Eduardo Agualusa e Mia Couto: peça a quatro mãos estreia em Guimarães

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"O Vendedor de Passados", romance do escritor de 2004, vai ser editado nos EUA Rui Gaudâncio (arquivo)

Uma história escrita em dois momentos, um em Maputo (Moçambique), e outro em Luanda (Angola), foi essa a proposta da “Trigo Limpo Teatro ACERT" feita aos dois escritores africanos. A ideia surgiu de um convite da companhia de teatro que já tinha feito trabalhos anteriores com Agualusa, desde que se conheceram numa das edições do "Festival D’Agosto", em Maputo: “ Fiquei espantado e comovido com a forma como o grupo conseguiu estabelecer pontes entre África e Portugal, sem paternalismo, sem complexos, guiados apenas pela certeza de que a humanidade é a mesma em toda à parte”.

A peça fala de um homem que regressa à aldeia Natal, Xigovia (Moçambique), disposto a matar as mulheres da sua vida Mariana Chubichuba, Judite Malimali e Ermelinda Feitinha. “São três histórias diferentes de amor”, descreve Eduardo Agualusa. Os papéis foram repartidos logo no início: Mia Couto escreveu o papel do homem, representado pelo actor José Rosa, e Eduardo Agualusa criou a trilogia das ex-amantes. “Já tenho alguma experiência com a figura feminina”, afirmou o escritor angolano para justificar a divisão de tarefas. O difícil desdobramento em três mulheres ficou a cargo da actriz Sandra Santos. Agualusa explicou que o tom da peça foi ditado por Mia e que ele apenas se limitou a “ser aquelas mulheres”.

O processo de construção do texto foi feita através de e-mail e os ensaios da companhia foram também acompanhados via Internet.

A peça, encenada por Pompeu José, sobe ao palco hoje e amanhã no Teatro de Vila Flor, em Guimarães, passando depois pelo Cine Teatro de Estarreja e pelo Auditório Municipal da Lousada. Em Maio, irá também passar por Angola.

“Virei dramaturgo agora“

Em conversa com o PÚBLICO, primeiro por telefone e depois por MSN, José Eduardo Agualusa relatou os muitos trabalhos que tem realizado na área do teatro. Para além de “Choveram amores na Rua do Matador”, o escritor angolano escreveu um monólogo para a actriz brasileira Marília Gabriela, que estreia em Agosto no Rio de Janeiro, e está neste momento a trabalhar na peça de adaptação ao romance“ Nação Crioula”, que depois do Brasil, vem para Portugal, embora ainda sem data definida.


Mas a nível de romances, o escritor confessa-se também a fervilhar de ideias e histórias. Depois do seu livro “O Vendedor de Passados” (2004) ter sido nomeado para para o “International IMPAC Dublin Literary Award 2008”, vai agora ser publicado nos EUA, por uma das mais conhecidas editoras do país, a “Simon & Shustler”. O romance está a ser adaptado ao cinema pelo realizador brasileiro Lula Buarque de Holanda, cuja estreia está prevista para 2009.

Neste momento, Agualusa está também a trabalhar em dois romances. Como inspiração, o escritor fala nas vidas de pessoas que tem conhecido nas suas várias experiências. Um dos livros é sobre o romance entre uma mulher de 60 anos e um homem de 20: “É uma história muito bonita de uma Mãe de Santo da Bahia - relativamente conhecida - que aos 60 anos se apaixonou por um jovem de vinte, filho de alemães. Ela trouxe-o para Salvador e passou a viver com ele, enfrentando os filhos”, descreveu Agualusa. Paralelamente a essa história, outro romance está também a ser desenvolvido, embora o escritor não adiante mais pormenores sobre o tema: “Estou ainda a descobrir”, afirmou apenas.

“O Acordo Ortográfico permite uma maior circulação do livro em todo o espaço da língua portuguesa”

Para além da intensa actividade literária, Agualusa tem sido uma das vozes mais ouvidas sobre a polémica questão do Acordo Ortográfico. O escritor angolano diz-se favorável ao acordo e apontou duas grandes vantagens a favor da sua implementação. A primeira está relacionada com a questão da alfabetização: “Uma grande parte da nossa população é semi-alfabetizada. Quando as pessoas se deparam com duas ortografias diferentes é difícil a aprendizagem”, defendeu. A outra razão, que está directamente ligada à primeira, prende-se com a questão dos livros traduzidos. Tendo em conta que Angola não produz livros, “se houver uma ortografia única podemos importá-los do Brasil e de Portugal sem problemas".


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