. E gostava ainda mais dos Kinks. A minha maneira de pegar nos Beatles vai ser quase um improviso à volta do meu Beatle preferido, que é o George Harrison, que trouxe o lado oriental. Vamos fazer uma encenação ligada às cítaras, e não o óbvio do Oblá-di Obla-dá, ou do Yesterday.


O pressuposto do programa é ir buscar músicas que fizeram revoluções, na história da música e na própria História. Agora, a música já não faz revoluções, como a Marselhesa ou o Grândola Vila Morena…

Pois. Aquela fase dos anos 70 e do punk, para mim, foi extremamente importante. Até pela maneira como me levou para a música. Pensei: “Se estes tipos tocam dois acordes ou três e conseguem fazer discos, vou tentar fazer também”. Sempre me considerei um músico medíocre menos, e arrisquei um pouco… Depois conheci os GNR, onde executei algumas das minhas ideias. De facto, hoje, os ícones são muito distantes. Eu sou contemporâneo, até em termos de idade, da geração da Madonna, e desde Like a Virgin não há aquela ruptura. As coisas estão diferentes.


Por que é que isso acontece?

É um processo um bocadinho esquizóide. Está tudo muito no teclado e no ecrã. As pessoas estão muito na rede, fechadas umas com as outras, e parece-me que a única maneira em que ainda há contacto físico, de prazer com as músicas, é nos espectáculos.


Que tal é a acústica da Casa da Música?

É uma casa difícil. Não quero juntar-me ao coro dos protestos, mas há muita gente que diz que ali se gastou muito dinheiro nas maçanetas e nas carpetes, e que há deficiências.


Mas gosta da arquitectura?

Ontem disseram-me que o projecto era para um milionário que queria oferecer aquele diamante a uma princesa, e que depois a coisa não se efectivou e ele acabou por aterrar ali no cimo da Avenida da Boavista. Mas gosto. Gosto de certas modernices. Mas – e podem-me chamar parolo – detesto o que fizeram ao Jardim da Cordoaria e à Avenida dos Aliados. E à minha praia de Leça da Palmeira, que é agora uma auto-estrada, sem uma sombra onde os passarinhos possam pousar, onde a gente possa escrever o nome da pessoa amada numa árvore.


Mas são projectos de arquitectos de renome.

Com certeza. E tenho o máximo respeito por eles. Sempre tive. Em Leça da Palmeira, por exemplo, estou perante uma das coisas mais lindas: a casa de chá, a piscina, que frequento até de Inverno – salto o muro. Mas “cada macaco no seu galho”. Não me parece que todas as pessoas sejam adequadas. Eu não servia para cantar ópera. Tenho a noção das minhas limitações. Mas a Casa da Música, naquele sítio, parece-me um pouco uma nave espacial que aterrou ali por acidente. Seria muito mais agradável ter aquele objecto no meio de um jardim.


Em termos de acústica, o que é que não funciona na Sala Suggia?

É uma sala difícil. Não sei porquê. Ainda não tive oportunidade de discutir isso com o técnico que vai fazer o som. Também já assisti a espectáculos do chamado reportório clássico – não gosto de lhe chamar assim, acho um preciosismo chamar-lhe clássico ou ligeiro. Mas, naquela música mais séria, notei que tinha alguma dificuldade em ouvir os baixos ou contrabaixos. Mas cada caso é um caso. E acho que pode ser melhorado. Uma das coisas que a Casa da Música não tem, e devia ter, era disponibilizar mais salas para o exterior, para os músicos terem os seus gabinetes, o seu lado experimental. Mas é uma honra estrear ali uma ideia assim tão rubicunda como esta. E isto vai ser o princípio de muitas coisas. Abriram-se muitas portas. Por exemplo, fazer um disco de originais.


No GNR, retratou o Porto dos anos 70 e 80, por exemplo, em Piloto automático, Whiskey puro ou Vodka vodka, e noutras músicas que sugeriam uma geração muito boémia, muito voltada para o álcool e para as drogas. Já não bebe, já não fuma.

Vou bebendo o que me deixam.


Que relação tem hoje com o Porto?

Eu fui, de certa maneira, expulso da Baixa. Não foi por culpa de A, B ou C. A Capital da Cultura também contribuiu, de certa maneira, para o desmantelamento da Baixa. Fiquei um bocado triste por ver a Baixa toda em pantanas. E aqueles comerciantes, uns até pais de amigos meus – o Sr. Moreira e o Sr. Santos ¬– ali aflitos, à porta das suas lojas, a ver as pessoas a começarem a debandar para os centros comerciais. Rebentaram com o pequeno comércio. Talvez o facto de os novos campus universitários e aqueles núcleos adjacentes ao Piolho, a Medicina, Ciências… Aquela gente debandou toda. Para o 2001, o [Artur] Santos Silva tinha uma ideia fantástica – a cultura também é civilização, não é só exibir o Pierre Boulez. A cultura de rua, a animação, faltou ao 2001, tirando performances pontuais. Apostou-se, um pouco, naquele pseudo-elitismo e não se devolveu a cidade às pessoas.


Agora começa a haver grande animação à noite, nas ruas de Cândido dos Reis, Galeria de Paris e Almada.

São ruas lindíssimas. Mas é uma fauna muito típica. Sem querer mandar “bocas”, é um bocadinho Ípsilon, não é? É o pessoal de alterne de maneira diferente. E a Ribeira está um pouco perigosa. Se não fossem os meus amigos Super Dragões, não me atreveria a ir à Ribeira.


Tem boas relações com os Super Dragões?

Gosto das tribos. Se os fenómenos existem, têm que ser entendidos. Percebo o meu caro colega Morrissey, que chegou a ser obrigado a sair de Inglaterra, porque, de certa maneira, defendia o hooliganismo. Conotavam-no com aquele nacionalismo inglês, e ele dizia. “Eu percebo estes jovens pobres, que chegam a Copenhaga e não têm nada – o seu gesto mais brutal será assaltar a ourivesaria ou partir tudo”. Há um lado de violência que é inata à humanidade e que se tem de compreender. Eles nada têm a perder. Se calhar, é o meu lado bakuniniano. Mas não vou por aí. São tribos que, a certa altura, são tão necessários, ou tão desnecessárias, como o exército.


Em que ponto está o seu anarquismo?

É pura e simplesmente estético. A minha ideologia não é nem deus nem chefes, porque, precisamente, tenho vivido sem uns nem outros. E, se calhar, eles existem.


Falava, há bocado, do Morrissey. Há muita gente que diz que você se parece agora com ele.

É da idade. Os velhinhos tendem…


Aquela pose de fato branco, com a GNR, é deliberada?

Não. O fato branco foi uma questão estética, por estarem cento e tal senhores fardados com fato azul e verde. Por acaso, é bem bonita, a farda da GNR. É extraordinário. As pessoas dizem: “O tipo está um bocado xé-xé”. Ou dizem: “Não, agora está mais comedido”. Tenho é de tirar o máximo partido das minhas potencialidades, enquanto tiver um fiozinho de voz. Não me vejo a fazer as mesmas acrobacias de há vinte anos atrás. Era mesmo cansativo. A tal personagem, já prescindi dela.


Havia, então, uma personagem deliberada.

Não era deliberada. Era espontânea. Não me reconheço nalgumas delas, no tom de voz, no comportamento. Agora, se não me sai, vou tentar procurar outra via. Não percebo porque é que um músico da chamada clássica pode fazer espectáculos até aos 70, 80 anos, e ao pop-rock exigem… Teremos que morrer cedo?


O concerto que vai apresentar em Maio no S. Luiz, em Lisboa, é já a expressão dessa nova etapa?

Sim. De um novo espaço de contenção sonora. Há menos decibéis, e uma exigência grande. São vinte canções.


Terá originais?

Não. Felizmente vou tocar com estes músicos [do concerto na Casa da Música]. Em 15 dias, não vou mexer no plantel. Vamos fazer rearranjos de músicas. Até porque, se conseguir concretizar, ainda este ano, um disco com a Companhia das Índias, no espectáculo que se lhe seguirá, o objectivo será fazer uma pequena viagem pelo país, mas em recintos fechados. Há sítios maravilhosos, como o Vila Flor, em Guimarães. (Parece que custou um décimo da Casa da Música, e tem condições acústicas óptimas). E há muitos outros sítios que gostaria de visitar. É aquilo a que chamo um voo low-cost: cabe tudo num táxi. E é realista, na crise que estamos a atravessar. É uma coisa mais portátil.


Voltando a falar do Porto. Numa entrevista, disse uma vez que era bom que Rui Rio se candidatasse à liderança do PSD, “para desamparar a loja”....

Era bem feito. Com o senhor como primeiro-ministro, se calhar, aí o pessoal dos subsídios nacionais ia sentir na pele. Passava a ser um problema nacional.


Também acha que há um esvaziamento cultural na cidade?

No outro dia, estava com o meu antigo mestre, o Ricardo Pais, em Lisboa, e ele disse-me: “Se reparares, no roteiro do Porto, não há hoje uma única peça de teatro em cena”. A Seiva não estava a funcionar, e como o S. João estava com uma peça em Lisboa… Isto é mau, numa cidade destas. Desabitua as pessoas de ir ao teatro, como de ir ao cinema.


O que pensa da privatização do Rivoli?

“Nein Danke”. O teatro popular tem todo o direito... Lembro-me de ir ver a revista ao Sá da Bandeira, com a Laura Alves. Mas tem que haver espaço para a dança, e para um cinema que não é propriamente comestível. Eu passava fins-de-semana fabulosos, gastava ali todas as minhas mesadas a ver as noites e as tardes fantásticas, com o Howard Hawks. Nem sequer há uma cinemateca. O Pedro Mexia está agora na Cinemateca, lá em baixo. Dou-lhe os parabéns. E acho que uma das ideias dele é descentralizar a Cinemateca nacional e haver um protocolo com o Porto, com uma ou mais salas. O Mexia tem inteligência e acção suficiente para fazer uma coisa dessas.


Com o Rui Veloso e, depois, o Pedro Abrunhosa, o GNR assumiu, de certo modo, a pronúncia do Norte. Sentia essa responsabilidade de estar a representar a cidade e a região?

Sem bairrismo, gosto da proximidade das pessoas. Emociono-me bastante com o povo, como dizia o Pedro Homem de Melo. Sou um bocado casmurro, um bocado forreta. Nesta região até à Galiza, sinto uma proximidade, mais do que com o calcário alentejano. Mas também me dou bem com alentejanos. A única coisa de que não gosto é daquele espírito do antigo Terreiro do Paço. Mas Lisboa é uma cidade maravilhosa. A estupidez dos “tripeiros” foi, durante muito tempo, virarem-se contra Lisboa em vez de se virarem para Barcelona, por exemplo, uma atitude que era muito mais interessante.


Mas essa estratégia deu frutos no FC Porto, até certo ponto.

Essa e outras. As pessoas sentem-se ressentidas. Tive a felicidade de ter estado no after party [da conquista do campeonato de futebol] com a equipa toda, aquela gente toda, e vi o que eles sentem contra aquela imprensa desportiva. Eles podem conquistar os feitos mais gloriosas, mas é sempre uma nota de roda-pé. O que vem na primeira página é sempre quem vai ser o novo treinador do “Glorioso”. Eles sentem-se feridos. E aquele programa da SIC anti-FCP foi um grande tocar a reunir.


Esse espírito faz algum sentido, nos dias de hoje?

Não, porque não há tropas, como diria o outro senhor da Madeira. É pena. Aparecem trinta ‘gatos pingados’, e são sempre os mesmos voluntariosos, ali no Rivoli. Se calhar, vão aparecer poucos mais no Bolhão, repetindo o que me disse a minha amiga Regina Guimarães, que é uma defensora de um mercado de frescos no centro da cidade.


O que está a acontecer com o Bolhão mostra que a cidade já não reage como reagiu com o Coliseu.

Não, porque não há gente. As pessoas estão mais nos subúrbios e pensam assim: “Se calhar, vou defender uma coisa que já não é a minha luta”. A Baixa tem uma população muito envelhecida e triste. São os que restam. Não há grande apelo. É pena, porque eu gostava de regressar, nem que fosse para ser cremado ali. Mas, agora, ouvi dizer que vai haver um crematório na Lavra. Vou-me inscrever ali, nas cinzas da Petrogal.


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