Má gestão do programa "Petróleo por Alimentos" custou milhões de dólares

Inquérito revela ineficácia na administração e vigilância às empresas contratadas no Iraque, mas não corrupção

O controlo das Nações Unidas do seu programa "Petróleo por Alimentos" no Iraque era gravemente deficiente e os erros cometidos por quem o geria fizeram perder milhões de dólares. A conclusão é de uma comissão independente nomeada para investigar o programa que ontem divulgou 58 auditorias efectuadas pela organização entre 1999 e 2005. Estas auditorias, diz a comissão, "descrevem procedimentos inadequados em numerosas categorias de actividade" e "oferecem a imagem de várias organizações minadas pelo "stress" e pela falta de recursos que muito frequentemente operavam de forma ineficaz e dispendiosa". Nos casos onde as perdas provocadas por má gestão puderam ser calculadas pela divisão de auditorias internas da ONU, o dinheiro mal gasto representa cerca de cinco milhões de dólares, mas a comissão sublinha que as falhas cometidas, no seu todo, fizeram gastar mal ou perder valores "bem superiores".
Em vigor de 1996 a 2003, o "Petróleo por Alimentos", financiado através de 2,2 por cento dos lucros do petróleo iraquiano, era o maior programa de ajuda da ONU (de um valor total de 64 mil milhões de dólares). Permitia ao Iraque exportar petróleo em troca de bens civis, de forma a aligeirar junto dos iraquianos o impacto das sanções internacionais impostas ao regime de Saddam Hussein. Pervertido pelo regime, permitiu que fossem desviados milhões - um escândalo que tem estado na base de inúmeros ataques à organização internacional.
A comissão, liderada por Paul Volcker e nomeada sob pressão pelo secretário-geral da ONU, Kofi Annan, para investigar o programa, publicou ontem aquilo a que chama um relatório "provisório", um documento de 36 páginas que acompanhou a divulgação das auditorias internas.
Pelo menos cinco comités do Congresso americano já tinham pedido acesso a estas auditorias para investigar o programa; em Novembro, o senador Norm Coleman acusou Annan de encobrir a extensão da fraude por trás do programa e pediu a sua demissão.
"Apesar de os auditores terem dado o seu melhor, sabemos agora que existiram problemas significativos com o seu trabalho, entre eles a falta de monitorização do gabinete de Nova Iorque", disse Reid Morden, director do Comité de Inquérito Independente, como a comissão é formalmente conhecida. Era na sede de Nova Iorque que se gastavam quase 40 por cento dos mil milhões de dólares empregues em despesas administrativas.

Contratos ficavam por monitorizar
As auditorias divulgadas não identificam "actividades irregulares" ou corrupção por parte do pessoal da ONU.
Diz a comissão que os auditores fracassaram na monitorização dos contratos para venda de petróleo e dos contratos para a compra de bens que deveriam destinar-se aos iraquianos. Por analisar ficaram também letras de crédito.
Muitos dos lapsos apontados dizem respeito à falta de vigilância às empresas contratadas. Era à Saybolt Eastern Hemisphere BV, de Roterdão, que cabia controlar a quantidade de petróleo exportado legalmente pelo Iraque: entre outras coisas, a Saybolt é acusada de cobrar por funcionários inexistentes, o que conduziu a pagamentos indevidos de 186 mil dólares.
Questionado sobre as auditorias e os primeiros comentários da comissão, o porta-voz da ONU Stephane Dujarric sustentou que "a supervisão das Nações Unidas funcionou" e sublinhou que este não é "um veredicto final ao programa". Dujarric notou ainda que das 179 recomendações dos auditores, apenas 22 não foram tidas em conta.
A análise das auditorias constitui apenas uma parte do trabalho entregue à comissão de Volcker, ex-presidente da Reserva Federal americana. Esta tem que entregar até ao fim do mês um relatório preliminar, esperando-se para Junho as conclusões finais do inquérito.

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