Torne-se perito

BCP vai ser investigado pela CMVM e Banco de Portugal

Regras bancárias impedem, desde 1993, empréstimos a órgãos da administração e familiares directos. 27 milhões sob suspeita

Joe Berardo diz que depois das autoridades supervisoras se pronunciarem irá decidir se avança ou não com uma queixa a O Banco de Portugal e a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) vão investigar os alegados "perdões" de dívida a uma empresa de Filipe Vasconcelos Jardim Gonçalves, filho do fundador do BCP, e de juros ao accionista José Goes Ferreira. Ambas as operações de "perdão" remontam ao final de 2004. E, segundo a imprensa, ascendem a 12 milhões de euros no caso da empresa do filho de Jardim Gonçalves, o Grupo V, e a cerca de 15 milhões face a Goes Ferreira (textos ao lado). Os órgãos de supervisão anunciaram ontem, em comunicado, que estão a analisar a situação e já pediram esclarecimentos ao BCP. O Banco de Portugal (BdP) irá averiguar se houve violação das regras bancárias e a CMVM investigará um eventual favorecimento accionista.
Em causa, no primeiro caso, poderá estar a violação do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), em vigor, segundo fonte oficial do BdP, desde 1993, e que estabelece no artigo 85 que as instituições não podem conceder crédito directa ou indirectamente aos membros dos órgãos da administração e de fiscalização. E ainda a cônjuges, parente ou afim de 1.º grau de algum membro dos órgãos de administração ou a sociedades por eles controladas. É esta questão que o BdP está a apurar. O BCP não adianta em que data começou a ser feito o empréstimo ao Grupo V, nem qual o montante do empréstimo considerado incobrável ou se este foi aprovado em conselho executivo, o que seria natural dados os montantes. Segundo o Expresso, o processo teve a aprovação do actual presidente Filipe Pinhal, que confirmou a passagem dos créditos a incobráveis, e do administrador Alípio Dias.
Já a CMVM quer saber se houve tratamento accionista preferencial em relação a Goes Ferreira, uma vez que, diz o Jornal de Negócios, o "perdão" de juros corresponde a financiamentos contraídos para adquirir acções do BCP nos aumentos de capital de 2000 e 2001. A aprovar-se este perdão o BCP fica numa situação delicada, uma vez que há um alargado conjunto de clientes/accionistas a acusar o banco de os ter enganado neste processo de venda de acções com financiamento da instituição. Segundo alguns juristas, o BCP poderá estar também a violar as regras contabilísticas IAS, segundo as quais o perdão de juros a accionistas tem de ser tornado público. Goes Ferreira, em declarações à Lusa, disse que não beneficiou de qualquer perdão de juros devidos ao BCP, mas fez sim uma renegociação dos contratos de financiamento que resultaram em ajustamentos das margens dos empréstimos. Caso o BdP ou a CMVM apurem responsabilidades por parte do banco, poderão avançar para processos de contra-ordenação, puníveis com coima.
Ao início da noite, o BCP fez um comunicado, assinado pelo conselho de administração executivo, onde alega que face aos casos referidos "não foi em momento algum reportada qualquer irregularidade ou desvio de normalidade" por parte dos mecanismos de controlo e auditoria. Porém, decidiu "ordenar" uma averiguação interna para "completo" esclarecimento da situação. Cujos resultados promete dar ainda hoje conhecimento às autoridades de supervisão e órgãos competentes do banco.

Nova luta pelo poder?As acções registaram uma forte quebra, em parte porque se teme que estas dois casos não sejam os únicos. Há alguns anos, José Jorge Valério, fundador do banco, viu também perdoada a quase totalidade de uma dívida de 40 milhões de euros. Estas denúncias voltam a colocar em cima da mesa o tema da guerra de poder dentro do banco e a sustentabilidade da administração do BCP, hoje liderada por gestores que têm estado ao lado do fundador Jardim Gonçalves, contra o ex-CEO, Paulo Teixeira Pinto.
Joe Berardo e Pedro Teixeira Duarte, dois dos maiores accionistas, querem saber se estas situações ocorreram e já questionaram o banco nesse sentido. Joe Berardo afirmou que só decidirá se avança com uma queixa na Procuradoria-Geral da República depois de as autoridades supervisoras se pronunciarem.

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