Bruno Pacheco e Ben Callaway O lado mais tóxico da realidade

São os mais jovens artistas de sempre a tomar conta de todo o espaço de exposições da Culturgest. É que, diz o comissário da exposição, a qualidade da obra deles não deixa dúvidas

No pequeno-grande mundo da blogosfera há quem compare o ambiente dos vídeos de Ben Callaway à vertigem induzida pela ketamina. Não admira: há qualquer coisa de tóxico e perturbador na forma como as suas imagens nos levam a perder o pé, submersos num sonho de cores saturadas e ritmos fracturados. Na Culturgest, em Lisboa, onde ocupa as duas salas da Galeria 1, Ben Callaway apresenta quatro trabalhos: Rigadoon, Down There, Version e Platform. Nenhum destes pequenos filmes ultrapassa os cinco minutos. Contudo, qualquer coisa neles deixa no ar a sensação de longas narrativas, pinturas em movimento em que a ligação entre sucessivas impressões e atmosferas parece escapar-nos por entre os dedos.
A maioria concordará: "Normalmente um artista de 28 anos não tem ainda a consistência que permita fazer uma avaliação muito fundamentada da sua obra", reconhece o comissário da exposição, Miguel Wandschneider. Mas sublinha: "Em relação ao Ben, não tenho dúvidas nenhumas".
Wandschneider conheceu Ben Callaway em Londres através de Bruno Pacheco, durante a preparação da exposição deste último artista, que actualmente ocupa a Galeria 2, também da Culturgest, maioritariamente com trabalhos de pintura, mas também vídeo e objectos. Depois de visionar o seu trabalho, a decisão do comissário de os juntar foi quase imediata.
Apesar das diferenças, as afinidades entre o trabalho de um e outro são profundas. A começar pelos processos baseados na recolha e apropriação de imagens anónimas.
Ben Callaway (n. Bristol, 1978) aproveita normalmente vídeos em VHS, produções caseiras, promocionais ou trechos de documentários que manipula passando os registos uma e outra vez entre gravadores analógicos e daí para formato digital. A degradação das imagens e a corrupção dos ritmos começa desde logo aqui.
Bruno Pacheco (n. Lisboa, 1974) usa também com frequência imagens alheias como ponto de partida para a maioria das suas obras em pintura. No seu caso, a Internet é uma fonte primária de recolha, normalmente de retratos de grupo, quase sempre imagens frontais de situações de convívio.
Da transposição destas imagens para tela ou papel nascem pinturas de características distintas mas quase sempre assombradas por um certo estranhamento, seja pelas coreografias suspensas, pelos sorrisos tornados postiços - quase ameaçadores -, pelas feições tornadas máscaras ou pelos contornos que aqui e ali se desfazem e sugerem o terror da diluição das personagens contra os fundos.
Depois da sua primeira exposição individual na galeria Lisboa 20, em 2004, Bruno Pacheco ganhou o Prémio União Latina em 2005. Já no ano passado expôs também individualmente na Quadrado Azul do Porto e na HollyBush Gardens Gallery de Londres. Naquela que é a sua primeira grande exposição institucional, Pacheco apresenta quase exclusivamente trabalhos realizados no último ano - segundo o comissário da exposição, estará representada apenas cerca de metade da obra produzida pelo artista nesse período.
Miguel Wandschneider, que em 2002 dedicou uma das exposições do programa de vídeo Slow Motion ao artista, sublinha a "vitalidade e intensidade do seu processo criativo" e "uma atitude constante contra os parâmetros do estilo". "O Bruno está permanentemente a despistar os critérios de bom-gosto, o virtuosismo, a eventual docilidade que a pintura possa ganhar", comenta o comissário.

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