Física é a disciplina científica que menos motiva os alunos

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Matérias difíceis, manuais pouco entusiasmantes e dificuldades na Matemática são causas comuns para a desmotivação Nélson Garrido/PÚBLICO

Não é por falta de interesse em relação às matérias que os alunos se afastam de Física e de Química. Mas a verdade é que, em média, um quarto dos quase oito mil estudantes inquiridos num estudo realizado pelas sociedades portuguesas da Física e da Química manifestam a sua desmotivação para o estudo destas duas disciplinas.

Porquê? Acima de tudo porque consideram a "matéria difícil". Mas também porque os manuais adoptados "não entusiasmam para o estudo da disciplina", porque os estudantes têm "dificuldades a Matemática", não são capazes de "aplicar os conhecimentos teóricos à resolução de exercícios" e ainda porque os "assuntos tratados são muitos desligados da realidade/pouco interessantes", dizem os mais de sete mil alunos inquiridos, do 9.º e do 11.º ano, de 243 escolas.

As respostas foram compiladas no Livro Branco da Física e da Química - Opinião dos Alunos 2003, recentemente concluído, e que se segue a um outro estudo, relativo à opinião dos professores.

Já as justificações dadas pelos que frequentam cursos superiores de ciências e engenharias de nove universidades para não se terem sentido motivados para o estudo da Física e da Química no 12.º ano assentam noutras razões. Aí o que contou na maioria dos casos foi o facto de as disciplinas, sobretudo a Física, não serem consideradas como provas específicas para o ingresso nos cursos superiores que queriam frequentar.

Acrescem motivos como a disciplina ter um elevado insucesso no exame nacional, poder condicionar o acesso à universidade, ou ainda a falta de incentivo para o estudo desta área.

Pouco recurso à Internet, livros ou jornais

Resultado: entre as várias disciplinas científicas estudadas pelos alunos portugueses nos vários níveis de ensino, a Física é mesmo a que menos motiva. Tanto no 9.º como no 11.º e no 12.º, a cadeira fica a perder em relação à Química, Ciências da Natureza, Biologia, Ciências da Terra e da Vida e até em relação à Matemática.

Não é, pois, de estranhar que quase metade (47 por cento) dos alunos inquiridos que frequentam o 1.º ano de um curso superior e que têm actualmente estas disciplinas nos seus currículos tenha optado por não estudar Física no último ano do secundário, com tudo o que isso implica em dificuldades acrescidas em acompanhar a matéria.

A questão preocupa a Sociedade Portuguesa de Física (SPF), tanto mais quanto a revisão curricular em curso (estreada em 2004/2005) tornou a Física e a Química disciplinas opcionais a partir do 10.º ano para os alunos que seguem o agrupamento científico-natural.

E se as instituições de ensino superior, desejosas de receber o maior número de estudantes, acabam por retirar a Física das provas de acesso que exigem então a situação torna-se mais preocupante ainda, argumenta Anabela Martins, coordenadora do estudo. "A menor frequência da Física foi introduzida artificialmente no sistema educativo pelos critério de ingresso no ensino superior" e as "orientações do Ministério da Educação quanto à revisão curricular terão certamente repercussões muito nefastas no futuro imediato em relação ao ensino da Física e da Química", concluem os autores.

Os autores do estudo quiseram também saber quais os hábitos de leitura e visualização de programas científicos e tecnológicos, já que, para os professores, uma das causas do insucesso escolar pode estar relacionada com a dificuldade de interpretação de textos científicos. E o que concluíram foi que a maioria dos alunos inquiridos nunca ou raramente utilizam fontes de informação como a Internet ou a leitura de livros e artigos sobre ciência e tecnologia nos jornais.

Mesmo no ensino superior, só oito por cento responderam ler livros de divulgação científica e tecnológica regularmente.

Em jeito de conclusão, os autores do livro entendem ser urgente "repensar o ensino da Física e da Química" se se pretende que os alunos "se sintam atraídos para o seu estudo" e se se desejar que "as aprendizagens no domínio das ciências se tornem verdadeiramente úteis".

Quanto ao modelo de ensino preferido, as respostas dadas pelos alunos só não causam surpresa porque "as pessoas tendem a reproduzir os modelos que lhes são apresentados", explica a coordenadora do trabalho, Anabela Martins. A verdade é que os métodos que os estudantes consideram mais eficazes são a "resolução de exercícios", a "revisão da matéria dada na véspera dos testes" e "ouvir as explicações dos professores", complementando com o estudo em casa ou com demonstrações e perguntas. Ou seja, preferem o ensino centrado no professor, com exposição oral e teórica e não valorizam uma participação activa na aprendizagem.

A preferência por estratégias que conduzam ao sucesso imediato terá provavelmente que ver com a importância atribuída por alunos e professores aos resultados nos testes e pode ter como consequência "privilegiar as boas classificações em detrimento de aprendizagens significantes e relevantes", alerta-se. Projectos de trabalho e relatórios de actividades experimentais raramente contam para a avaliação, dizem os alunos.

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