Câmara de Lisboa dá luz verde à demolição da casa onde morreu Almeida Garrett
Movimento cívico apela ao primeiro--ministro e divulga despacho em que Carmona fala de "perda irreparável"
A vereadora do Urbanismo na Câmara de Lisboa, Gabriela Seara, anunciou ontem que o município vai deixar o ministro da Economia, Manuel Pinho, demolir a casa de Campo de Ourique onde Almeida Garrett morou nos seus dois últimos anos de vida, da qual o governante é proprietário. A autarca justificou a decisão com a alegada falta de valor arquitectónico, patrimonial ou histórico do edifício que justifique a sua tentativa de aquisição pela câmara - mas, sobretudo, com a "falta de condições financeiras" da autarquia para transformar o imóvel numa casa-museu.
Reagindo à autorização de demolição, o movimento cívico Fórum Cidadania Lisboa, que tem pugnado pela manutenção da casa, apelou ao primeiro-ministro para que, "tal como fez com o patético caso à volta da Colecção Berardo, volte a intervir decisivamente na defesa do património nacional".
Ao mesmo tempo, divulgou um despacho de Agosto passado do presidente da Câmara de Lisboa, Carmona Rodrigues, em que este, contrariando a actual posição da autarquia, escreve: "A demolição do referido imóvel significaria a perda irreparável de um valor patrimonial da cidade de Lisboa e de um exemplo vivo da História de Portugal, atentando igualmente contra o ambiente urbano."
"Decisão seria outra"se houvesse dinheiro
O ministro Manuel Pinho comprou a casa de Garrett para ali fazer um edifício de cinco pisos com dois T4, um T5 e um T2. O projecto é do arquitecto Manuel Tainha e inclui um pequeno jardim japonês.
A vereadora Gabriela Seara teceu ontem críticas quer ao movimento de cidadãos que recolheu mais de 2300 assinaturas a favor da preservação do edifício quer ao Instituto Português do Património Arquitectónico (Ippar), que recomendou à câmara, através do seu conselho consultivo, que o classificasse como imóvel de interesse municipal - uma vez que não lhe encontrou valor suficiente para uma classificação de categoria nacional.
Para a autarca, o Ippar pronunciou-se "a reboque do movimento cívico", enjeitando responsabilidades para a autarquia. Ao Fórum Cidadania Lisboa, Gabriela Seara acusa de "não conseguir encontrar uma solução" para o problema, "atirando essa responsabilidade para a câmara".
Tivesse a autarquia acatado o parecer do Ippar, que não tem carácter vinculativo, e "estaria a classificar quatro paredes cheias de nada", uma vez que não possui qualquer espólio para ali colocar. Mas "a decisão seria provavelmente outra se houvesse maior disponibilidade financeira", admitiu Gabriela Seara.
Depois de contar que o ministro não recebeu nenhuma oferta de compra da casa nos últimos meses, Carmona Rodrigues fez ontem uma observação inédita: "Tem uma fachada que eu até acho que não é bonita", disse, citado pela Lusa.