Doença de Alzheimer está subdiagnosticada em Portugal
O estudo da Associação Internacional de Alzheimer apresenta os dados mais recentes sobre o conhecimento da doença na Europa, através de entrevistas a 2500 pessoas de vários países, entre cuidadores de pacientes, médicos e população em geral, apresentando ainda os testemunhos de doentes de Alzheimer em fase ligeira.
O inquérito realizado em 2004 revela que praticamente quase todos conhecem ou já ouviram falar de Alzheimer. No entanto, na opinião de 84 por cento dos médicos portugueses entrevistados, a doença está subdiagnosticada no país, uma situação que consideram contribuir para a ideia de que a perda de memória faz parte do envelhecimento e para a confirmação da baixa consciência da população em relação à doença.
Ainda de acordo com o estudo, a grande maioria dos entrevistados considerou que a generalidade das pessoas não sabe distinguir entre os sintomas iniciais da doença e o envelhecimento normal e os próprios médicos consideram que os colegas, nomeadamente os de clínica geral, têm dificuldade em diagnosticar a doença na fase inicial.
Entre os cuidadores de doentes de Alzheimer, mais de 70 por cento repararam como primeiro sintoma o esquecimento ou as perdas de memória, mais de 66 por cento alterações no comportamento, fraco discernimento (42 por cento), mudanças de personalidade (36 por cento), perder-se ou ficar desorientado (28 por cento) e dificuldade em realizar tarefas do dia-a-dia (20 por cento).
Apesar dos sintomas, a maioria dos cuidadores (52 por cento) aguardou "algum tempo" antes de contactar um médico/especialista, decorrendo, em média, seis meses até que um doente com sintomas vá a uma primeira consulta e 18 meses entre os primeiros sinais e o diagnóstico definitivo.
Mais de metade dos doentes chega ao médico já com sintomas moderados a graves e a generalidade dos clínicos realça que a altura ideal para iniciar um tratamento é imediatamente após a detecção.
Estado acusado de não investir no tratamentoEm relação aos apoios existentes, as queixas vêm sobretudo dos cuidadores e dos médicos, que consideram que o Estado não investe o suficiente no tratamento da patologia. Quem cuida destes doentes salienta que a doença tem um impacto devastador nos pacientes e na família, exigindo atenção sete dias por semana, 24 horas por dia.
O desgaste, o cansaço e a depressão são as principais emoções por que passam os familiares dos doentes, que sublinham a total alteração na vida familiar, sem férias e tempo social, para além dos efeitos económicos.
Em Portugal foram entrevistados para este estudo 120 médicos (clínica geral, psiquiatria e neurologia) do Porto, de Lisboa e de Coimbra; 210 homens e mulheres da população em geral com idade igual ou superior a 18 anos residentes no continente; 50 familiares e amigos que prestam cuidados de saúde a doentes com Alzheimer; e cinco pacientes na fase ligeira desta doença.
Falta pessoal especializado no acompanhamento de doentesAinda em Portugal, e segundo a Associação Portuguesa de Familiares e Amigos de Doentes de Alzheimer (APFADA), falta pessoal especializado no acompanhamento de doentes com a doença em lares e instituições do país.
"Não existem respostas eficientes por parte dos lares e apoios domiciliários, onde o pessoal, de um modo geral, não tem formação específica para lidar com estes pacientes", afirmou Maria do Rosário Zincke dos Reis, presidente da APFADA, lamentando ainda a geral falta de informação sobre a doença.
A responsável da APFADA salienta ainda que faltam apoios específicos para estes doentes em Portugal, onde "os medicamentos que existem são muito caros e apenas comparticipados pelo Estado em cerca de 40 a 55 por cento" e as receitas têm de ser passadas por médicos especialistas.
Segundo dados do Infarmed (instituto que tutela os medicamentos em Portugal), o Serviço Nacional de Saúde gastou 9,5 milhões de euros em medicamentos destinados à doença de Alzheimer, enquanto os pacientes pagaram no mesmo período onze milhões. "Para a família torna-se muito oneroso e complicado ter alguém com esta doença, ou porque os doentes ficam a cargo do cônjuge, normalmente também ele um idoso, ou, quando está ao cuidado de familiares mais novos, estes ainda estão na vida activa e é praticamente impossível coligir o trabalho com os cuidados que o paciente merece", realçou.
Maria do Rosário Zincke dos Reis realça ainda que, para além do problema económico, a Alzheimer tem um impacto social devastador nas famílias e nos pacientes, que exigem atenção a tempo inteiro, e obrigam a prescindir, entre outras coisas, de férias.
Alzheimer, a doença do esquecimentoA doença de Alzheimer é uma doença progressiva e degenerativa das células nervosas do cérebro, identificada pela primeira vez há cem anos, a 4 de Novembro de 1906, pelo neurologista alemão Alois Alzheimer e que permanece sem cura, atingindo cerca de 70 mil pessoas em Portugal e 25 milhões em todo o mundo.
Esquecimento, desorientação, alterações de humor ou trocar o sítio das coisas são alguns dos principais sintomas da doença.
A associação Alzheimer Europe, de que a Associação Portuguesa de Familiares e Amigos de Doentes de Alzheimer é membro, vai assinalar o centenário da apresentação do primeiro caso da doença na próxima segunda-feira, com um almoço-debate no Parlamento Europeu, altura em que vai ser entregue aos deputados uma brochura com os resultados do primeiro inquérito europeu sobre a doença.