Quem foi Pol Pot?

Há quem lhe chame o Osama bin Laden da sua época. Mas Pol Pot é, ainda hoje, uma figura mais enigmática do que o homem actualmente mais procurado no mundo. Philip Short passou quatro anos no Camboja para tentar compreender quem realmente foi o líder de um dos regimes mais sanguinários do século passado e escrever o livro Pol Pot: The History of a Nightmare. Filho de uma família abastada, Saloth Sar estudou num liceu francês na capital, Phnom Penh, e depois em Paris. Foi ali que se tornou marxista-leninista; quando voltou ao Camboja juntou-se imediatamente à guerrilha comunista. "Durante duas décadas, adoptou vários pseudónimos", escreve Short. "Phouk, Hay, Pol "87", Tio-avô, Irmão mais velho, e nos últimos anos "99" e Phem. "É bom mudarmos de nome", disse ele uma vez a um dos seus secretários. "Quanto mais mudarmos de nome, melhor. Confunde o inimigo." Depois acrescentou, numa frase que se tornaria um lema do Khmer Vermelho: "Se preservarmos o secretismo, metade da batalha já está ganha". O arquitecto do pesadelo cambojano não era um homem que gostasse de trabalhar à vista de todos".
Esteve no poder entre Abril de 1975 e Janeiro de 1979. Foi o tempo suficiente para liquidar um quinto da população cambojana, nos campos da morte, ou à fome. Mandou evacuar cidades e vilas inteiras para levar mão-de-obra para os campos. Não havia salários. Os opositores eram apelidados de "micróbios" e tratados como tal.
Pilip Short (ex-jornalista da Economist e da BBC) já tinha escrito a biografia de Mao Zedong: Mao, a Life (1999). Com o livro sobre Pol Pot traz uma investigação alargada, que não se esgota na figura do líder, e torna-se numa história do século XX cambojano. Revelou documentos inéditos, falou com sobreviventes do regime sanguinário, mas também com os carrascos.
O livro foi interpretado como uma forma de procurar alguma lógica na loucura que foi o regime sanguinário de Pol Pot. O autor conclui que a origem pode não estar exclusivamente radicada nos khmers, mas na história dos próprios cambojanos. Cita um antigo khmer vermelho que se recorda de, em criança, encontrar cabeças decapitadas em viveiros de pesca. "Não nos incomodava... Agarrávamos nela pelo cabelo e atirávamo-la para o lado".
O autor coloca a hipótese de o Camboja ainda não ter ultrapassado o trauma do colapso da civilização Angkor, no século XIII - um factor que, segundo vários críticos, está demasiado longe para justificar a forma como no país se lida com a violência. O budismo, a principal religião do país, poderá ser outra das origens ao defender a "anulação do indivíduo". Pol Pot apresentava Buda como o principal baluarte da democracia. Escreve Short: "Sugere um desejo consciente de se identificar com um ponto de vista autenticamente cambojano, e não com ideias ocidentais importadas". Francisca Gorjão Henriques

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