Chalana aposta tudo na mística

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Chalana é o treinador de recurso que vai orientar o Benfica esta noite David Clifford (arquivo)

"Não me falem de tácticas, falem-me de emoção." Esta parece ser a máxima de Fernando Chalana, o treinador de recurso que irá orientar esta noite (20h00, SIC) o Benfica em Getafe depois da demissão surpresa de José Antonio Camacho. Por isso, o antigo jogador "encarnado" acredita que o segredo para a passagem da eliminatória está mais na vontade de ganhar do que na forma de ganhar.

O ex-treinador adjunto do clube da Luz surgiu na modesta sala de imprensa do Getafe com o fato de treino do Benfica vestido. E foi batendo com a mão no peito, afagando o símbolo benfiquista, que resumiu a estratégia delineada para a partida de hoje, onde as “águias” têm que virar um resultado negativo de 2-1. “O emblema está aqui e amanhã [hoje] todos têm que trabalhar para o mesmo, porque o Benfica está em primeiro lugar.”

Chalana acredita que a vontade de ganhar será suficiente para eliminar o Getafe. E durante uma conferência de imprensa onde não conseguiu disfarçar o desconforto que a sua nova condição de responsável máximo da equipa lhe causa, colocou toda a sua esperança na “garra” dos atletas: “Os jogadores estão com garras de ganhar. Eu estou com garras de ganhar e estamos aqui todos para ganhar.”

Se Camacho tinha um discurso simplista, o de Chalana não é diferente. A única diferença é que o do português soa mais genuíno, mais puro. Se o espanhol dizia que a diferença entre vencer e não vencer um jogo era apenas marcar mais ou menos golos do que o adversário, a antiga estrela “encarnada” diz que para vencer o Getafe basta sentir o coração benfiquista pulsar no peito: “O coração deles [jogadores] bate como o meu.” Mais simplista do que isto é difícil.

Mas Chalana está convicto de que é de “moral” que a equipa precisa. Que o que falta ao Benfica é alma. Espírito ganhador. Mais do que jogar em 4x4x2 ou 4x2x3x1, o que interessa incutir nos futebolistas é ambição. “Falei com eles pela positiva”, revelou. E com dois dias de trabalho com os jogadores pouco mais, de facto, se pode pedir ao novo treinador “encarnado”.

No único jogo que tem no seu currículo como treinador principal dos “encarnados” inovou (ver perfil), ficando na história a sua aposta em Miguel como defesa lateral direito. Ontem, Chalana não quis confessar se estava a pensar em “inovar”. Mas deixou uma promessa: “Temos que ser mais agressivos com e sem bola. E depois jogar futebol.” O que, a concretizar-se e face ao que se tem visto da equipa nos últimos jogos, significaria uma enorme inovação.

Eventuais alterações estão sempre condicionadas pelos vários lesionados e castigados que existem no plantel (David Luiz, Cardozo, Luisão, Nuno Assis, Zoro...) e que limitam as escolhas. Ontem, no treino de adaptação ao relvado do estádio do Getafe, deu para perceber que o novo técnico “encarnado” tem na cabeça duas hipóteses - utilizar apenas um ponta-de-lança (Nuno Gomes) ou recorrer a dois homens mais avançados no ataque (Nuno Gomes e Makukula). Mas talvez o dado mais significativo do treino tenha sido o treino de penáltis. Um sinal mais dado aos jogadores por Chalana, que acredita ser possível levar a eliminatória até à decisão na marca das grandes penalidades. “Os jogadores são profissionais, jogam no Benfica e têm que pensar no futuro e não no que se passou para trás”, acrescentou. Hoje se saberá se a mística benfiquista vence jogos.

Fernando Chalana, o jogador, já tem um lugar na história do futebol português e do Benfica. Chalana, o treinador, volta hoje a sentar-se no banco como técnico principal do clube da Luz e terá a responsabilidade de defender o que se transformou num verdadeiro mito no universo benfiquista. Tudo se passou em Novembro de 2002. Jesualdo Ferreira saiu do Benfica, após a eliminação da Taça de Portugal às mãos do Gondomar, e Chalana assumiu o comando da equipa por um jogo, numa altura em que Camacho (o mesmo a que agora sucede) já estava contratado. Derrotou o Sporting de Braga, por 3-0, num jogo em que arriscou uma nova táctica: jogou com três centrais e colocou Miguel, actual jogador do Valência, a fazer todo o corredor direito. Nascia, assim, mais um lateral direito e Chalana ganhava a aura de técnico imbatível e do visionário que transformou um extremo descredibilizado num lateral titular da selecção. É também esse prestígio que Chalana defende hoje em Getafe e, em princípio, até ao final da temporada, ele que tem uma carreira discreta como treinador. O ponto mais alto foi o título nacional de juniores conquistado pelo Benfica (2000). Além de ter sido adjunto de Jesualdo, Camacho, Koeman e Fernando Santos no Benfica e de José Gomes no Paços de Ferreira, o antigo jogador dirigiu o Oriental e as camadas jovens do Benfica.

Nascido no Barreiro, a 10 de Fevereiro de 1959 (49 anos), Fernando Albino Sousa Chalana foi um dos melhores futebolistas da sua geração. Passou grande parte da carreira no Benfica, onde chegou em 1975-76. Foi campeão nacional seis vezes e também campeão de França, pelo Bordéus, em 1984-85, para onde se transferiu após o Euro de 1984. Nesse Europeu, Portugal foi terceiro e Chalana esteve em grande destaque: as fintas do “pequeno genial” valeram-lhe a alcunha de “Chalanix” e a mudança milionária para o Bordéus. Os 200 mil contos da transferência serviram para construir o famoso terceiro anel no antigo Estádio da Luz.

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