Igualdade de género e bem-estar da criança "são indissociáveis"

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A discriminação acompanha os vários ciclos da vida Jan Sabawoon/EPA (arquivo)

O relatório da Unicef - organismo que hoje celebra 60 anos - desmonta a discriminação em três dimensões: igualdade na família, igualdade no emprego, igualdade na política e no Governo. E termina com uma série de pistas, "colhendo o duplo dividendo da igualdade de género".

"Algumas nações que aceitam prontamente o conceito de que as crianças têm direitos estão menos dispostas a admitir que as mulheres também têm direitos", atesta o documento. "Ainda que 184 países façam parte da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher, muitas adesões foram feitas com reservas em relação a artigos específicos." De todos os tratados da ONU este é o que gera maiores reservas.

Apesar dos compromissos assumidos pela comunidade internacional, e "embora a desigualdade de género varie quanto ao grau e ao nível, em todas as regiões do mundo mulheres e meninas são discriminadas no acesso a recursos, oportunidades e poder político". A opressão "pode incluir preferência por filhos homens, limitações de opções pessoais e profissionais, privação de direitos humanos e violência claramente baseada no género", observa o relatório.

A discriminação de género acompanha os vários ciclos da vida. Desperta na vida intra-uterina. Instrumentos de diagnóstico permitem apurar o sexo do bebé numa fase ainda precoce da gestação: "Histórias sobre nascimentos e dados de recenseamentos na Ásia - principalmente na China e na Índia" - sugerem feticídio e infanticídio selectivos por sexo".

A desigualdade manifesta-se, também, nas oportunidades de educação: "Para cada cem meninos fora da escola há 115 meninas na mesma situação." Nos países em desenvolvimento, praticamente uma em cada cinco meninas matriculadas não conclui a escola primária, apenas 43 por cento frequentam o secundário na idade adequada. E a educação é um "factor fundamental para dar às mulheres oportunidades de participação económica e política".

Em termos globais, 36 por cento das mulheres entre 20 e 24 anos de idade tinham-se casado antes dos 18. Estima-se que 14 milhões de adolescentes entre 15 e 19 anos de idade dêem à luz a cada ano e meninas menores de 15 anos têm uma probabilidade cinco vezes maior de morrer durante a gestação do parto do que as mulheres a partir dos 20 anos. "Quando a mãe tem menos de 18 anos, a hipótese de o bebé morrer no primeiro ano de vida é 60 por cento maior."

As tradições culturais podem perpetuar a discriminação inclusive na forma de agressão. Os menores do sexo feminino correm maior risco de abuso sexual, exploração, tráfico. Por isso - e factores como as altas taxas de analfabetismo, que as impedem de adquirir conhecimento sobre os riscos - têm mais hipóteses de contrair HIV. E há a violência doméstica, a mutilação genital feminina...

Importância dos movimentos femininos comunitários

É ponto assente na ONU. "Sem igualdade de género não pode haver desenvolvimento sustentável", afirma o secretário-geral, Kofi Annan, na mensagem citada no relatório. "Estudos consecutivos ensinam que nenhuma ferramenta é tão eficaz no desenvolvimento como o incremento do poder da mulher. Nenhuma outra política tem tanta probabilidade de aumentar a produtividade ou de reduzir a mortalidade infantil e materna", defende. De "melhorar a nutrição e de promover a saúde", de "aumentar as hipóteses de educação da próxima geração".

A Unicef propõe sete instrumentos. Um dos "passos mais poderosos" é a igualdade de oportunidades educacionais. E isto passa, por exemplo, pela eliminação de taxas escolares e pela criação de escolas livres de preconceitos. Impõe-se, ao mesmo tempo, direccionar "recursos adicionais para alcançar a igualdade de género" e "nivelar a arena da legislação nacional". A organização sugere quotas para estimular a participação das mulheres na política, que é "vital para as crianças".

É ainda salientada a importância dos "movimentos femininos comunitários" na defesa e expressão da igualdade - "as mulheres aumentam o poder das mulheres". E sustenta que "os homens podem ser aliados poderosos" nesta luta. "Um mundo livre de discriminação pode parecer um sonho impossível, mas é uma coisa que está ao nosso alcance", remata. O que é preciso é uma acção articulada.

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