Mãe e tio de Joana foram ontem condenados a 20 e 19 anos de prisão

Leonor e João Cipriano sentenciados por homicídio e ocultação de cadáver. O
motivo pelo qual a menina foi morta não ficou provado

A mãe e o tio de Joana, a menina de oito anos desaparecida em Setembro do ano passado na aldeia da Figueira, no Algarve, foram ontem condenados, respectivamente, a 20 anos e quatro meses e 19 anos e dois meses de prisão. O tribunal considerou que ambos foram autores dos crimes de homicídio qualificado e ocultação de cadáver. "Dificilmente se encontrarará caso de homicídio em que a acção dos arguidos seja mais grave e desvaliosa", diz o acórdão. O tribunal de júri, composto por três juízes e quatro jurados, fundamentou a prova com base nos testemunhos ouvidos durante a audiência e nas provas periciais recolhidas, bem como nos autos de reconstituição do crime, uma vez que não foi encontrado o cadáver. De acordo com a acusação, a criança teria sido morta na sequência da observação de uma relação sexual da mãe, Leonor Cipriano, com o tio e irmão da progenitora, João Cipriano, quando entrou em casa. Os arguidos, apanhados de surpresa, teriam agido "com vista a que a menor não denunciasse ao padrasto o que havia visto". Mas o motivo do crime não foi apurado.
Leonor Cipriano teve seis filhos de cinco relações. Ao longo da vida "tem vindo a mostrar desinteresse pelos filhos mais velhos". O irmão João, por seu turno, nunca teve emprego nem residência certos, vivia no interior de um veículo automóvel, ou em casa dos seus irmãos, sobrevivendo à custa de diversos trabalhos que levava a cabo em vários locais. Nasceram no seio de uma família numerosa (nove irmãos), desestabilizada pelos hábitos de alcoolismo do pai e as dificuldades económicas. Ontem, depois de ouvirem a sentença no Tribunal de Portimão, regressaram à cadeia, impávidos e serenos, tal como tinha acontecido durante a audiência.
Durante o julgamento, os arguidos optaram pelo silêncio. O acórdão lembrou que isso não os pode prejudicar, mas perderam a "possibilidade de confessar e de manifestar arrependimento". Incorriam numa pena até 25 anos de cadeia, mas não foi provado o crime de profanação de cadáver, de que também eram acusados.
A pena foi aplicada com base na "globalidade da prova" e de acordo com "a livre convicção que o tribunal formou", a partir dos testemunhos e da prova pericial, bem como da "conjugação de vários indícios" que foram apresentados. No conjunto desses "indícios", ressaltam as várias encenações montadas por Leonor para fazer crer na opinião pública que a menina teria "desaparecido", quando já estava morta. Por outro lado, seis dias depois do falecimento, a mãe lavou a casa com petróleo e um esfregão de aço, com o fim de "eliminar indícios de sangue que pudessem manter-se na casa".

Carácter com "especial perversidade"
O tribunal considerou que a mãe e o tio de Joana puseram-lhe termo à vida, "com sucessivas pancadas na cabeça". Apesar de ser "visível que a criança sangrava do nariz, boca e têmpora", "ainda a levaram a bater com a cabeça na esquina da parede, só parando a agressão quando Joana morreu". Na fase seguinte, "cortaram o cadáver e esconderam-no". Até hoje, "não foram localizados os restos mortais da Joana". "Não há dúvida, portanto, que os arguidos pelo menos esconderam o corpo da menor". "Talvez o tenham destruído, mas isso não se conseguiu apurar, pelo que só podemos concluir que esconderam o corpo, ou seja, que o ocultaram em local desconhecido".
Os arguidos agiram de forma "livre, voluntária e consciente", sublinhando que "não há dúvidas que as circunstâncias do crime revestem especial censurabilidade". O tribunal deu também como provado que, para se desfazer do corpo, esquartejaram-no com uma faca e uma serra de cortar metal. Os pedaços foram colocadas em sacos de plástico nos três compartimentos da arca frigorífica, deixando vestígios de sangue na casa. Ambos os arguidos, considerou o tribunal, revelam uma personalidade e um carácter com "especial perversidade".

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