Militares são quem mais ganha com novo protocolo de Estado

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PS não cede em matéria de Igreja e família real, mas faz compromissos com o PSD nas Forças Armadas e nas regiões autónomas Manuel de Almeida/Lusa (arquivo)

Muito satisfeitos e não menos aliviados, os deputados Vera Jardim (PS) e Mota Amaral (PSD) viram, ontem, ser aprovada na especialidade a primeira Lei das Precedências do Protocolo do Estado do Portugal democrático.

O texto final reflecte os compromissos entre os primeiros projectos de cada um dos partidos: o PS não cede em matéria de Igreja católica nem aceita a família real nas cerimónias do Estado republicano, enquanto o PSD consegue fazer subir na lista de precedências todas as altas figuras da hierarquia militar, colocando também entre os 15 primeiros os mais importantes cargos das regiões autónomas. Foi o fim de um processo legislativo na Assembleia, que ontem viu o seu presidente e os líderes parlamentares a almoçarem com o Presidente da República em Belém.

Igreja só como convidada

Apesar de a hierarquia da Igreja católica ter ficado explicitamente de fora da lista de precedências - os representantes das igrejas participarão nas cerimónias de Estado enquanto convidados e sem lugar no protocolo -, ao contrário do que pretendiam o PSD e o CDS, os socialistas aceitaram um pequeno enxerto à redacção original do seu artigo.

Assim, as autoridades religiosas continuam a precisar de convite para assistir a cerimónias oficiais e a receber "o tratamento adequado à dignidade e representatividade das funções que exercem". Mas acrescenta-se que serão ordenadas "conforme a respectiva implantação na sociedade portuguesa". Só que fora dos lugares do protocolo. Mas repete-se o critério da representatividade.

Aos jornalistas, Vera Jardim não escamoteou a importância da Igreja católica no país: "O sistema legal constitucional tem dois diplomas sobre religiões - a lei da liberdade religiosa e o Tratado com a Santa Sé", disse. Já Mota Amaral frisara que a redacção fazia o "reconhecimento de uma realidade histórica e actual", tanto mais que "não se pode tratar de modo igual aquilo que é diferente". Mas assumiu a igualdade das confissões religiosas: "Só na altura de sentar as pessoas é que se dá precedência à Igreja católica."

Este continua, ainda assim, a ser o pomo da discórdia com os restantes grupos parlamentares. Nuno Magalhães, do CDS, afastou-se do consenso gerado no grupo de trabalho e acabou por votar contra o artigo relativo às autoridades religiosas, abstendo-se em tudo o resto. E não retirou as propostas de alteração que fez tanto nesta matéria, como na inclusão dos descendentes da família real no protocolo, apesar de terem sido "chumbadas" pelas restantes bancadas. Hoje, na votação final global, o voto centrista pode ser o único a "estragar" a unanimidade pedida por Mota Amaral em torno do projecto, juntamente com o voto contra do deputado Quartin Graça, da bancada do PSD.

A dança das cadeiras

Graças a alguma engenharia matemática - juntar vários cargos num mesmo lugar da lista, como aconteceu com os presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Constitucional, agora ex-aequo em quarto lugar -, os obreiros da lista de precedências conseguiram fazer uma espécie de milagre da multiplicação dos lugares. E com isso foram mais as subidas de lugar que as descidas, com a vantagem de ainda poderem entrar algumas altas individualidades antes esquecidas, como os assessores e adjuntos dos membros do governo.

Certo é que, no conjunto dos 58 lugares, houve grandes subidas. Em termos de classe, os militares foram os principais beneficiários, como era de esperar, depois das declarações nesse sentido dos dois ministros da Defesa durante as negociações, Luís Amado e Nuno Severiano Teixeira. O chefe de Estado Maior-General das Forças Armadas (CEMGFA) subiu nove posições, ficando em 11º lugar, enquanto os chefes de cada força subiram 15 posições e os almirantes da Armada e marechais ascenderam sete lugares.

O lugar dos militares estaria também a ser acompanhado pelo Presidente da República. Ainda ontem, num almoço com os líderes parlamentares, Cavaco Silva perguntou informalmente se o chefe da Casa Militar da Presidência da República teria ou não precedência em relação ao CEMGFA. Ao que Alberto Martins (PS) respondeu que a situação fora corrigida.

Entre as maiores subidas estão ainda chanceleres das ordens honoríficas (hoje Mota Amaral e Rocha Vieira), que sobem 19 posições; os conselheiros de Estado (de 32º para 18º), os chefes das casas Civil e Militar e os antigos Presidentes da República, que passam de 16º para 6º lugar.

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