MP diz que jovens do Porto não consumaram a morte de Gisberta

Depois de amanhã, pelas 9h30 horas, começam a ser julgados no Tribunal de Menores do Porto os 13 rapazes suspeitos
da morte de Gisberta, a transexual espancada e lançada a um poço, ainda viva, em Fevereiro passado. São acusados de homicídio tentado e de ocultação de cadáver, num processo que poderá terminar com penas de internamento em regime aberto ou semi-aberto. Cinco menores acusados de assassinarem Gisberta faziam parte de um grupo de adolescentes e jovens que se auto-intitula The Gang. Ficaram "tristes" com o crime, mas fazem a defesa dos amigos.

Gisberta pediu ajuda antes de ser lançada ao poço - estava viva e os jovens sabiam-no. É esta a convicção do Ministério Público, após alguns meses de investigação, num processo que chocou o país e onde 13 jovens são suspeitos de agredirem uma transexual do Porto, lançando-a a um poço, onde acabou por morrer.Mesmo assim, e embora defenda que os jovens tinham consciência de que Gisberta estava viva e que ouviram os seus pedidos de auxílio, o Ministério Público entende não ser possível demonstrar que foram eles que lhe causaram a morte. Gisberta morreu por afogamento, conforme confirma a autópsia, depois de os menores a terem alegadamente atirado a um poço. No entanto, no julgamento que começa depois de amanhã, pelas 9h30, no Tribunal de Menores do Porto, discutir-se-á apenas a eventual prática dos crimes de homicídio tentado e de ocultação de cadáver.
Parece confuso? Poderá ser, no mínimo, um entendimento polémico, mas juridicamente é este o entendimento do procurador, que terá hesitado muito antes de qualificar os factos investigados. Uma qualificação que, depois, será determinante para a aplicação das medidas cautelares, que passarão, necessariamente, caso os factos sejam dados como provados, por períodos de internamento. O Ministério Público defende que, atendendo ao caso em análise, não deverão os menores ser sujeitos à medida mais gravosa da Lei Tutelar Educativa- três anos de internamento - e não advoga a aplicação do internamento em regime fechado. Considera, antes, que deverá passar pelo regime aberto e semi-aberto.
Aliás, neste momento, já nenhum dos 13 menores está sujeito àquela medida. O único rapaz a quem o internamento em regime fechado havia sido aplicado, na altura em que todos foram interrogados pelo juiz, viu as medidas abrandarem recentemente. "O princípio é o da igualdade. A fase da investigação já terminou, não fazia sentido aplicar uma medida mais gravosa a um do que aos outros", explicou fonte judicial ao PÚBLICO, garantindo que também deverá ser esse o princípio a nortear os juízes (dois sociais e um de direito) que irão presidir ao julgamento.

Reabilitar os menores"São miúdos, aquilo foi uma brincadeira que correu mal. Um acto grave, claro, mas devemos marcar os rapazes para a vida toda, não os deixar voltar a ter uma vida normal?", interrogou-se a mesma fonte, assegurando que as medidas a aplicar deverão, por isso, assumir um padrão de unidade. "Os indícios apontam para que estiveram todos em algum dos momentos. Uns só bateram, outros lançaram o corpo. Mas o objectivo da sanção não é puni-los, sim reabilitá-los."
Em oposição à aparente brandura jurídica do Ministério Público no Tribunal de Menores do Porto está a própria investigação. Onde se apurou que durou dois dias a agressão dos menores, que passou por vários actos violentos e sevícias sexuais à vítima indefesa. Gisberta estava viva e pedia ajuda, cerca de 48 horas depois do primeiro acto de violência, e, mesmo assim, os rapazes nunca terão admitido pedir auxílio. Terão tentado incendiar o cadáver, só abandonando a ideia por temerem as consequências. Optaram por lançar a vítima ao poço, com mais de 15 metros de profundidade, levando a que Gisberta morresse afogada.
Por esse motivo também - a morte não ser consequência das agressões - a qualificação jurídica foi alterada. Inicialmente, os indícios apontavam para homicídio qualificado, mantendo-se agora o crime no domínio da tentativa, o que, em termos penais, significa uma redução significativa da pena. O Ministério Público fala ainda em dolo eventual, o que significa que os jovens admitiram que Gisberta pudesse morrer e conformaram-se com esse facto.
O julgamento deverá prolongar-se durante toda a semana, à porta fechada. Só a sentença será pública.