Militar do Ruanda condenado por assassínios que aceleraram saída da ONU em 1994

Novas revelações sustentam tese de que a França apoiou o regime hutu sabendo que havia riscos de um genocídio

a Antigo major hutu nas forças do Exercito ruandês, Bernard Ntuyahaga foi ontem condenado a 20 anos de prisão por um tribunal da Bélgica pelo assassínio de dez soldados belgas da Missão das Nações Unidas no Ruanda (Minuar) a 6 de de Abril de 1994 - o caso acelerou a saída dos "capacetes azuis" da missão de paz internacional quando o país mergulhava nos cem dias que duraram o genocídio de um milhão de tutsis e hutus moderados. A sentença - que se segue às condenações em 2001 também na Bélgica de duas freiras, um professor universitário e um homem de negócios (todos ruandeses) por cumplicidade e ajuda nos massacres - surge na mesma semana que, em França, o jornal Le Monde revelou novos dados que sustentam a versão de que o Presidente francês François Mitterrand não só apoiou o Governo hutu de Kigali, nos meses que antecederam o genocídio, como o fez, tendo conhecimento, logo desde 1990, dos riscos de massacres em larga escala.
É esta a conclusão que resulta da síntese, publicada na edição de terça-feira do Monde, dos vários volumes dos arquivos do Eliseu, entregues ao Tribunal Militar, onde corre um processo depois de uma queixa de seis sobreviventes tutsis contra a França por "cumplicidade com o genocídio".
Os factos remontam a Outubro de 1990, quando a França respondeu ao pedido de ajuda militar do Governo ruandês e das Forças Armadas Ruandesas (FAR) que combatiam a rebelião da Frente Patriótica do Ruanda (FPR-Tutsi). Nesse ano já eram visíveis os sinais da perseguição étnica, com vários milhares de tutsis a serem detidos de forma arbitrária.
O apoio militar foi reforçado e as entregas de armas intensificaram-se em 1991. Em 1993, perante os avanços da FPR no terreno, tornou-se evidente que o poder de Kigali tencionava "proceder a um genocídio sistemático", alertou então o embaixador francês no país.
Este e outros sinais de alarme foram ignorados pelo Eliseu, preocupado em manter a influência francófona no Ruanda.
Um ano depois, em Janeiro de 1994, e três meses antes do genocídio, o diplomata alertou o Eliseu para dados de um informador da ONU no Ruanda que apontavam para a existência de detalhes "graves e plausíveis" de um plano de desestabilização do país; haveria provocações contra a rebelião da FPR, com o objectivo de suscitar uma reacção, que serviria de "pretexto para a eliminação física dos tutsis da capital".
Segundo o mesmo relatório diplomático, esses planos estariam adiantados, tendo os milicianos hutus recebido treino militar e armas para o efeito.
Dias depois de começarem, os massacres de tutsis por hutus foram apresentados pela França como uma reacção espontânea e não como um plano. Perante as críticas, o Eliseu queixou-se dos "processos sumários" que estavam a ser feitos contra si.

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