Loures inicia operação de demolição de 222 barracas

Cerca de 260 famílias atingidas

Moradores acusam câmara de não os ter informado. Vereador garante que tudo foi feito dentro da lei

Um total de sete barracas foram ontem demolidas na Quinta da Vitória, na Portela de Sacavém, em Loures, numa operação que apanhou os moradores de surpresa, mas que a autarquia garante ter sido devidamente anunciada. A operação que ontem teve início visa a demolição de todas as 222 habitações clandestinas existentes no local. "Chegaram de manhã e disseram-me que tinha que retirar as minhas coisas de casa, porque ia ser demolida. Não avisaram nada nem ninguém. Não vi nada a informar. Disse-lhes que de casa não saía e que mais valia demoli-la comigo lá dentro, porque não tenho para onde ir e estou grávida", contou Ana Isabel Belchior, uma moradora com 24 anos.
A sua é uma das cerca de 260 famílias - das quais 38 não estão inscritas no Plano Especial de Realojamento (PER) - que vão ver os seus lares serem demolidos pelas máquinas do proprietário do terreno, que o quer limpar para ali construir um empreendimento imobiliário. A morar na Quinta da Vitória há cerca de ano e meio, está desempregada. Não tem família e o seu companheiro, com quem vive, está na mesma situação.
O vereador da Gestão Urbanística e da Habitação na Câmara de Loures, João Pedro Domingues, garantiu que a população foi previamente avisada através de editais afixados nas portas das barracas e que os moradores "tinham consciência" de que "mais cedo ou mais tarde" aquela zona era para "limpar".
Os moradores contactados pelo PÚBLICO garantem o contrário. Também Rita Silva, do movimento pelo direito à habitação Plataforma Artigo 65, garante que os "inúmeros" moradores com quem falou lhe disseram desconhecer a acção de demolição. "Não foram avisados nem por carta nem através de editais afixados às suas portas. Há aqui duas verdades, a da câmara e a dos moradores", resume.
Rita Silva diz que o facto de não se notificar os moradores "é completamente ilegal" e que é "obrigação das câmaras avisar" a população. "Isto é muito grave", acrescenta.
De acordo com João Pedro Domingues, a operação é levada a cabo pelo proprietário do terreno em parceria com a autarquia e envolve duas fases. A primeira prolonga-se pelos próximos 15 dias e abrange "cerca de 17 barracas de famílias não PER ou casas devolutas". Na segunda fase, ainda sem prazo definido, serão demolidas as casas - mais de 200 - das restantes famílias recenseadas no PER, que serão depois indemnizadas ou realojadas em habitações a providenciar pela autarquia.

Excluídos do PER sem direito a casa
Quanto às famílias não abrangidas pelo PER, o vereador da Gestão Urbanística explicou que "cada caso é um caso". Para as famílias que ali vivem há cerca de 15 anos mas que não tiveram a oportunidade de se recensear até 1993 no PER, por exemplo, "vai estudar-se uma solução com o Instituto Nacional de Habitação através de um programa para serem realojadas". Contudo, a câmara avisa desde já que não se responsabiliza pelas pessoas que vivem ali há um ano e que "indevidamente" ocuparam as casas ou as arrendaram: "Isso já é um problema do poder central", esclareceu João Pedro Domingues.
A Quinta da Vitória fica mesmo no centro de um aglomerado de prédios para habitação social. Mal se mete o pé fora do bairro entra-se noutra realidade. Há jardins com plataformas para abrigar do sol. Cheira a limpo e não há lixo. Tudo está cuidado. Quem ali passa não imagina que mesmo ao lado há um bairro degradado, cercado em alguns limites por uma rede, junto à qual se amontoam os lixos e as moscas.

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