A ver vamos...

"José Sócrates demonstrou, contudo, mais abertura para três propostas feitas hoje pelo CDS na área da justiça: a consagração de prazos peremptórios para os inquéritos criminais, a proibição de iniciar inquéritos com base em denúncias anónimas e o impedimento para os magistrados judiciais ou do Ministério Público de participarem em actividades políticas", relatava a TSF Online, já há uns dias.Sem conhecer o conteúdo concreto destas três propostas , as mesmas parecem importantes e dignas de serem ponderadas: a primeira, ao impor ao Ministério Público o respeito de prazos fixos para concluir o inquérito criminal, certamente com consequências concretas para os casos de não cumprimento desses prazos, é útil de diversas formas. Servirá, certamente, como valor de avaliação dos magistrados do Ministério Público. Evitará as violações do direito a uma justiça em tempo razoável e contribuirá para uma maior transparência do processo penal. Nesse campo é necessário que fique definitivamente estabelecido que, findo o inquérito judicial no prazo que vier a ser fixado, o processo passa a ser obrigatoriamente público. Isto é: se o Ministério Público acusa ou se decide pelo arquivamento de um processo judicial, o acto que tem de se sujeitar ao escrutínio da polis.
O bom nome das pessoas exige que os processos criminais sejam céleres e tendencialmente transparentes, de forma a se pôr termo ao deprimente fenómeno das sistemáticas violações do segredo de justiça apesar de só por vezes serem relevantes - são, geralmente, irrelevantes. E às prolongadas suspeitas na opinião pública, nunca esclarecidas, causadas pelo arrastar dos processos envoltos no denso véu do segredo da justiça.
O direito a saber, numa sociedade como a nossa, abrange o funcionamento do sistema de justiça, pelo que a actual legislação sobre o segredo de justiça não deve ser mantida ou mesmo meramente retocada nos termos do Acordo Político-Parlamentar, antes deve avançar-se na redução de tal figura jurídica à sua expressão mais simples, em obediência aos princípios da necessidade e da proporcionalidade.
Acresce a necessidade de reforçar os mecanismos de transparência, e isso faz-se através da publicitação de factos relevantes para a vida em sociedade, nomeadamente os que se prendem com o património e a vida das pessoas.
A ver vamos o que pretende em concreto o CDS e até onde irá o PS.
Já a segunda medida parece ser um verdadeiro absurdo: as denúncias anónimas não poderem dar origem a uma investigação e a um processo crime? Quer isto dizer que um telefonema anónimo a alertar uma esquadra policial de que está a ser feito um assalto num determinado local não será investigado? Esta tese mirífica da invalidade das denúncias da existência de práticas criminais para efeitos de abertura de um inquérito teve (e tem) a sua mais alta defesa pública na pessoa da presidente da Câmara Municipal de Felgueiras, num programa de televisão, antes de ter ido para o Brasil.
Mas esta proposta não tem realmente o menor sentido, já que não é o facto de as denúncias serem anónimas ou não que deve definir o que se investiga ou não. É da credibilidade e verosimilhança da denúncia que se deve partir.
Se num papel rabiscado e não assinado chegasse ao conhecimento da "autoridade" a denúncia do local onde se encontrava uma qualquer mercadoria roubada num armazém e se se chegasse à conclusão que essa informação era confirmada por outros indícios, justificava-se certamente uma investigação criminal. Falamos, como é evidente, de crimes públicos. Isto é, crimes que, em obediência ao princípio da legalidade, os órgãos de polícia criminal terão sempre de investigar, independentemente da vontade dos eventuais "interessados" nos mesmos.
A ver vamos se esta surpreendente proposta se mantém.
A terceira proposta é a mais complexa, já que pretende limitar a liberdade de associação e de expressão dos magistrados, na vertente das actividades políticas. E, como é evidente, é preciso ter toda a cautela com as restrições a tais liberdades fundamentais.
Saliente-se que não sou um fundamentalista dos direitos inalienáveis dos magistrados a serem tudo como os cidadãos comuns e, ainda, muito mais. Parece-me por exemplo evidente que o decoro do cargo impõe, como há muitos anos defendo, a proibição dos juízes participarem em "órgãos sociais" de organizações do desporto profisisonal.
Mas quanto ao conceito das "actividades políticas" que se pretendem proibir, toda a atenção será pouca para o projecto legal que apareça, para se ver se não se está já a por em causa o núcleo duro de direitos de participação cívica. A ver vamos o que vai ser proposto...

A partidaSouto de Moura sai de Procurador-Geral da República como homem profissional e humanamente de elevado valor. A sua seriedade ter-lhe-á permitido resistir aos assédios dos "interessados" no caso Casa Pia. Parece que confiou talvez demasiado no colectivo dos magistrados do Ministério Público em vez de ter apostado na sua própria liderança. Ainda, no caso Casa Pia, diluído nesse colectivo e mal-informado, Souto Moura teve gaffes verdadeiramente desnecessárias.
Alguns inquéritos judiciais mediáticos arrastam-se sem julgamento à vista mas, verdade seja dita, Souto Moura não tem culpa de o nosso bom povo gostar de eleger autarcas indiciados criminalmente.
Quanto ao caso "envelope 9", Souto Moura continua a não querer perceber. Continua a confiar no colectivo dos magistrados apesar de o processo lhe pertencer. Nem "percebe" que o ex-Presidente da República merecia um tratamento um bocadinho melhor e dispensava a humilhação pública. Nem percebe que esta acusação criminal contra os jornalistas, depois de afastar os magistrados e os funcionários da PT, não faz sentido . É uma opção de Souto Moura. É, no fundo, uma partida...

CorrupçãoComo todos sabemos, a corrupção anda, muitas vezes, associada ao financimento dos partidos. Será essa uma das razões da resistência sistemática à criação de um sistema de combate credível à corrupção. Mesmo sabendo-se que, tal como o mau funcionamento da Justiça, a corrupção é um poderoso factor de atraso económico e social. Será que, desta feita, se vai avançar consistentemente nesse combate ? Aceitam-se apostas... Advogado

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