Ministério e Berardo chegaram a acordo para museu no CCB

O Museu de Arte Moderna e Contemporânea - Colecção Berardo deverá ficar temporariamente numa das galerias do Centro de Exposições

O Ministério da Cultura (MC) e o empresário madeirense Joe Berardo chegaram anteontem à noite a um acordo para a transformação da Colecção Berardo num museu a instalar no Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa. Depois de uma década de sucessivas polémicas e ameaças da saída da colecção de Portugal, a ministra Isabel Pires de Lima anunciou ontem o fecho de um processo negocial encetado em Dezembro, na sequência da reunião-surpresa em que interveio o primeiro-ministro José Sócrates. O protocolo que formaliza o acordo e estabelece os termos de criação do Museu de Arte Moderna e Contemporânea - Colecção Berardo deverá ser assinado já na segunda-feira, na presença de Sócrates, confirmaram ontem à noite Pires de Lima e o coleccionador no Porto, minutos antes da inauguração da exposição Arte Déco na Colecção Berardo. Apesar de nenhum dos dois ter divulgado quaisquer detalhes relativos ao modelo do futuro museu, o seu nome é, desde já, uma surpresa, prevendo a integração de obras dos anos 20 e não apenas do pós-guerra, como até agora se tinha pensado.
Pires de Lima chegou ontem à Fundação de Serralves acompanhada por Joe Berardo e mostrou-se satisfeita com a solução alcançada para um "dossier que se arrastava no MC há dez anos": "Não creio que este processo tenha sido lento, até foi rapidíssimo". Adiando para segunda-feira os esclarecimentos acerca da forma como serão assegurados a gestão e o financiamento do futuro museu, a ministra da Cultura salientou que "o acordo obedece aos princípios gerais estabelecidos no pré-acordo do final do ano passado".
Igualmente "satisfeito", o proprietário da colecção agradeceu a Pires de Lima e a José Sócrates, cujos contributos considerou igualmente "determinantes", "o empenhamento que tiveram em resolver o problema". "Isto não é um negócio. É uma proposta que já tem dez anos e que agora fica concluída, para bem de todos os portugueses e da humanidade em geral. Lisboa vai ter uma das melhores colecções do mundo. Desde o princípio que construí esta colecção para Lisboa", disse ainda.
Não disse também se serão divulgados os resultados de uma avaliação à colecção, consensualmente tida como a maior de arte moderna e contemporânea em Portugal, mas com um valor de mercado desconhecido - diferentes fontes mencionam montantes tão díspares como 34 milhões de euros, 170 milhões e 300 milhões.
Qualquer que seja o seu valor actual, será muito superior ao investimento de Berardo, que, no início dos anos 90, quando começou a comprar de forma mais sistemática, beneficiou de um momento de crise generalizada no mercado da arte. Foi nessa altura que adquiriu obras de Agnes Martin, Sam Francis, Anselm Kiefer, Joan Mitchell, Gerhard Richter e Andy Warhol, que cinco anos mais tarde já tinham duplicado o seu valor.
Com orientação de Francisco Capelo, optou-se por uma colecção de tipo cronológico, procurando-se desde logo um carácter museológico e a acumulação de obras de todos os protagonistas da última metade do século. De Jackson Pollock a Andy Warhol, de Joseph Beuys a Yves Klein, de Donald Judd a Bill Viola e Bruce Nauman. Entre os artistas portugueses representados estão Vieira da Silva, Paula Rego e Julião Sarmento.
Ontem, Alexandre Melo, assessor para a Cultura de Sócrates, disse apenas: "Julgamos que se conseguiu um acordo que serve a todos e alcança os objectivos traçados desde o início".

Modelo de gestão a definirAntónio Mega Ferreira, o novo presidente do CCB, explicou que só fará comentários uma vez assinado o protocolo, mas em entrevistas recentes tem falado na forma como vê o futuro museu. Anteontem, à Visão disse que "não passa pela cabeça de ninguém sediar a colecção Berardo no CCB entregando-a exclusivamente à gestão do comendador".
Explicando que a gestão terá que ser feita em articulação com responsáveis do CCB, Mega acrescentou ainda que a colecção não deverá estar toda em exposição como de início Berardo exigia: "Em nenhuma parte do mundo se expõem ao mesmo tempo 850 peças de arte contemporânea".
Já ao Diário de Notícias, edição de domingo passado, Mega Ferreira explicava que a última proposta de que tinha conhecimento previa a ocupação temporária de uma área de 2800 metros do segundo piso do Centro de Exposições, deixando livre a maior das áreas expositivas, a Galeria 1. O ex-comissário da Expo "98 esclareceu ainda dúvidas relativas ao número de obras que compõem a colecção.
Berardo tem dito que esta integra cerca de quatro mil peças. Mega diz que "são 850 peças de arte do século XX" e que "o resto são as mais diversas coisas, desde moedas a estanhos e cartazes": "O Governo decidiu desde o início que era um museu de arte contemporânea. É disso que estamos a falar".
Essas 850 peças são, na grande maioria, aquelas que o CCB já tem em depósito através de um protocolo assinado em 1997 com a Fundação Berardo. Foi nesse ano que o Sintra Museu de Arte Contemporânea foi criado especificamente para acolher a Colecção Berardo. O CCB recebeu em depósito parte da colecção que não cabia no edifício do antigo casino da cidade reconvertido para o efeito.
À época, uma das metas a atingir era "pôr o CCB no circuito internacional da arte". O depósito foi tido como um passo importante nesse sentido e foi recorrendo aos fundos da Colecção Berardo que se fizeram exposições dedicadas a Paula Rego, Picabia e Matisse. Previa-se também usá-la como moeda de troca com instituições internacionais.
Desde 1997, o CCB tem gasto na conservação das peças em depósito cerca de 90 mil euros. com Inês Nadais

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